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Porandubas nº 852

quarta-feira, 19 de junho de 2024

Atualizado em 18 de junho de 2024 15:32

  • Parte I

Fragmentos de tempos idos

Volto, nesta coluna, a pinçar ecos do passado.

Coluna Prestes

A Coluna Prestes invadiu Luis Gomes, minha cidade, na fronteira do RN com a Paraíba e o Ceará, em 5 de fevereiro de 1926, às 8h10, uma sexta-feira. O Estado-Maior Revolucionário era composto por Luis Carlos Prestes, Miguel Costa, Cordeiro de Farias, Siqueira Campos, Djalma Dutra, João Alberto e Ari Salgado. Só não estava Juarez Távora, que havia sido preso, em 31 de dezembro de 1925, nas proximidades de Teresina, ficando incomunicável no quartel do 25º B.C. da capital piauiense.

O saque na loja do meu pai

Muitos fugiram da cidade. O tenente coronel Djalma Dutra requisitou por escrito da loja de meu pai grande quantidade de tecidos e cereais. Lembra Adolfo Paulino, o biógrafo, ex-prefeito e meu padrinho, que ouvira isso do próprio Gaudêncio, meu pai, de quem herdei nome e sobrenome (Francisco Gaudêncio Torquato do Rego).

- Principalmente brim caqui para fardamento, chapéus, sapatos, além de peças de tecido vermelho para a confecção de lenços para os revoltosos.

Djalma Dutra, em nome de Prestes, fez a requisição em um pedaço de papel, prometendo ressarcir o prejuízo, após a vitória da Revolução. O documento era guardado em um velho cofre verde na loja e se perdeu por ocasião da morte do meu genitor. Segundo Câmara Cascudo, em seu livro "História do Rio Grande do Norte", os prejuízos em Luis Gomes foram de 23 036$096, mas os de São Miguel (outra cidade da região) somaram 307 330$000.

O pai preso

Gaudêncio chegou a ser preso por Siqueira Campos, que exigiu uma soma em dinheiro para soltá-lo. Atendendo a apelos, Campos o soltou com o pagamento de cinquenta mil réis e muita "diplomacia". Pedido feito com bons modos. Em certo momento, curioso, meu pai queria saber o que iria acontecer. Ele mesmo contava, com graça, o episódio em que se aproximou do Estado Maior, cujos componentes se preparavam para almoçar na repartição da Agência Postal Telegráfica, dirigida pelo telegrafista baiano Vilas-Boas. O grupo conversava e meu pai, de fininho, se aproximou. De repente, Prestes olhou para o intruso e perguntou: "O jovem quer alguma coisa"? Ao ouvir isso, Gaudêncio se afastou, apressadinho.

Cordeiro de Farias

Travei contato com uma figura que, na ditadura, foi ministro do Interior de Castello Branco, o Marechal Cordeiro de Farias, um dos líderes da Coluna Prestes. Foi a Recife como ministro do Interior, onde estava localizada a SUDENE, sob sua alçada. Oportunidade em que o conheci, iniciante em minha carreira jornalística no Jornal do Brasil. Acompanhei a comitiva, que saiu de Recife para a fronteira do Maranhão com o Piauí, onde seria construída a barragem da Boa Esperança. O evento constou da explosão de uma rocha para desvio de águas do Rio Parnaíba. Os jornalistas pregaram um Douglas DC-3, atrás do avião do ministro e outras autoridades. Nas margens do rio, receoso, aproximei-me de Cordeiro de Farias, logo após a explosão da pedra. Lembrei o episódio. "Luís Gomes? Na fronteira com a Paraíba? Ah, sim, me lembro". Ele recordava-se da cidade/região, não do episódio. Riu muito. A Coluna Prestes caminhou 647 dias, percorrendo cerca de 24 mil quilômetros (média de 38 km/dia), utilizando mais de 100.000 cavalos e consumindo mais de 30.000 reses na alimentação da tropa. Morreram 600 soldados e 70 oficiais. Dispararam cerca de 350.000 tiros e travaram 53 combates. Saiu do Nordeste, atravessou todo o país e após o centro-oeste, Luís Carlos Prestes, em 1927, entrou na Bolívia e, a seguir, foi para a Argentina. A divergência ideológica, em 1930, separou os companheiros.

