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PIS e COFINS. Não cumulatividade. Receita e despesas de propaganda. Taxa do cartão. Tributação e crédito. Insumo.

segunda-feira, 23 de março de 2020

Atualizado às 09:10

Comentários ao acórdão n. 3302-008.120 do CARF (3ª seção - 3ª Câmara - 2ª Turma Ordinária, Rel. Cons. Corintho Oliveira Machado, j. 9/1/2020).

1. Introdução

Nestes comentários pretendemos tratar da tributação quanto às contribuições sociais do PIS/PASEP e COFINS, no regime não cumulativo, conforme art. 195, § 12, da Constituição Federal e Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003, notadamente, com relação às verbas de propaganda cooperada e eventual dedutibilidade de bens e serviços utilizados como insumo (art. 3º, das respectivas leis citadas)1.

2. O caso concreto

Trata-se de lançamento de ofício em face de uma pessoa jurídica comerciante, a qual foi acusada em relatório fiscal de omissão de receita quanto aos ingressos de fornecedores no tocante à verba de propaganda e publicidade cooperada - VPC -.

Segundo a fiscalização, o contribuinte:

"realiza ações de marketing em seu nome destacando as mercadorias adquiridas nos veículos de comunicações e panfletos, cobra dos seus fornecedores uma remuneração pré-ajustada, sendo remunerada pelo serviço de marketing que realiza. E não uma recuperação de custos, pois o gerenciamento das ações de propaganda não são partilhados com os seus fornecedores".

Por conseguinte, "tem-se configurada a remuneração, devido ao serviço de publicidade e propaganda, da INSINUANTE realizados por seus fornecedores", tratando de "uma prestação de serviços, que devem está contida na receita operacional da fiscalizada".

Mais do que isso, temos ainda o não acolhimento dos créditos tomados quanto às despesas de publicidade e propaganda, reconhecidos como insumos, uma vez que, conforme relatório da fiscalização:

"A fiscalizada tomou créditos do PIS e COFINS sobre aquisição/despesas de serviços de propaganda sem que haja legislação que dê amparo legal ..., pois ... exerce de forma preponderante a atividade comercial de vendas de mercadorias no atacado e no varejo.

Tanto a lei 10.637/2002 (PIS) quanto a Lei nº 10.833/2003 (COFINS) estabelecem quais as atividades são sujeitas a créditos, bem como as ... IN SRF nº 358/03 e 404/04. ... estabelecem que não será possível a geração de créditos oriundos de serviços contratados de terceiros, mesmo de pessoa jurídica, se destinem a atividade-meio do contratante. Assim, são excluídas do conceito de insumo, isto é, essas despesas de propaganda/publicidade não foram aplicados ou consumidos na produção de bens ou prestação de serviços ...

... consideram-se descontados indevidamente os créditos referentes a despesas de propaganda/publicidade abaixo listadas, cabendo ... desconsiderar/excluir de oficio esses descontos realizados indevidamente. .. ..."

Por sua vez, o contribuinte, em sua defesa, alegou: (i) - a verba de publicidade e propaganda cooperada não configuraria faturamento e/ou receita, uma vez que configuraria um reembolso de valores utilizados para propaganda em favor de fornecedores e seus produtos, não existindo prestação de serviço; (ii) - poder-se-ia aplicar, por analogia, a exclusão da base de cálculo, nos termos do art. 13, da Lei n. 10.925/2004, bem com art. 53 da lei 7.450/85; (iii) - com relação às despesas de propaganda e publicidade, tratar-se-ia de insumo, uma vez que são essenciais a sua atividade econômica.

Houve julgamento perante a Delegacia de Julgamento, a qual, julgou parcialmente procedente a impugnação apresentada:

"ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL - COFINS

Ano-calendário: 2012, 2013, 2014

VERBA DE PROPAGANDA COOPERADA. DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. IMPOSSIBILIDADE.

As Verbas de Propaganda Cooperada, que são valores destinados a ações de marketing que promovam os produtos do fabricante comercializados nos estabelecimentos da varejista, caracterizam-se como receitas destes últimos e, como tais, estão sujeitas às incidências das contribuições para o PIS/Pasep e da Cofins, devendo compor sua base de cálculo.

INCIDÊNCIA NÃO-CUMULATIVA. CRÉDITOS DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA. POSSIBILIDADE.

