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Porandubas nº 836

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Atualizado às 13:53

Abro a coluna com o impagável José Maria Alkmin.

Calma, prisão suavemente...

José Maria Alkmin foi advogado de um crime bárbaro. No júri, conseguiu oito anos para o réu. Recorreu. Novo júri, 30 anos. O réu ficou desesperado:

- A culpa foi do senhor, dr. Alkmin. Eu pedi para não recorrer. Agora vou passar 30 anos na cadeia.

- Calma, meu filho, não é bem assim. Nada é como a gente pensa da primeira vez. Primeiro, não são 30, são 15. Se você se comportar bem, cumpre só 15. Depois, esses 15 são feitos de dias e noites. Quando a gente está dormindo tanto faz estar solto como preso. Então, não são 15 anos, são 7 e meio. E, por último, meu filho, você não vai cumprir esses 7 anos e meio de uma vez só. Vai ser dia a dia, dia a dia. Suavemente.

(Sebastião Nery conta a historinha em Folclore Político).

  • Parte I

A violência afugenta investidores

A manchete faz o alerta: a violência é um fator que afugenta os investidores no Brasil. E faz com que o país deixe de crescer 0,6 ponto do PIB. É a análise do Fundo Monetário Internacional mostrando que insegurança custa caro ao país e diminui a produtividade da economia. No últimos dias, o país tem vivido episódios que atestam como a violência afeta a economia. Na rua Santa Ifigênia, centro de comércio eletrônico da capital paulista, um empresário teve sua loja invadida. O prejuízo foi de R$ 300 mil e o dono decidiu fechar seu estabelecimento. Na Cracolândia, região central de São Paulo, lojas de produtos eletrônicos foram também invadidas.

Expansão do crime

Nos últimos anos, o número de estabelecimentos comerciais na região despencou, de acordo com matéria de O Estado de São Paulo. Em 10 anos, a quantidade de empresas caiu de 15 mil para cerca de 2,5 mil. O ambiente é de medo. Veja, leitor: antes de você terminar de ler este parágrafo, mais de dois cidadãos estão tombando ou sendo assaltados, nos vastos espaços do território nacional, vítimas da bandidagem. Entre janeiro e outubro do ano passado, 71.078 pessoas morreram por causas violentas, uma média de 234 mortes por dia. De cinco doentes que baixam nos hospitais brasileiros, pelo menos um é vítima de uma "guerra civil" que mata por ano quase 50 mil brasileiros, três vezes mais que nos Estados Unidos, mais gente que os mortos em conflitos étnicos, e mais do que a guerra entre Rússia e Ucrânia.

O rombo da previdência

A violência empobrece o país. O rombo da Previdência tem a colaboração do cano assassino que aleija multidões, alarga fila de hospitais, multiplica pensões de viúvas e devasta 10% do PIB, ou seja, R$ 84 bilhões, dinheiro que poderia estar sendo investido em hospitais, escolas, habitação, transportes, agricultura.

Mata-mata

O quadro é aterrador: bandidos assaltando, matando pessoas; chacinas explodindo nos finais de semana; policiais matando bandidos; bandidos matando policiais; policiais matando policiais; bandidos roubando o dinheiro de companheiros presos; cárceres apinhados; estupros e mortes violentas cometidas pela mais fria estupidez. O número total de custodiados no Brasil é de cerca de 650 mil em celas e cerca de 200 mil em prisão domiciliar. Nas prisões-depósito, feitas para abrigar 107 mil presos, cerca de 196 mil presos germinam novas formas de violência, enquanto as gavetas se entopem com 240 mil mandados de prisão, envolvendo, no mínimo, 100 mil bandidos soltos nas ruas, 40 mil só em São Paulo.

Proporção geométrica

A brutalidade jorra em proporção geométrica e as paliativas soluções governamentais - melhoria e ampliação do sistema penitenciário, reforço e reaparelhamento das polícias - estão longe de um crescimento em proporção aritmética. Os cinturões metropolitanos, já saturados de lixões que ofertam um banquete pantagruélico para urubus, crianças e mães famintas, são também palco para a exibição de corpos chacinados em decomposição, vítimas do maior ciclo de violência do Brasil contemporâneo. Trata-se, no fundo, da projeção da sombra do FMI sobre o país, com seu rígido programa monetário e escandaloso custo social.

Recursos necrológicos

A miséria dos conglomerados periféricos abre vastas oficinas de morte. E assim o mais rico país do mundo em recursos biológicos está se transformando no mais fértil país do mundo em recursos necrológicos. Os descalabros se sucedem na área de segurança, com a bandidagem produzindo a mais aterradora estatística de mortes violentas de que se tem notícia. Os governos, inermes, permanecem estáticos, olímpicos, discursivos, eloquentes, apenas cheios de boas intenções. As polícias estão desmotivadas. O crime compra espaços nas prisões, superlotadas, nas delegacias e nos quartéis. E a solução certamente não passa pela pedagogia da soltura de bandidos perigosos, como querem alguns.

A onda mundial do crime

É triste. O país se torna um dos países mais violentos da humanidade. A violência, de tão desalmada, está matando a vontade do povo. Sem ânimo, emoções envenenadas pela angústia, os cidadãos entram no limbo catatônico, assemelhando-se a dândis em passeio macabro e estonteante por um jardim de horrores. A violência suga a vitamina da vida, a alegria de viver. O que fazer? Lutar com a arma da mobilização. Denunciar, pressionar, acusar, assinalar, abrir a palavra.

