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Porandubas nº 720

quarta-feira, 16 de junho de 2021

Atualizado às 08:02

A ignorância é mãe dos delinquentes. O não saber é pai da barbárie. Seus filhos são delinquentes incapazes de adaptar sua conduta à moral e aos bons costumes. Refugiam-se na sombra da mediocridade. Sob a escuridão das noites. Orgulham-se de seus atos torpes e criminosos. Quando apanhados pelas malhas da Justiça, choramingam sua covardia. Infelizmente, desfilam cada vez em maior número numa macabra legião que marcha, atropeladamente, em direção à ignomínia.

(Pequeno texto inspirado em O Homem Medíocre, de José Ingenieros, para dizer que o vandalismo chega aos cantos mais remotos do país, como a serra onde nasci, Luís Gomes, extremo oeste do Rio Grande do Norte, bucólica, em tempos idos, e hoje com suas praças devastadas pela delinquência).

Aos leitores, aviso que o humor está no final da coluna. É um "causo" hilário.

Aglomerações

Em nossas plagas, a banalização da ilegalidade faz escola. Costumo lembrar os quatro tipos de sociedade existentes no mundo: o primeiro é a sociedade inglesa, onde tudo é permitido, salvo o que for proibido; o segundo é a sociedade alemã, onde tudo é proibido, salvo o que for permitido; o terceiro é a totalitária, ditatorial, onde tudo é proibido, mesmo o que for permitido; e o quarto tipo é a brasileira, onde tudo é permitido, mesmo o que for proibido. E o pior é que o mau exemplo vem de cima. Da mais alta autoridade da República, o senhor presidente, que continua a fazer aglomerações e a não usar máscaras em seus eventos de rua.

Até quando?

Quando veremos o império da ordem e da Justiça? Ou será que as leis não pegam? Perguntaram a Sólon, um dos sete sábios da Grécia antiga, se havia produzido boa legislação para os atenienses. Respondeu: "Dei-lhes as melhores leis que podiam suportar". Perguntaram ao barão de Montesquieu, o formulador da teoria da separação dos Poderes, quais as boas leis que um país deve ter. A resposta: "Quando vou a um país, não examino se há boas leis, mas se são executadas as que existem, pois há boas normas por toda parte". Pois é, por aqui, a quebra da norma começa com os poderosos.

Quantas leis o senhor fez?

Pergunte-se a um representante do povo no Parlamento brasileiro que critérios guiam a tarefa legislativa. É provável que aponte o número de projetos apresentados - sem destaque para o mérito -, corroborando a ideia de que, em nossa seara parlamentar, vale mais a quantidade do feijão plantado sobre a terra, do qual pouco se aproveita, do que a qualidade da semente.

A extravagância

Amparadas pela "força" (?) da lei, coisas estapafúrdias como o Dia da Jóia Folheada (toda última terça-feira de agosto), o Dia das Estrelas do Oriente, a Semana do Bebê e outras esquisitices povoam a roça do joio legislativo, cultivada por parcela ponderável do corpo parlamentar. Instados fossem a discorrer sobre a natureza de nossas leis, os Sólons tupiniquins poderiam sacar uma resposta como esta: "São as leis que os brasileiros têm de aguentar". Cada povo com sua medida e capacidade legislativa.

Silêncio dos animais

Há tempos, em Santa Maria/RS um vereador propôs a "lei do silêncio dos animais" para evitar latidos de cachorros após as 22h; em Catanduva/SP um projeto determinava que os doentes deveriam morrer em cidades vizinhas por causa da superlotação das sepulturas (nesse momento, então, a lei seria rapidamente aprovada); em Sobral/CE, sugeriu-se construir torres gêmeas para abrigar a prefeitura e as secretarias; em Manaus um vereador queria instalar um neutralizador de odores nos caminhões de lixo; e em Porto Alegre cavalos e burros teriam de usar fraldas, "com exceção dos que participarem de eventos". Incrível, porém verdadeiro.