Compondo a receita de publicidade e propaganda a base de cálculo do PIS/Pasep e da Cofins, devem ser considerados os créditos da não cumulatividade relativos a essa prestação de serviço, mesmo que tal atividade não seja aquela preponderante do sujeito passivo."

Tem-se, assim, recurso de ofício e voluntário do contribuinte.

3. A discussão jurídica em questão

Com relação ao caso precedente em análise temos as seguintes discussões: (i) - o fato de o contribuinte receber valores de terceiros com objetivo de destinar à divulgação de seus respectivos produtos facilitando as vendas, seria receita tributável ou reembolso de despesas?; (ii) - as despesas com propaganda e publicidade configuram insumo?

4. Julgamento no CARF. Razões de decidir

Em análise do recurso de ofício e voluntário, tem-se a manutenção do primeiro e negativa de provimento do segundo.

Quanto à tributação das verbas de marketing, ao negar provimento ao recurso e reconhecer a natureza de receita bruta, afirma:

"As chamadas Verbas de Propaganda Cooperada são, de fato, valores destinados a ações de marketing e propaganda que promovam os produtos do fabricante comercializados nos estabelecimentos da interessada.

Conforme contratos comerciais juntados às fls. 347/610, as Verbas de Propaganda Cooperada são pré-estabelecidas em uma porcentagem sobre o faturamento das vendas das mercadorias adquiridas junto ao fornecedor. Dessarte, não procede a alegação da interessada de que "os valores relacionados à VPC constituem meros ingressos de numerários no caixa da Impugnante visando a restituição de gastos/despesas conjuntas e, portanto, não poderiam integrar a base de cálculo do PIS e da COFINS."

Por fim, mantem a decisão da DRJ quanto ao direito de crédito, como insumo, para as despesas de marketing, adotando como razões de decidir a fundamentação de piso:

"Com efeito, a fiscalização considerou que a receita da prestação de serviço de publicidade e propaganda "está contida na receita operacional da fiscalizada", devendo compor a base de cálculo do PIS/Cofins. Mantido esse entendimento, conforme corroborado acima, devem ser considerados os créditos da não cumulatividade relativos a essa receita, ainda que a prestação de serviços de propaganda e publicidade seja um objetivo social secundário da interessada.

Uma vez considerada a receita da prestação de serviços de propaganda e publicidade na composição da base de cálculo das contribuições, é irrelevante, para a apuração dos respectivos créditos, o fato, apontado pela fiscalização, de que a atividade preponderante da interessada é o comércio de vendas de mercadorias no atacado e no varejo."

Diante de tais razões de decidir, passaremos aos comentários do acórdão.

5. Análise da decisão

Iniciaremos nossa análise do acórdão pela matéria ligada à tributação pelo PIS e COFINS dos ingressos dos valores pagos por fornecedores quanto à verba de propaganda e publicidade cooperada - VPC -.

Naturalmente, esta questão envolve dois aspectos, sendo um de natureza meramente jurídica-tributária e outro relacionado à situação concreta e provas produzidas.

Isto porque, em nossa visão, sob o ponto de vista jurídico, entendemos que a receita bruta tributável deve partir do art. 195, I, "b", do texto constitucional, de modo que esta em nossa visão o ingresso ou entrada financeira primária e definitiva, não sujeita à condições, decorrente da atividade empresarial principal do contribuinte, que leve ao incremento patrimonial positivo, ou melhor dizendo, agrega um elemento positivo ao patrimônio2. Deste modo, nem toda entrada ou ingresso financeiro configurará hipótese de incidência ou fato jurídico tributário de tais contribuições3.

A verba de publicidade, desde que firmada em um contrato de cooperação e rateio, onde aquele que recebe a verba, de fato, aplica efetivamente para a publicidade e propaganda dos produtos de seu fornecedor, mantendo um controle entre os valores recebidos e utilizados para tal fim, não configura receita tributável. Ora, o contribuinte neste caso estará somente intermediando, por questões de praticabilidade, sendo um elo entre o fornecedor e o interesse daquele em anunciar seus produtos, a fim de que as vendas no final da cadeia ocorram. De nada valeria uma indústria fazer um marketing para que os comerciantes adquiram seus produtos se, posteriormente, quando estão nas prateleiras (físicas ou virtuais), não há consumo ou venda. Por isso, este elo entre o fornecedor e o comerciante, atuando em conjunto, para a divulgação dos produtos a fim de incentivas as vendas, é algo essencial.