Getúlio Vargas

Getúlio Vargas sempre conservou intenções continuístas. Um dia, foram procurá-lo para saber se isso era verdade. E ele:

- Não, meu candidato é o Eurico (marechal Eurico Gaspar Dutra); mas se houver oportunidade, eu mudo uma letra: Eu Fico.

(Relato da historiadora Isabel Lustosa)

Jânio Quadros

JQ exercia autoridade com muita competência. Sabia exercê-la. Certa feita, na subida da rua Bela Cintra, em São Paulo, numa sexta-feira, de carros parados nos Jardins, começou uma zoeira infernal. Buzinadas prolongadas. Eu mesmo buzinava. Até o momento em que os motoristas viram sair de um carro preto o prefeito Jânio, que fazia "incertas" e visitas de surpresa aos ambientes. Mandava multar os donos de lojas, com calçadas sujas. Vi que o motorista do então prefeito Jânio anotava placas de todos os carros que buzinavam. O silêncio foi se refazendo, à medida que os motoristas descobriam quem era a pessoa estranha que ordenava as multas. Jânio impunha respeito.

Bebericava bem

Apreciava a bebida. Bebia de tudo, mas nos últimos anos de vida, contentava-se em sorver garrafas de vinho do porto. Quando disputou o governo do Estado contra Ademar de Barros, na eleição de outubro de 1954, Ademar contratou alguém para pegar Jânio na pergunta capciosa: "por que o senhor bebe tanto?" De pronto, Jânio deu o troco: "bebo porque é líquido. Se fosse sólido, comê-lo-ia". O entrevistador, sem graça, saiu de fininho. Jânio fazia gama com suas próclises, mesóclises e ênclises. Foi professor de português. Os despachos de Jânio constituem um capítulo à parte no folclore político que construiu. O professor Nelson Valente, quem mais conhece a história de JQ, tem um grande repertório de casos e "causos". E livros. As historinhas são hilárias. De uma feita, respondendo a uma senhora que interferia em favor das sociedades protetoras dos animais, sugerindo criar um setor de defesa dos irracionais, o presidente respondeu: "minha amiga, seu apelo em favor dos irracionais encontra-se às voltas com terríveis problemas de amparo e proteção a outra raça tão digna, entre nós, de cuidado, a dos racionais".

JK

Conheci Juscelino Kubitschek em 6 de janeiro de 1961, por ocasião da inauguração do açude de Orós, que tinha capacidade para armazenar quatro bilhões de metros cúbicos de água. Tinha eu 15 anos e viajei com minha mãe, Chiquita, cujo pai morava em Orós (também cidade de Fagner, o cantor). Impressionou-me o sorriso aberto e simpático de JK. O presidente com charme e carismático.

JQ x FHC

Lembro Jânio Quadros. Tempos de campanha eleitoral em São Paulo, capital. As eleições municipais ocorreram em 15 de novembro, como parte das eleições em 201 municípios nos 23 Estados brasileiros e nos territórios Federais do Amapá e Roraima. Foi a primeira eleição da Nova República e a primeira vez que os paulistanos escolheram seu alcaide pelo voto direto desde José Vicente Faria Lima em 1965. Nessa época, este consultor presenciou alguns erros cometidos por Fernando Henrique, que disputava com Jânio a prefeitura da capital. Jânio, sem grana e sem recursos, refugiou-se em um dos estúdios da então TV Record, na avenida Miruna, em Moema, de onde fazia perorações duras (e sem efeitos televisivos) contra a bandidagem e a violência que assolavam a capital. Dona Eloá, ao seu lado, com o olhar para chão, doente e vestida de maneira simples, não dizia um pio. Fazia o papel de esposa silenciosa.

FHC na cadeira de prefeito

Ao lado de um perfil que emanava autoridade, respeito, dignidade, Fernando Henrique Cardoso, vestido em seu blazer xadrez, corria a periferia, gravando para o programa eleitoral entre os trilhos do metrô que deveria chegar à Zona Leste. Simplicidade e austeridade, de um lado; fausto e opulência, de outro. Algo era incongruente. Um scholar na periferia? Um popularesco escondido na TV? O sociólogo perdeu a eleição, depois de ter sentado na cadeira de prefeito, atendendo a pedidos de fotógrafos.

FHC chega ao trono

FCH, depois dessa curva, assumiu a presidência da República em 1º de janeiro de 1995, após derrotar Luiz Inácio Lula da Silva, seu principal concorrente, no primeiro turno, com mais de 30 milhões de votos. FHC havia fundamentado sua primeira campanha presidencial no então recém-lançado Plano Real e na promessa de estabilizar a economia do país. O plano surtiu efeito, conseguindo debelar os exorbitantes índices de inflação, estabilizando o câmbio e aumentando o poder aquisitivo da população, sem choques nem congelamento de preços.