Burocracia

Padecemos de aberrações como as descritas acima e de outras herdadas do nosso passado colonial. Somos um país que ainda não cortou as amarras da secular árvore do carimbo, "preciosidade" trazida pelos colonizadores portugueses. O carimbo foi criado por dom Diniz nos idos de 1305 para conferir autenticidade a documentos. Concedido a "homens bons", nomeados pelo rei, que juravam fidelidade aos santos Evangelhos, incrustou-se na vida brasileira a ponto de atravessar, incólume, mais de cinco séculos. Deixa sua tinta forte na própria era digital.

Falsa autoridade

A autenticação e os selinhos de cartórios trazem obsoletos costumes ao nosso cotidiano, pavimentando os caminhos da burocracia. Explica-se o cartorialismo ainda pela capacidade de fortalecer a estrutura de autoridade; esta, por sua vez, se expande na esteira de leis que procuram impor a ordem do mundo ideal. Trata-se da visão platônica de plasmar a realidade por força da lei. A célebre pergunta "você sabe com quem está falando?" expressa a ideia de que o poder deriva do cargo de quem o detém. O brasileiro, mais que outros povos, desfralda essa bandeira.

Morrer pela pátria

Daqui a pouco, chegaremos aos 500 mil mortos pela foice do corona-19. "Dulce et decorum est pro pátria mori" - Doce e digno é morrer pela Pátria - escreveu Horácio, o poeta romano em verso que traduz um dos mais nobres sentimentos políticos. Nos idos contemporâneos, este sentimento é um arrazoado de palavras ao vento.

Multas

O presidente Bolsonaro e dois ministros foram multados pelo governo do Estado de São Paulo por descumprirem a regra de uso de máscara em aglomerações. Perguntas com respostas já sabidas: quando serão pagas essas multas? Para onde foram enviadas? Ou tudo não passa de encenação? Se chegarem aos destinatários, o que estes farão com elas? Nas antessalas dos Palácios, ouvem-se gargalhadas.

O nome

Será extremamente difícil chegar-se a um nome político que possa canalizar partidos e facções. Principalmente se este nome já tem história na agenda eleitoral. O ideal seria um perfil asséptico, não contaminado pelo vírus da política, de uma idade entre 40 e 60 anos, empreendedor, com origem profissional na área privada. Se vier da política, que seja o mais limpo possível. Aceitam-se sugestões.

Disputa por antecipação

O governador João Doria antecipou em um mês o calendário de vacinação no Estado, prometendo vacinar todos os adultos até 15 de setembro. O prefeito Eduardo Paes, do Rio de Janeiro, chamou Doria de "pai das vacinas", mas topou o desafio, devendo também antecipar o calendário da capital. Boa disputa. Deve ser estimulada pela comunidade.

Quem não deve....

Por que algumas figuras se negam, com veemência, a prestar depoimentos na CPI da covid-19? O ditado reclama: "quem não deve, não teme".

Siga o dinheiro

Esse também é um bom conselho para os integrantes da CPI. Sigam a rota do dinheiro, corram na pista do dinheiro. Deve aparecer falcatruas. Para muitos brasileiros, a curva é uma larga reta.

Balas perdidas

A tragédia se expande com essas balas perdidas atiradas a todo momento por policiais e bandidos no Rio de Janeiro. Sonhos desfeitos, dores no seio familiar. Vidas destruídas.

Santos Cruz

O nome do general Santos Cruz, que chefiou a Casa Civil no governo Bolsonaro, tem se mostrado uma voz de alerta contra a politização das Forças Armadas. Recebe o respeito da sociedade. Esse militar, da reserva, tem todas as condições de pleitear um cargo na esfera político-institucional. Bom senso e equilíbrio.

André Mendonça

Está chegando a hora da nomeação de um perfil "terrivelmente evangélico" ser nomeado para o STF na vaga do ministro Marco Aurélio, que se aposenta. Quem? O favorito é André Mendonça, ministro-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União). Mas o presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Humberto Martins, também está no páreo. Os dois fazem telefonemas para os senadores.