Daí porque, o que se constata é um mero ingresso, onde fornecedor realiza pagamentos destinados ao anuncio de seus produtos, sendo o comerciante um mero instrumento para que isto ocorra da melhor forma, conforme a realidade de seu público e região. Com isso, os valores não podem ser considerados receita bruta, pois, não são valores que ingressam de forma definitiva e incondicional no patrimônio da pessoa jurídica, muito menos em razão do exercício de sua atividade empresarial.

Quanto ao caso concreto, em sua fundamentação, o relator entende que a tributação de tais valores se dá, de forma pré-estabelecida em uma percentagem sobre o faturamento das vendas.

Ora, o fato de se realizar pagamentos vinculados ao faturamento, por si só, não justifica a tributação, desde que o contribuinte demonstre a destinação de tais valores, mediante prova de anúncios voltados aos produtos de seu fornecedor, bem como um controle financeiro e contábil, onde fique apontada a correlação entre o montante recebido e utilizado para tal fim. Daí não há contraprestação onerosa pelo comerciante, já que somente faz uma intermediação, por questões de praticabilidade, da destinação da verba de terceiro para que a divulgação de seus produtos, naquela localidade, seja aplicada da melhor forma possível.

Deste modo, o que, por hipótese, poderia ser tributado é o excesso pago durante um período, mas não o simples ingresso de todos os valores.

Já com relação ao tema dos créditos e a possibilidade de reconhecimento como insumo para as despesas de marketing, vejamos as ponderações.

Como é de conhecimento, em interpretação do art. 3º, II, das leis 10.637/2002 e 10.833/20034, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do resp. n. Resp. 1.221.170/PR, em sede de repetitivo, firmou entendimento no sentido de que "o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte".

Deste modo: (i) - a noção da expressão insumo e o direito ao crédito decorrente de bens e serviços utilizados como tal não se restringe aos critérios do IPI, tendo maior amplitude; (ii) - as Instruções Normativas 247/2004 e 404/2005 são ilegais por restringirem esta amplitude; (iii) - seriam insumos aqueles bens e serviços que, direta ou indiretamente, por aspectos de essencialidade e/ou relevância participam do processo produtivo (atividade empresarial); (iv) - não há de se aplicar ao referido dispositivo o art. 111, do Código Tributário Nacional.

Vale lembrar, ainda, que a interpretação há de ser realizada à luz do art. 195, § 12, da Constituição Federal5, a qual estabelece a não cumulatividade, que, por estar relacionada ao PIS e COFINS, impõe uma visão do direito ao crédito em função da receita bruta. Portanto, a visão do crédito em tal circunstância não pode ser restritiva, mas, em verdade, finalística, dando predominância à visão de neutralidade fiscal nas operações, bem como a relação entre receita tributada e despesa dedicada a atingir esta pretensão (não cumulatividade em função da receita)6.

Deste modo, tratando das despesas de publicidade e propaganda, segundo voto do relator, adotando as razões apontadas pela DRJ, configuraria insumo, pois haveria uma prestação de serviço secundário estando os valores contidos com receita operacional desta.

Tem-se, então, dentro de certa coerência, a interpretação de que, se a empresa ao receber tais valores a título de verbas para propaganda contrata serviços e/ou adquire bens para poder cumprir esta finalidade que levou à tributação como receita operacional, haveria uma correlação e essencialidade entre custos e receita, de tal sorte que permitiria o crédito como insumo, até porque, não inexiste vedação ou mesmo pretensão do legislador de somente permitir a tomado de crédito de insumo sobre a atividade principal.

Ademais, o fato de as despesas serem atividade-meio ou fim não influencia na tomada do crédito, já que há de avaliar toda a cadeia da atividade empresarial ou processo produtivo, como se dá por exemplo, na agroindústria, onde os insumos para a atividade-meio (atividade rural) não implica na impossibilidade do crédito.

É preciso, por conseguinte, avaliar se, em outras hipóteses, os gastos com publicidade e propaganda - poderiam, por exemplo, na cadeia da etapa industrial também levar ao creditamento.

Em nossa visão, de fato, referido precedente diante de suas razões de decidir não permitiria o crédito, por exemplo, no caso de uma indústria que promove a publicidade de um produto que fabrica, ou mesmo de um prestador de serviço que busca promover a sua atividade, pois, a premissa principal no acórdão foi da correlação entre o pagamento recebido e sua utilização para se "prestar um serviços" (contraprestação), de modo que os gastos com terceiros para viabilizar a propaganda, levaria ao reconhecimento como insumo.

