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Porandubas nº 187

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Atualizado às 08:01

Uma espada e ramos de café

Quem vai ao Palácio dos Bandeirantes, encontra no Salão Nobre, cravado em madeira, o brasão do Estado : uma espada longa cercada por dois modestos ramos de café. Emoldurado pelo dístico :

- Pro-Brasilia fiant eximia. (Façam-se as melhores coisas pelo Brasil).

Que a maior parte dos leitores costuma assim traduzir :

- Fazendo exame para Brasília.

I

Perguntou uma pessoa a Aristóteles por que razão as coisas formosas se amavam ?

Respondeu :

- Essa pergunta é de cego.

II

Jactando-se um comerciante, em Atenas, de que, por representar um papel, haviam lhe dado um talento, respondeu Dêmades, orador muito eloquente :

- Parece-te muito receber um talento para falar ? Pois el-rei me deu dez para ficar calado.

Tinha o rei medo deste grande orador, um sabedor de suas torpezas.

Historinhas contadas pelo grande padre Manuel Bernardes.

Dilma, a revelação

Ao revelar que tinha um câncer e dar detalhes da pequena intervenção cirúrgica que extirpou um pequeno tumor sob a axila, a ministra Dilma Rousseff confere uma tintura de humanidade ao perfil Olimpiano. Na cultura de massas, o Olimpo é frequentado por "deuses" e "deusas", governantes, reis, príncipes, atores, atrizes, personalidades dos universos da política e do entretenimento. Para o homem comum, os Olimpianos são intocáveis, inquebrantáveis, insuperáveis. Uma doença os faz aproximar do cotidiano das pessoas. Os mortais têm dificuldade de imaginar uma princesa, um rei, um sultão todo poderoso no banheiro, por exemplo.

A humanidade solidária

Ao descer ao patamar das ruas e dos mortais, a ministra Dilma certamente abrirá uma gigantesca corrente de solidariedade. As pessoas se identificam com seus semelhantes na dor e no sofrimento. Quem já sofreu problema semelhante se comove. Pode chegar às lágrimas. Nesse momento, emerge a consciência de que todos são iguais no plano da humanidade. A solidariedade, por sua vez, dispara valores como proximidade, intimidade, conhecimento, amizade. As pessoas veem naquela personagem que sofre a extensão de suas fraquezas. O elo de sua humanidade. E o que isso tem a ver com voto ?

Voto é outra coisa

Pensar, porém, que a solidariedade, a comoção humana, a identificação na dor podem induzir o eleitor ao voto é tirar conclusões erradas. O eleitor brasileiro ainda conserva na imagem as figuras que partiram, deixando-as traumatizadas. Tancredo Neves, por exemplo. Temem que o voto em uma pessoa doente possa ter um efeito negativo para o futuro. Esta escolha será adequada para melhorar minha vida ? Portanto, é muito precipitado inferir que o problema vivido pela ministra Dilma pode aumentar suas chances de votos.

Cada coisa em seu tempo

Não significa dizer, ainda, que Dilma Rousseff será prejudicada. Há muito tempo pela frente. E, a se confirmarem, as chances de cura desse tipo de câncer - 90% - ela poderá chegar às margens eleitorais perfeitamente sadia e faceira. Pronta a receber os votos para uma candidata com plena saúde. Cada coisa no seu tempo e no seu devido lugar. Na política, a unida regra que se pode anotar é esta : não há regras absolutas. Tudo é relativo.

O açodamento partidário

É claro, porém, que os partidos políticos têm interesse em esquentar a polêmica. Na verdade, querem pegar carona na doença da ministra para avançar suas posições. De um lado, pensam em arrumar candidatos de seus quadros para integrarem um Plano B, de outro, tentam barganhar posições e alcançar nem que seja a posição de vice na chapa.

"O homem é. A sombra parece. O homem coloca a sua honra no próprio mérito, e é o supremo de si mesmo; ascende à dignidade. A sombra põe o seu na estima alheia, e renuncia a julgar-se: descende à vaidade." (José Ingenieros)

Lula mais atento

A doença da ministra Dilma exigirá do presidente Lula um olhar mais atento aos movimentos interpartidários, da base governista e da oposição. Ele identificou certo nervosismo no PT. Não arredará pé. Mas se as curvas do caminho impossibilitarem a chegada de sua candidata ao pódio, não terá dúvida em se valer do nome com maior viabilidade, não necessariamente do PT. Poderá haver rebeldia. Mas Luiz Inácio conta com seu cacife para manobrar as curvas.

Indiozinho

"Hoje me chamam de ministro
E eu decido sob respeitável toga.
Meu coração, porém, não mudou nada.
Continuo um romântico indiozinho
A remar sua piroga.
E a cismar por entre as árvores, à noitinha,
Vendo em cada pirilampo e em cada estrela
Os faiscantes olhos da namoradinha."

(Ministro Carlos Ayres Britto, do STF, em sua obra, Ópera do Silêncio).

Gripe replicante

Os vírus da gripe - humana, aviária - marcaram um encontro no focinho do porco. E a estampa que se extrai dessa esquisita estética é a chegada de pessoas portando máscaras nos aeroportos do mundo. A tecnologia na área das ciências médicas corre de maneira geométrica. A cada 10 anos, o ser humano ganha mais uns 2 de lambuja. Resultado das pesquisas. Mas a parafernália tecnológica não conseguiu dominar essa gripe replicante. É assim a humanidade. Plena de avanços e atrasos.

