Abro a coluna com uma fábula.
Em 5 anos, tudo pode ocorrer
Um poderoso sultão, sábio entre os sábios, possuía um camelo muito inteligente. Obedecia a todas as ordens que nem precisavam ser emitidas de viva voz. Faltava-lhe apenas o dom da palavra. Esse detalhe entristecia sobremaneira o sultão. Um dia, decidiu convocar o Grande Conselho e chamou o grão-vizir.
- Quero que ensine meu camelo a falar!
- Mas isso é impossível.
- Cortem-lhe a cabeça! Tragam-me o adjunto!
Mesma afirmação de desejo sultanesco, mesma resposta, mesma sentença. A cena repetiu-se diversas vezes e cabeças rolaram. Exasperado o sultão declarou.
- Aquele que ensinar meu camelo a falar será meu grão-vizir.
Silêncio.
O sultão repetiu a exortação. Eis que surgiu um humilde ajudante de cozinheiro. Disse:
-Dá-me, ó incomparável senhor, um prazo de cinco anos, e farei falar teu camelo.
Estupefação geral. Seguida do cumprimento da promessa.
-Doravante, és meu grão-vizir ! Mas se falhares, sabes o que te espera.
- Bem sei!
Encantado, o jovem fez profunda reverência e saiu correndo para dar a boa notícia à esposa.
- Infeliz, acabas de assinar tua condenação.
- Não é bem assim, meu bem. Pedi cinco anos. Você sabe que muitas coisas poderão acontecer em cinco anos: morre o camelo, morre o sultão...
(Fábula enviada por Alexandru Solomon)
Maquiavel
"Um príncipe precisa usar bem a natureza do animal; deve escolher a raposa e o leão, porque o leão não tem defesa contra os laços, nem a raposa contra os lobos. Precisa, portanto, ser raposa para conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos". E mais de Maquiavel. "Não é necessário ter todas as qualidades, mas é indispensável parecer tê-las."
Panorama visto de cima
De cima, a paisagem é mais densa. Dá para avistar a pirâmide social com suas pequenas e grandes turbulências, com suas classes médias em ritmo de volta às antigas atividades, as margens inquietas sem saber o que fazer nos próximos tempos, confusas ante os pacotes de auxílio, misturando uma profusão de promessas - vale gás, bolsa família em extinção, auxílio de R$ 400, cadastro único confuso, duração dos "presentes", etc. O topo passando ao largo da crise e sofrendo os abalos da bolsa e do bolso.
Panorama visto de baixo
De baixo, os detalhes surgem aos montes. Filas, desespero, vacinas em processamento de segunda dose e dose de reforço, Ministério da Saúde boicotando a vacina do Butantã, o governo sem rumo, Paulo Guedes sofismando para anunciar um crescimento do PIB brasileiro maior que o de outros países, Bolsonaro reafirmando suas convicções sobre a Amazônia úmida e "inqueimável", a pandemia voltando com força na Europa, lockdown na Áustria, um documento internacional colocando a democracia brasileira em declínio, medo em outros países, ameaça do carnaval ser esvaziado, uma queimada imensa na floresta dos tucanos, Arthur Lira confiante no seu Centrão, debandada à vista se Bolsonaro entrar no PL, atração de outros que teriam vontade de acompanhar o capitão etc., etc.
A terceira via
Os tucanos estão rachados. A banda de Doria, o governador de SP, espera que ele vença as tais prévias mal administradas. A banda de Leite, governador do RS, acha que houve sabotagem no processo de votação, e que ante a sua provável vitória, teria havido um curto circuito no sistema tecnológico de votação, a cargo de uma Fundação contratada para gerir a votação eletrônica. Artur Virgílio, ex-senador e ex-prefeito de Manaus, o terceiro pré-candidato, estaria pendendo a apoiar João Doria. Seja quem for o vencedor, o PSDB perde força e inviabiliza seu candidato com a roupa da alternativa para enfrentar Lula e Bolsonaro.
Lula na Europa
O périplo de Lula na Europa foi um sucesso. Foi recebido com pompa de chefe de Estado pelo presidente francês Emmanuel Macron no Palácio do Eliseu, paparicado pela mídia, mas continuou a prestigiar o amigo Daniel Ortega, na Nicarágua, que está faz tempo no comando do país. Fez uma comparação: "se Ângela Merkel está há 16 anos no poder na Alemanha, por que Ortega não pode ter mais um mandato"? Esquece que a Alemanha é um país democrático, a Nicarágua é uma ditadura. Para completar a aberração comparativa, atribuiu ao "embargo americano" os problemas de Cuba. Sem esquecer de fazer loas ao amigo Maduro, da vizinha Venezuela.
Será candidato?
Este analista político continua a acreditar que lá para março ou abril de 2022, Lula declinará de sua candidatura em favor de um candidato de centro-esquerda.
Geraldo Alckmin
O ex-governador de São Paulo está só aguardando os resultados das prévias no PSDB para decidir sobre seu destino. Pode ser vice na chapa de Lula? Este escriba não acredita nesta hipótese. Mas, na política, tudo é possível. As portas do PSD parecem as mais apropriadas. Geraldo fará a hora. E espera acontecer.