Não obstante esta intepretação, convém esclarecer que, a partir de uma intepretação do texto constitucional, sobretudo, art. 195, I, "b", § 12, em conjunto com art. 3º, II, das leis 10.637/2002 e 10.833/2003, é possível sustentar a viabilidade do crédito no regime não cumulativo no tocante às aquisições de pessoas jurídicas de serviços marketing relacionados aos produtos elaborados e destinados à venda (comercialização).

A prestação do serviço de marketing sendo realizada por pessoa jurídica domiciliada no país, contribuinte das contribuições para o PIS e COFINS, desde que voltada para a divulgação de produtos elaborados pelo contribuinte (ou seja, industrialização que faz parte do processo produtivo - indústria) e destinados à comercialização (venda = faturamento), permite o entendimento de que haveria um gasto que envolve o próprio processo de produção por completo e com finalidade de gerar receita (não cumulatividade em função da receita).

É inerente à sua atividade empresarial a elaboração de produtos destinados à venda. Equivale dizer: as despesas de marketing por meio da contratação de pessoas jurídicas prestadoras de serviço estão totalmente voltadas para objetos (produtos) fabricados pela pessoa jurídica, que fazem parte de sua principal e efetiva atividade empresarial (industrialização e comercio), tem-se a conclusão de que seriam serviços voltados totalmente aos produtos elaborados por esta, possuindo, assim, total vinculação com sua atividade e mercadorias a serem comercializadas.

Como já dito, há de levar em consideração toda a cadeia ou etapa da atividade da pessoa jurídica, sob pena de ficar restrita à etapa da industrialização - IPI -, nada evoluindo na interpretação de que, para PIS e COFINS, a noção de não cumulatividade e insumo são em função da receita, e, por conseguinte, mais ampla.

Em tais condições, acreditamos que as despesas de propaganda e publicidade não de ser somente reconhecida como insumo no regime não cumulativo de PIS e CCOFINS, quando existe, mesmo que indiretamente, uma prestação de serviço com tal finalidade, mas, a depender do caso concreto e considerações apontadas, também quando há gastos voltados ao próprio produto elaborado e destinado à comercialização a fim de gerar receita bruta.

__________

1 Não trataremos neste trabalho da questão do cartão de crédito.

2 - CALCINI, Fabio Pallaretti. PARECER. PIS.COFINS. FATURAMENTO. RECEITA. INGRESSOS OBTIDOS DE FORNECEDORES. Revista Dialética de Direito Tributário, v. 213, p. 163-179, 2013. CALCINI, Fabio Pallaretti. PIS/PASEP E COFINS. TRIBUTAÇÃO DAS RECEITAS FINANCEIRAS. CONGRESSO IBET.

3 - "O conceito de receita, acolhido pelo art. 195, I, "b", da Constituição Federal, não se confunde com o conceito contábil. Entendimento, aliás, expresso nas Leis 10.637/02 (art. 1º) e Lei 10.833/03 (art. 1º), que determinam a incidência da contribuição ao PIS/PASEP e da COFINS não cumulativas sobre o total das receitas, "independentemente de sua denominação ou classificação contábil". Ainda que a contabilidade elaborada para fins de informação ao mercado, gestão e planejamento das empresas possa ser tomada pela lei como ponto de partida para a determinação das bases de cálculo de diversos tributos, de modo algum subordina a tributação. A contabilidade constitui ferramenta utilizada também para fins tributários, mas moldada nesta seara pelos princípios e regras próprios do Direito Tributário. Sob o específico prisma constitucional, receita bruta pode ser definida como o ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições" (STF, RE 606107, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-231 DIVULG 22-11-2013 PUBLIC 25-11-2013).

4 "II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi".

5 "§ 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do capu t, serão não-cumulativas".

6 - CALCINI, Fábio Pallaretti. Pis e Cofins. Algumas ponderações acerca da não-cumulatividade. Revista Dialética de Direito Tributário, v. 176, p. 41-64, 2010. CALCINI, Fábio Pallaretti. PIS/COFINS. NAO CUMULATIVIDADE E INSUMO. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS. In: VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA. (Org.). GRANDES QUESTÕES ATUAIS DO DIREITO TRIBUTÁRIO. 1ed.SÃO PAULO: DIALETICA, 2015, v. 19, p. 30-59.