O número 3

O vereador Carlos Bolsonaro, leio, não perde uma viagem do pai. Fica todo tempo calado e observando as cenas. Teria sido o autor da engrenagem do presidente nas redes sociais. O rapaz sabe lidar com essas coisas. Integrado ao mundo digital. Melhor seria se assumisse de maneira oficial o papel do estrategista do governo.

Primórdios

"Rastreie, vá ao encalço de homens de toda e qualquer região, passe a conhecê-los, cultive e fortaleça a amizade, cuide para que em suas respectivas localidades eles cabalem votos para você e defendam sua causa como se fossem eles os candidatos". (Quinto Túlio Cícero aconselhando o irmão Marco Cícero, o grande tribuno, em 64. A. C., quando este fazia campanha para o Consulado de Roma)

O marketing de campanha

O marketing político eleitoral abriga duas vertentes: o marketing massivo, voltado para atingir classes sociais e categorias profissionais, indistintamente; e o marketing vertical, segmentado ou diferenciado, voltado para atender agrupamentos especializados: profissionais liberais, donas de casa, formadores de opinião, núcleos religiosos, militares, funcionários públicos, etc. Nas campanhas, o marketing segmentado acaba assumindo tanta importância quanto o marketing massivo. E a razão está na intensa organicidade da sociedade brasileira.

Fecho a coluna com uma historinha do Paraná.

Promessa de campanha

A historinha foi enviada por um leitor do Paraná.

Candidatos de duas famílias disputavam a prefeitura de uma pequena cidade. Final de campanha. A combinação era de que os dois candidatos e seus familiares teriam de usar o mesmo palanque. Discursou, primeiro, o candidato que tinha 70% de preferência dos votos:

- Povo da minha amada terra, povo ordeiro, trabalhador, religioso e cumpridor de suas obrigações. Se eleito, irei resolver o problema de falta de água e de coleta de esgoto. Farei das nossas escolas as melhores da região, educação em tempo integral. Vou construir uma escola técnica do município...

E arrematou:

- E tem mais, meus amigos, ordeiros, religiosos e cumpridores de seus deveres morais, vocês não devem votar no meu adversário. Ele não respeita nossa gente, nossas famílias, nossos costumes. Ele desrespeita nossa igreja. Ele nem se dá ao respeito. Vocês não devem votar nele. Porque ele tem duas mulheres.

O adversário, com 20% de intenção de voto, quase enfartou quando viu a mulher, ao seu lado, cair no palanque. Ela não aguentara ouvir a denúncia do adversário de que o marido tinha uma amante. A desordem ganhou o palanque. A multidão aplaudia o candidato favorito e vaiava o adversário. Cabos eleitorais começaram a se engalfinhar. Passado o susto, com muita dificuldade, o estonteado candidato acusado de ter duas mulheres começa seu discurso, depois de constatar que a esposa estava melhor:

- Meu amado povo, de bons costumes e moral ilibada, religioso e cumpridor de seus deveres morais, éticos e religiosos. Quero dizer aos senhores e senhoras aqui presentes, que, se agraciado com seus votos me tornar o prefeito desta cidade, farei uma mudança de verdade. Não só resolverei o problema da falta de água, como farei também o tratamento de todo o esgoto do município, construirei uma escola técnica e um novo hospital.

A multidão caçoava do coitado e de sua mulher. Mas ele não desistiu e foi em frente :

- Vou melhorar o salário dos professores, a merenda das crianças e ainda vou instituir o Bolsa Cidadão! Agora, prestem bem atenção. Se os amigos acharem que não podem votar em mim porque tenho duas mulheres, votem no meu adversário! Mas saibam que a mulher dele tem dois maridos.

A galera veio abaixo. O pau comeu. Brigalhada geral. Urnas abertas. O adúltero ganhou com 76% dos votos.