Toffoli e o perdão

Se há uma autoridade que parece querer ser o símbolo do perdão no país, esta é o ministro Dias Toffoli. Bilhões de dívidas de empresas que cometeram ilicitude e foram objeto de investigação pela operação Lava Jato foram suspensas por decisão do ministro. Suspensas, não anuladas, dizem advogados de clientes que advogaram contra a Lava Jato. O plenário do STF dará a palavra final? Esta é uma dúvida. Petrobras e ex-Odebrecht, investigadas pela operação Lava Jato, confessaram suas culpas. Bilhões foram devolvidos aos cofres públicos. E agora?

José Paulo Cavalcanti

O jurista José Paulo Cavalcanti Filho, a respeito das decisões de Toffoli e Alexandre de Moraes sobre as investigações da Lava Jato, em entrevista à Rádio Jornal (Recife), segunda-feira, explica: "Todo o palavreado dos ministros está baseado em gravações da Intercept, site de notícias que divulgou gravações sobre a Lava Jato"... (e lembra) que, nos EUA, "o Poder Judiciário aceita gravações autorizadas como prova, mas as não autorizadas apenas como provas circunstanciais, pois precisa estar acompanhada de outras evidências para ser considerada"... essa situação funcionou como "substrato" para Toffoli e Moraes... "de forma técnica, é um escândalo que isso ocorra. Na política é outro escândalo.", diz o ex-ministro da Justiça do governo Sarney, José Paulo Cavalcanti. E arremata: "eles não poderiam ter usado, e ainda que isso mudasse a gravação feita por alguém que é réu por fraudar gravações".

O retrato em dados

O site Poder360, criado e dirigido pelo competente jornalista Fernando Rodrigues, esboça um retrato da Lava Jato em números: "No total, de março de 2014 a março de 2019, as operações deflagradas no Rio e no Paraná resultaram em 1.644 buscas e apreensões, 262 conduções coercitivas, 347 prisões preventivas, 196 prisões temporárias. Com o descobrimento de esquemas ilícitos e a detenção de possíveis envolvidos, os procuradores da Lava Jato apresentaram 167 denúncias, muitas baseadas em delações premiadas que resultaram na abertura de inquéritos".

600 réus

"Somente no âmbito do STF (Supremo Tribunal Federal) foram instaurados 300 inquéritos. Atualmente, segundo a PGR, já são mais de 600 réus. O Ministério Público também firmou 183 acordos de colaboração premiada e 12 acordos de leniência, além de 1 termo de conduta. Com os acordos de colaboração, foi possível recuperar R$ 13 bilhões. Os procuradores também fizeram 548 pedidos de cooperação internacional no âmbito da Lava Jato, sendo 269 pedidos ativos para 45 países e 279 pedidos passivos com 36 países. No Paraná, o MP apresentou 91 denúncias no âmbito da Lava Jato, nas quais 426 pessoas foram acusadas de envolvimento nos crimes".

  • Parte II

Raspando o tacho

- Arthur Lira, o poderoso presidente da Câmara, acha que o ministro da Articulação Institucional, Alexandre Padilha, não faz um bom trabalho. Comenta-se que pediu sua "cabeça". Lula assegura permanência de Padilha. Este, evidentemente, tornou-se alvo de Lira por ter contrariado seu desejo de avolumar sua fatia de poder. Lula espera acalmar os ânimos. Será difícil. O presidente da Câmara alardeia: o Orçamento não é uma peça apenas do Executivo.

- Indícios de que a economia não dará os resultados esperados é um morteiro na imagem do governo. Pode ter impactos nas campanhas de candidatos petistas.

- Bolsonaro ressuscita o "cercadinho", onde dava ligeiras entrevistas, na frente do Palácio da Alvorada. Que vontade de fustigar Lula.

- Lula começa a correr o país para "nacionalizar" a campanha municipal. Começou por São Paulo e pela Baixada Fluminense.

- Fez bem o Rei Charles em autorizar a transparência sobre seu estado de saúde. Tempos de clareza.

- O ministro Toffoli manda investigar a ONG Transparência Internacional Brasil...

- Elmar Nascimento, deputado Federal (União-BA), pode vir a ser o próximo presidente da Câmara.

- A historiadora Lilia Schwarcz disputa com o romancista/diplomata Edgard Telles Ribeiro a vaga número 9, que foi ocupada por Alberto da Costa e Silva na ABL. Lilia é a favorita. Eleição daqui a um mês. Informação de Lauro Jardim, de O Globo.

Fecho a coluna com um alerta aos candidatos deste ano.

Propaganda negativa

A revolução francesa de 1789 pode ser considerada o marco da propaganda agressiva nos termos em que hoje se apresenta. Ali, os jacobinos, insuflados por Robespierre, produziram um manual de combate político, recheado de injúrias, calúnias, gracejos e pilhérias que acendiam os instintos mais primitivos das multidões. Na atualidade, é a Nação norte-americana que detém a referência maior da propaganda agressiva, mola da campanha negativa. Este formato, cognominado de mudslinging, apresenta efeitos positivos e negativos. No contexto dos dois grandes partidos que se revezam no poder - democrata e republicano -, diferenças entre perfis e programas são mais nítidas e a polarização sustentada por campanhas combativas ajuda a sociedade a salvaguardar os valores que a guiam, como o amor à verdade, a defesa dos direitos individuais e sociais, a liberdade de expressão, entre outros. Nem sempre a estratégia de bater no adversário gera eficácia.