Cabral quer isso e aquilo

Sérgio Cabral quer mesmo é ser candidato à reeleição em 2010. Mas o governador do Rio de Janeiro teme um insucesso. Hoje, não tem uma boa avaliação, oscilando entre 25% e 30% de aprovação. Por isso, acena com a possibilidade de vir a ser o vice na chapa de Dilma. Cabral quer isso - mas não fecha questão. Tudo vai depender do início de 2010.

"À noite, entre um beijo e um bocejo,
o marido e a mulher abrem um para o outro
a bolsa das confidências."

(Machado de Assis)

Os dois olhos de Aécio

Aécio Neves tem um olho no Pólo Sul, outro no Pólo Norte. Avalia as chances de ser candidato tucano à presidência da República. Hoje, essas chances são de 3 em 10. Avalia as chances de ser candidato à presidência da República por um outro partido. As chances seriam, hoje, de 7 entre 10. Avalia a chance de ser candidato a vice de José Serra. Hoje, essa chance seria de 2 em 10. Avalia a chance de ser candidato a senador pelo PSDB de Minas Gerais. Hoje, essa chance seria de 8 em 10. Avalia a chance de se eleger presidente da República. Hoje, essa chance seria de 9 em 10. Mas há uma condição quase insuperável : ser o candidato do PMDB, apoiado por Lula. Insuperável ? Quase. Nada é insuperável na política.

As chances de Serra

Hoje, as chances de José Serra se eleger presidente da República são de 9 em 10. Em outubro deste ano, 8 em 10. Em fevereiro de 2010, 7 em 10. Em julho de 2010, 5 em 10, ou seja, 50%. Em outubro de 2010, ah, ah, ah.... vocês estão subestimando este analista ? Três pedrinhas do jogo de adivinhação : que cor terá a crise ? Qual o tamanho do voto transferido por Lula ? Quem será o(a) candidato(a) situacionista, Dilma ou outro ?

77 jogadores do Ceará

Você, caro leitor, eu e milhões de brasileiros demos alguns centavos para que 77 jogadores cearenses viajassem de avião pelo país. Não sei quantas partidas os jogadores do Ceará Sporting Club jogaram - se jogaram - quantas perderam ou quantas ganharam. O deputado Eugênio Rabelo deu as passagens. Pode alegar que não sabia se era proibido. Imaginem, agora, outros desvios cometidos na administração pública. Há quem calcule que essa montanha de dinheiro que corre pelo ralo ultrapassa a casa de um trilhão de reais. Quem sabe, quem sabe ?

O califa mendigo

Diz a lenda que Harum al-Rachid, califa de Bagdá, disfarçava-se de mendigo para descobrir o que seus súditos pensavam. Cercado pelos bajuladores que se juntam à volta do poder absoluto, só poderia perceber a verdade das coisas por caminhos tortuosos. Harum foi o califa que teria condenado à morte Sherazade e que, encantado com as histórias que ela lhe contou por mil e uma noites seguidas, retardou a execução e acabou se casando com ela.

EUA : cinco questões

Na campanha entre Bill Clinton e Bob Dole, em 1996, cinco questões básicas relacionadas a valores permitiam prever se alguém votaria num ou noutro. Os que deram respostas predominantemente conservadoras votaram em Dole. Aqueles cujas respostas relevaram que estavam menos comprometidos com os valores tradicionais votaram em Clinton. As perguntas eram as seguintes :

"1. Acredita que sexo antes do casamento seja moralmente errado ?

2. A religião é importante na sua vida ?

3. Já se interessou por ver pornografia ?

4. Tem opinião mais desfavorável sobre alguém que engana o cônjuge ?

5. O homossexualismo é imoral ?"

(Dick Morris em Jogos de Poder)

O cheiro das ruas

O cheiro das ruas é a vitamina da representação política. O deputado Silvio Costa (PMN), de Pernambuco, era defensor incondicional do uso de passagens por familiares dos deputados. Foi às ruas. Voltou ao Parlamento com outra visão. Apóia a medida moralizadora do presidente da Casa, Michel Temer. Mas o cheiro das ruas nem sempre bate no olfato. Impacta as mentes. O ministro Joaquim Barbosa, que criticou o presidente do STF, por não ir às ruas, foi ao Rio de Janeiro, em plena sexta-feira de trabalho. Foi às ruas colher os louros da popularidade. Cheiro afrodisíaco. Odor populista. Que impregna de fedor a toga dos juízes.

E a Marta, hein ?

Por onde anda Marta Suplicy ? Preparando-se para coordenar a campanha de Dilma Rousseff em São Paulo ?

Querem um conselho ?

Atenção, oportunistas gerais : esqueçam a doença da ministra. Mexer com isso será um bumerangue. Calem o bico. Arrumem outra lenha para acender a fogueira.

Lula e a transferência

Influência de Lula no processo eleitoral : Sul, índice 2 em 10; Sudeste, 3 em 10; Nordeste, 7 em 10; Norte, 7 em 10; Centro-Oeste, 6 em 10. Mais um ponto para lá ou para cá. O tempo, porém, será o senhor da razão.

Epílogo

"Um homem se propõe a tarefa de desenhar o mundo. Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, de reinos, de montanhas, de baías, de naus, de ilhas, de peixes, de moradas, de instrumentos, de astros, de cavalos e de pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que esse paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto." (Jorge Luis Borges)

Conselho aos parlamentares

Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na edição passada, o espaço foi destinado aos chefes dos Poderes. Hoje, volta sua atenção aos parlamentares:

1. O ciclo de crise intensa vivida pelo Parlamento aponta para a necessidade de reforma profunda nos padrões políticos.

2. O momento é propício para discussão da reforma política.

3. Se há pontos polêmicos e não consensuais, por que não começar por aspectos que reúnam a maior quantidade de apoios ?

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