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Porandubas nº 717

quarta-feira, 26 de maio de 2021

Atualizado às 08:03

Panorama

Burrice ou estultice?

Depois de comparecer duas vezes à CPI da Covid-19, o ex-ministro da Saúde, general da ativa Eduardo Pazuello, compareceu ao ato de domingo passado, um evento de motoqueiros em homenagem ao presidente Bolsonaro. Erro crasso. Militar na ativa não pode comparecer a evento político. Pior é que essa subida em palanque ocorre depois de Pazuello ter dito e repetido que Bolsonaro e ele defendem o uso de máscara. Pois nem ele nem o presidente usaram máscara. O general confessa que errou. Errou na logística do comparecimento? Burrice ou estultice? Uma asneira arrematada.

Punição

Se o general errou, deve ser punido. Mourão, o vice-presidente, deu a pista: sair logo da ativa para aliviar a pena. O respeitado general Santos Cruz proclama: um erro que não pode passar em branco sob pena de desmoralizar a Força. P.S. O presidente Jair Bolsonaro ordenou a lei do silêncio nas investigações sobre a participação do general Pazuello na "motorciata", domingo passado, no Rio de Janeiro. P.S. E se o general enveredar pelos caminhos da política, hein? Mosca azul?

A lei do 1/3

Está na boca dos analistas políticos: as oposições à esquerda contam, hoje, com 1/3 do eleitorado e simpatizantes (PT, PSOL, parte do PSB); os núcleos de centro contam com 1/3 (PSDB, MDB, DEM, parte do PSD e outros) e os governistas, à direita, partidos no entorno do presidente agregariam também 1/3 (PP na liderança e parcelas de outros). Essa equação dos três terços é a mais referenciada (não reverenciada). A mais repetida. Quem vai desarrumar a equação para lá ou para cá é o motor da economia. A conferir.

Lula de centro?

Minha querida mãe, que Deus levou aos 102 anos, sempre me dizia: "meu filho, nunca diga - desta água não beberei". Popular e sábia advertência. Lula ser considerado, hoje, um perfil de centro, é uma entortada no canivete suíço. Lâminas indobráveis. Mas o próprio já chegou a dizer que é a própria "metamorfose ambulante".

Desgaste de material

Eis o imbróglio que pegará muita gente pelo gogó. O eleitor/consumidor vota, convive, consome o mesmo produto por anos a fio. Com o tempo, uma crosta de bolor se forma em torno dele. Parede velha, esburacada, carecendo de reboco. Pintar sobre a parede sem cuidar do reboco é gastar tinta. O tempo desgasta os materiais. Por isso, as paredes precisam receber um tratamento mais adequado. Com argamassa nova e resistente. Cimento de boa qualidade. Pensem, agora, quem está rebocando suas paredes?

Lista do reboco

Quem, entre esses, vocês acham que carece de fina (F), média (M) ou grossa argamassa (G)? Um lembrete: perfis apontados como G tendem a sofrer maior resistência do eleitor/consumidor. Minhas pontuações: - Luiz Inácio Lula da Silva - G; - Ciro Gomes - G; - João Doria - M; - Sérgio Moro - F; - Luiz Mandetta - F;- ACM Neto - M; - Jaques Wagner - M; - Fernando Haddad - M - Jair Bolsonaro- G; - Rui Costa - F; - Eduardo Leite - F; - Eduardo Paes- M; - General Mourão - G.

O paradoxo do mentiroso

Em época de muita mentira e lero-lero, vale a pena lembrar o quebra-cabeças atribuído a Eubulides, aluno de Euclides, conhecido como "o paradoxo do mentiroso". Se alguém (escolha um político ou governante, ministro ou ex-ministro) disser "essa afirmação é falsa", estaremos diante do seguinte paradoxo. Se a afirmação for falsa, então a afirmação do emissor é verdadeira, pois foi o que ele disse. Mas se ele falou verdadeiramente, a afirmação tem de ser falsa, porque ele falou que era falsa. Arremate: se é falsa, conclui-se que a afirmação é verdadeira; e se é verdadeira, segue-se que é falsa afirmação. Deixemos que os senadores quebrem a cabeça na CPI da Covid-19.

Diógenes

Governo parece querer oxigenar os espaços do patrimônio cultural. O advogado, poeta, escritor e presidente da Academia Norte-rio-grandense de Letras, Diógenes da Cunha Lima, foi convidado para integrar o Instituto Histórico e Artístico Nacional. O Iphan cuida do patrimônio cultural do país. Diógenes é o escritor que mais escreveu sobre Câmara Cascudo, com quem conviveu. E guarda uma coleção de histórias e depoimentos sobre o maior folclorista brasileiro, orgulho do Rio Grande do Norte.

