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Obrigatoriedade da audiência prevista no artigo 695 do CPC/15

Ana Marcato, Fabiana Ramos, Francisco Laux, João Lessa, Luis Bortolai e Silvio Pereira

O tema representa novidade no sistema e, com isso, muita discussão ainda poderá surgir em torno da questão e dos posicionamentos doutrinários conflitantes.

terça-feira, 5 de julho de 2016

Atualizado em 4 de julho de 2016 13:19

O festejado modelo de resolução multiportas de conflitos vem enunciado logo nos artigos iniciais do novel diploma processual, ao tratar das normais fundamentais e explicitar o estímulo que todos os operadores do Direito devem destinar à conciliação e à mediação. Caminhando nesse sentido, no procedimento comum do CPC/15 o réu é citado, convocado a participar do processo, mas sem o ônus, inicialmente, de apresentar a sua defesa, como previa o CPC/73.

Isso porque, tratando-se de controvérsia que permita a autocomposição, - e não sendo o caso de rejeição liminar do pedido - a citação do réu será determinada, em regra, para que ele compareça à audiência de conciliação e/ou mediação prevista no art. 334 do CPC/15. A intenção do legislador foi a de incentivar a tentativa de pacificação de determinados conflitos a tanto adequados, oportunizando a resolução da controvérsia por meio de autocomposição, e não de solução judicial adjudicada.

A expressão "conciliação ou mediação" empregada nesse artigo é relevante à destinação que os parágrafos 2º e 3º do art. 165 do CPC/15 fazem destes institutos. Tais parágrafos traçam um perfil básico do conciliador e do mediador, respectivamente, apresentando as principais diferenças na atuação de cada um e as técnicas disponíveis para a obtenção da autocomposição. E mais, deixam claro que o conciliador atuará "preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes", já o mediador atuando nos casos em que houver esse vínculo prévio entre as partes.

A audiência do art. 334 do CPC/15, da qual deve participar, necessariamente, um conciliador ou mediador - não podendo ser realizada pelo magistrado que conduz o feito, sob pena de afronta à confidencialidade - só não será realizada se houver manifestação de todas as partes processuais optando pela não realização (na inicial, pelo autor, e em petição avulsa, 10 dias antes da data designada para a audiência, pelo réu, conforme preceitua o parágrafo 5º do mesmo artigo), ou se a questão posta em juízo versar sobre direito material sobre o qual não se admita autocomposição.

O legislador deu relevante importância a essa audiência - que prestigia a economia e a celeridade processual. Estabeleceu, inclusive, sanção por ato atentatório a dignidade da justiça (multa revertida em benefício do Poder Judiciário), na hipótese de não comparecimento injustificado de uma das partes à audiência. A despeito disso, nos três primeiros meses de aplicação do NCPC, a realidade de algumas comarcas paulistas, por exemplo, é diferente, com a notícia de ausência de designação da audiência, sob os mais variados argumentos (falta de estrutura suficiente, infração à duração razoável do processo, impossibilidade de autocomposição no caso concreto, por meio de simples análise da narrativa da petição inicial etc).

A par disso, o CPC/15 criou um procedimento especial, destinado ao tratamento das ações de família, que é bastante parecido com o procedimento comum. O artigo 695 do diploma processual prevê, então, a designação de audiência de mediação e conciliação em ações de família, como opção à resolução desses conflitos.

Assim, as ações de família enumeradas no caput do art. 693 devem seguir o procedimento especial criado pelo CPC/15, excluídas as ações de alimentos e aquelas que versem sobre interesses de crianças e adolescentes que, por expressa disposição do art. 693, parágrafo único, do CPC/15, devem se sujeitar ao procedimento previsto em legislação específica.

Feitos esses esclarecimentos iniciais, a questão que se coloca é saber se a audiência do art. 695 do CPC/15 seria obrigatória ou se poderia ser afastada em virtude da efetivação de negócio jurídico processual - acordo de vontade entabulado entre as partes, com vistas à alteração das regras procedimentais -, à semelhança do que ocorre com a audiência prevista no art. 334. Além disso, é relevante indagar, se haveria, na hipótese de não comparecimento das partes a essa audiência, a aplicação da sanção insculpida no parágrafo 8º do art. 334, do CPC/15.

Duas posições se levantam em torno dessas questões.

A primeira delas sustenta haver obrigatoriedade do comparecimento das partes a audiência.

E, para esses defensores, a grande preocupação do legislador foi tornar a mediação familiar o principal meio de resolução de disputas nessa seara, afastando a interferência estatal direta (representada pelo julgamento do caso). É na percepção da inadequação da intervenção de um terceiro estranho ao núcleo familiar para a solução do conflito, que reside a opção por tornar obrigatória a mediação para as ações de direito de família.