Garcia
Rodrigo Garcia, o vice-governador de SP, candidato de João Doria ao governo de São Paulo, é jovem, mas não é jejuno na política. Saiu do DEM para entrar no PSDB. Larga, hoje, na trilha dos pré-candidatos com cerca de 5%. Mas tem muito para crescer. Aprendeu com Kassab.
O estilo de João
O governador de SP é considerado o maior patrocinador da vacinação em massa no Brasil. São Paulo bate recordes em muitas áreas. João é determinado, trabalha muito, controla o governo com mão de ferro, buscou investimentos, enfim, tem uma boa avaliação na percepção de gente de bom senso. E por quê sofre uma rejeição tão alta? Resposta: o estilo é o homem. João tem mania de perfeição. É certinho. Faz o que considera mais apropriado. Esse jeito gera certo desconforto. Dá impressão de muita ambição. Muita vontade de subir, subir, subir. E deixar amigos na estrada. Tucanos de alta plumagem vivem dizendo isso.
Militares apreensivos
A leitura nas entrelinhas de quem acompanha de dentro a política dá conta de que os militares começam a ficar preocupados com sua imagem. O profissionalismo que impregnava a imagem dos quadros ficou com os respingos do conceito de politização. Muitos permanecem na máquina administrativa, dando lugar às especulações. O bolsonarismo já não conta com solidariedade plena das FFAS.
Serra deixando a política?
O senador José Serra tirou uma licença do Senado para tratar da saúde. Trata-se de um dos melhores quadros da política brasileira. Muitos falam que estaria se afastando da lide política. Assumiu seu lugar um quadro de valor, o ex-deputado José Aníbal, um exímio analista da paisagem nacional. Saúde para os dois.
A banalização de coisas ruins
Vão soltar uma bomba de muitos quilotons na floresta amazônica como parte do programa de treinamento das Forças Armadas. Ah, é? Essa deslavada mentira não mexeria com os brios de milhões de brasileiros, que se acostumam à banalização de mentiras, versões estapafúrdias e ideias mirabolantes. A maldade se espalha destroçando as coisas belas e boas. A morte tornou-se banal. As queimadas tornaram-se banais. A violência, de tão corriqueira, não mais impacta nossos espíritos. Tempos sombrios. Tristes trópicos. O que fazer?
Alavancas do discurso I
Pincemos pequenas lições dos clássicos da política para balizar o discurso. Existem alguns símbolos detonadores e indutores do entusiasmo das massas em, pelo menos, quatro categorias. Eis as quatro alavancas psíquicas:
1. Alavancas de adesão - Discurso voltado para fazer com que a população aceite os programas, associando-se a valores considerados bons. Nesse caso, o protagonista precisa demonstrar a relação custo-benefício da proposta ou da promessa.
2. Alavancas de rejeição - Discurso voltado para o combate às coisas ruins (administrações passadas, exemplos de corrupção, por exemplo). Aqui, o orador passa a combater as maldades de outros, os pontos fracos das administrações, utilizando, para tanto, as denúncias dos meios de comunicação que funcionam como elemento de comprovação do discurso.
Alavancas do discurso II
3. Alavancas de autoridade - Abordagem em que o candidato usa a voz da experiência, do conhecimento, da autoridade, para procurar convencer. Sob essa abordagem, entram em questão os valores inerentes à personalidade do ator, suas qualidades pessoais. Quando se trata de figura de alta respeitabilidade, o discurso consegue eficácia.
4. Alavancas de conformização - Abordagem orientada para ganhar as massas e que usa, basicamente, os símbolos da unidade, do ideal coletivo, do apelo à solidariedade. É quando o político apela para o sentimento de integração das massas, a solidariedade grupal, o companheirismo, as demandas sociais homogêneas.
O discurso político
Costumo bater nesta tecla. Muita gente se engana com a eficácia do discurso político. Pois bem, o discurso político é uma composição entre a semântica e a estética. O que muitos não sabem é que a eficácia do discurso depende 7% do conteúdo da expressão e 93% da comunicação não verbal. Esse é o resultado de pesquisas que se fazem sobre o tema desde 1960. E vejam só: das comunicações não verbais, 55% provêm de expressões faciais e 38% derivam de elementos paralinguísticos - voz, entonação, gestos, postura, etc. Ou seja, do que se diz, apenas pequena parcela é levada em consideração. O que não se diz, mas se vê tem muito maior importância. Portanto, senhoras e senhores que encenam peças em entrevistas, anotem esta informação.
Fecho a coluna com mais Maquiavel.
O tirano
Maquiavel conta no Livro III dos Discursos sobre os primeiros dez livros de Tito Lívio a história de um rico romano que deu comida aos pobres durante uma epidemia de fome e que foi por isso executado por seus concidadãos. Argumentaram que ele pretendia fazer seguidores para tornar-se um tirano. Essa reação ilustra a tensão entre moral e política. Mostra que os romanos se preocupavam mais com a liberdade do que com o bem-estar social.