Em 1998

A eleição presidencial de 1998 no Brasil foi realizada em um domingo, 4 de outubro de 1998. Foi a terceira eleição presidencial do país após a promulgação Constituição Federal de 1988. Pouco antes desse pleito foi aprovado um projeto de emenda constitucional permitindo a reeleição aos ocupantes de cargos no Poder Executivo. Em segundo lugar ficou Luiz Inácio Lula da Silva do Partido dos Trabalhadores (PT) com quase 32% dos votos. Ciro Gomes, então membro do Partido Popular Socialista (PPS, atual Cidadania), veio em terceiro lugar, com mais de sete milhões de votos (quase 11% do total). Esta eleição trouxe o uso das urnas eletrônicas, que seriam utilizadas em todos os municípios no pleito seguinte. A disputa pela presidência em 1998 contou com 12 candidatos, o maior número da história do país desde a eleição de 1989, quando mais do que o dobro de candidaturas foram lançadas.

Fofoca que "puniu" Heleno Torres

As conversas com o ex-presidente Michel Temer geralmente ocorrem em almoços: ele, o amigo em comum José Yunes e este escriba. (Esses encontros costumam ocorrer às sextas-feiras e, às vezes, contavam com a participação com Delfim Netto, com sua verve apurada, o advogado Antônio Claudio Mariz de Oliveira e outros que integram um "clubinho" de advogados amigos). Em um desses almoços, em um restaurante nos Jardins, deparamo-nos com o advogado e professor da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, o pernambucano Heleno Torres, um dos maiores tributaristas do país, que se fazia acompanhar em sua mesa do então Advogado-Geral da União, Luis Inácio Adams. Ao nos ver chegar, Heleno e Adams dirigiram-se à nossa mesa para cumprimentar Michel. O mesmo ocorreu na saída. Heleno despediu-se de nós. Perguntei a Heleno: "E aí, já é ministro?". O advogado respondeu: "Não, mas se for convidado, você receberá convite para minha posse". Ao chegar ao meu escritório, vi estampada no UOL a manchete: "Heleno Torres escolhido para o STF". Jornalista, não pude resistir à ideia de confirmar a informação. Disse o que Heleno teria me dito; "não fui convidado, mas se for, você será convidado para a posse". Coloquei-a no Twitter. Instantes depois, recebo um telefonema de Thomas Traumann, então ministro da Secretaria de Comunicação, em tom de recriminação, dizendo que a informação não era verdadeira e que estava sabendo de nossa confraternização em um restaurante. Confraternização? Que maluquice era essa? Indaguei. Segundo a fofoca, estávamos todos, Michel à frente, brindando o convite a Heleno Torres... Azucrinavam os ouvidos da presidente Dilma, que não acreditou estarmos em mesas separadas, não havendo almoço conjunto nem comemoração. Insisti para que ele, Traumann, lesse a manchete nas redes sociais. Hoje, mantenho a informação: vi estampada na rede de um jornal a informação sobre a escolha do tributarista.

Resumo da história: se estava prestes a ser convidado, o amigo Heleno teria perdido a vaga por causa desse lamentável episódio, que mostra a índole da então presidente Dilma: "castigar" o professor por uma informação errada que recebera de sua assessoria. Luis Inácio Adams estava presente. Não seria o caso de ser ouvido pela presidente?

  • Parte II

Raspando o tacho

- Parece que Lula está assustado com a infidelidade de sua base de apoio.

- Parece que a bancada evangélica está assustada com a reação da sociedade contra o PL do antiaborto, o da gravidez infantil.

- Parece que Arthur Lira perde força no comando da Câmara baixa.

- Parece que Putin quer levar adiante sua incursão invasora na Ucrânia.

- Parece que Vladimir Zelensky perde as esperanças de continuar a receber ajuda dos países da EU.

- Parece que Biden está assustado com as provocações de seu adversário, Donald Trump, em sua reiterada insinuação de que o andar claudicante do mandatário norte-americano sinaliza estado senil.

- Parece que Trump está receoso de continuar a fustigar o juiz que, no próximo mês de julho, ditará a sentença para as 34 penalidades que pairam sobre sua cabeça.