A razão para a criação de um procedimento especial para as ações de família reside na determinação contida no artigo 694 do CPC/15, no sentido de que todos os esforços serão tomados para a solução consensual da controvérsia.

Ora, se o CPC/15 propõe um modelo multiportas de resolução de disputas, no qual cada caso deve ser encaminhado para a técnica mais adequada para sua solução, nas ações de família os defensores dessa posição entendem que a opção do legislador é pela mediação como forma prioritária de resolução do conflito. Apenas excepcionalmente o caso deve ser efetivamente julgado, uma vez que o novel diploma processual pretende que os próprios envolvidos na relação familiar sejam os atores da solução de seu conflito.

É por isso que essa parcela da doutrina defende que a principal especificidade do procedimento especial para as ações de família consistiria, justamente, no fato de ser obrigatória a audiência de mediação, que não poderia ser dispensada pelo juiz ou por convenção das partes.

Por fim, consentânea com o entendimento acima, essa corrente doutrinária defende que a ausência injustificada de qualquer das partes na audiência de mediação deve ser sancionada pela aplicação da multa do parágrafo 8º do art. 334 do CPC/15. É que, não havendo disposição em sentido contrário, as regras gerais previstas para o procedimento comum aplicam-se, subsidiariamente, aos procedimentos especiais (art. 318, parágrafo único, CPC/15). O artigo 334, neste sentido, contém regras gerais que se aplicam às audiências de mediação ou de conciliação que sejam previstas em procedimentos especiais, como esse das ações de família.

Conclui-se, portanto, que aos que entendem a audiência de mediação como obrigatória nas ações de família, essa obrigatoriedade implicaria em que a designação da audiência nem seja uma faculdade do juiz e nem possa ser afastada por convenção das partes. Contudo, em situações de violência doméstica (física ou psicológica), por exemplo, a audiência poderá ser afastada, devido às peculiaridades do caso concreto; isso porque, o sentido de obrigatoriedade é de que ela não constitui uma opção, sendo impositiva, só não se realizando em graves situações excepcionais.

A segunda corrente defende, no entanto, a não obrigatoriedade de comparecimento a aludida audiência.

Isso porque, o princípio da voluntariedade deve ser respeitado inclusive nas audiências de mediação em ações de família, nos exatos termos do art. 2º, parágrafo 2º, da lei 13.140/15. Por isso, para os defensores dessa corrente, ninguém pode ser obrigado nem a comparecer à audiência e nem a mediar se assim não quiser e, por consequência, não há que se falar na aplicação de multa pelo não comparecimento das partes (inclusive, porque prevista apenas às audiências realizadas no procedimento comum, sob a égide do art. 334, NCPC).

Não se acredita, portanto, que a falta de imposição de sanção possa ocasionar o desvirtuamento do instituto, com a frustração das audiências do art. 695 do CPC/15. Ao contrário, como os conflitos de direito de família envolvem questões de cunho emocional, que não necessariamente são explicitadas nas petições que instruem o processo, impor multa à parte pelo não comparecimento a essa audiência pode tornar o ânimo das partes ainda mais beligerante e, com isso, dificultar a autocomposição buscada pela lei.

Parece, aliás, que o espírito da lei foi o de apoiar essa posição, pois há quem entenda que a determinação da citação desacompanhada da cópia da inicial contribuiria para que o réu comparecesse desarmado para a audiência e com comportamento menos beligerante (parágrafo 1º do art. 695, CPC/15). Mesmo para os que entendam que essa circunstância acarretará o desequilíbrio das partes, a infração ao princípio da isonomia e a não produtividade da audiência de mediação, a saída estará em buscar suprir essa condição com o acesso prévio dos autos pelo advogado da parte, tomando conhecimento do que ali está sendo apresentado e evitando quaisquer prejuízos.

Conclui-se, portanto, que o tema representa novidade no sistema e, com isso, muita discussão ainda poderá surgir em torno da questão e dos posicionamentos doutrinários conflitantes. Importante, então, aguardar como os Tribunais irão se posicionar a respeito das questões cabendo, contudo, às partes, nesse momento de incerteza, comparecerem à audiência, seja no procedimento ordinário ou especial, para, assim, não correrem o risco da penalização pelo não comparecimento.

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*Ana Marcato, Fabiana Ramos, Francisco Laux, João Lessa, Luis Bortolai e Silvio Pereira são membros do subgrupo de Mediação do CEAPRO - Centro de Estudos Avançados em Processo.

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