Cascudo

Vejam este depoimento, pinçado do livro "Câmara Cascudo, um Brasileiro Feliz", colhido por Diógenes da Cunha Lima: "Eu só escrevi, pesquisei, trabalhei naquilo que amava. De maneira que não posso escolher entre meus livros aquele que mais amo. Todos foram feitos com amor, com a mesma técnica de pesquisa. O povo, depois a pesquisa bibliográfica. O povo entrava com 70% e depois vinha a identificação no tempo e no espaço do que eu tinha ouvido do povo. Eu tenho um livro, Trinta Histórias Brasileiras, que foi editado em Portugal e lá se esgotou. São estórias contadas pela mesma velha, uma velha de Ceará-Mirim, branca. Analfabeta, cuja área de percurso na vida era de Ceará-Mirim a Natal. Foi uma das minhas professoras do ponto de vista de literatura oral".

A médica Mayara

A médica Mayara Pinheiro, que comanda uma Secretaria no Ministério da Saúde (Gestão do Trabalho e na Educação da Saúde) e que depôs ontem na CPI da Covid-19, muito falante, relativizou os conceitos por trás das perguntas que lhe foram feitas. A verdade é relativa; a ciência não tem respostas para muitas questões; nenhum país é obrigado a seguir as orientações da OMS; Manaus foi a maior experiência de sua vida profissional; há mais de mil textos defendendo a cloroquina no combate à Covid-19; foi convidada pelo então ministro Luiz Mandetta, a quem tem respeito e apreço e assim por diante. Defendeu com veemência o uso da cloroquina, inclusive para crianças. Deve entrar na política.

Terceira dose?

Ante evidência de que algumas vacinas apresentam baixa eficiência em idosos, especialistas começam a pensar e a falar sobre uma terceira dose. Pesquisas preliminares. É uma hipótese bastante viável mais adiante.

Transformista

A maior performance do transformismo na frente da administração Federal cai no perfil do ministro da Economia, Paulo Guedes. O pleno liberal privativista é um camaleão, um bicho mimético que ganha as cores das folhas ao seu redor. Não é de admirar que acabe pregando o Estado paquidérmico, com reabsorção de empresas de todos os tamanhos.

Pessimismo e otimismo

Os vetores de decisão do eleitorado são influenciados por dois elementos que parecem paradoxais. De um lado, um pessimismo galopante, que se faz presente nas locuções de que o "o país não tem jeito, estamos todos perdidos, não vale a pena lutar por isso, a roubalheira vai continuar, etc.". De outro, um otimismo extravagante, que evidencia a superlativa dose emotiva da alma nacional. Nesse sentido, as alavancas de força se apresentam nas festas de época e fora de época, no carnaval, nas antigas folias cotidianas dos bares e até na esteira da bagunça que, em maior ou menor grau, transparece na fisionomia das cidades, na improvisação dos motoristas de trânsito e na linguagem desabrida das ruas. A pandemia, porém, deixou o país mais pessimista e triste.

Bandeira

Hora de puxar para a paisagem o lamento de Manuel Bandeira: "que adianta a glória, a poesia, a beleza, a linha do horizonte? Eu só vejo o triste beco".

Juro dizer a verdade

Juro dizer a verdade, nada mais que a verdade. O Brasil é a terra da ética, do respeito aos valores morais que dignificam o homem e do cumprimento exemplar das leis. O caráter de seu povo é reto e imaculado, fruto de uma herança cultural profundamente alicerçada no civismo, na solidariedade, no culto às tradições, na religiosidade, no respeito aos mais velhos, no carinho e proteção às crianças e na repartição justa dos bens produzidos. Neste país, atingir a honra de um cidadão equivale a ferir a alma da pátria. Aqui, preserva-se e cumpre-se o abençoado lema "todos por um e um por todos". A ironia também se faz presente na paisagem institucional.

A grandeza de uma nação

A grandeza de uma Nação não é apenas a soma de suas riquezas materiais, o produto nacional bruto. É o conjunto de seus valores, o sentimento de pátria, a fé e a crença do povo, o sentido de família, o culto às tradições e aos costumes, o respeito aos velhos, o amor às crianças, o cumprimento da lei, o culto à liberdade, a chama cívica que faz correr nas veias dos cidadãos o orgulho pela terra onde nasceram. A anulação de alguns desses valores faz das Nações uma terra selvagem. Responsabilidade que se deve, em grande parte, à incúria dos governantes, cujo olhar se descola da realidade social para mirar o espelho narcisista das ambições pessoais.

Curto conto

Uma parábola: "há pessoas que não conseguem perceber o que se passa ao redor. Não veem que não veem, não sabem que não sabem".

Zé cai em um poço e está a 10 metros de profundidade. Olha para os céus e não vê o buraco. Desesperado, começa a escalar as paredes. Sobe um centímetro e escorrega. Passa o dia fazendo tentativas. As energias começam a faltar. No dia seguinte, alguém que passa pelo lugar ouve um barulho. Olha para o fundo do poço. Enxerga o vulto de Zé. Corre e pega uma corda. Lança-a no buraco. Concentrado em seu trabalho, esbaforido, cansado, Zé não ouve o grito da pessoa: "pegue a corda, pegue a corda". Surdo, sem perceber a realidade, Zé continua a tarefa de escalar, sem sucesso, as paredes. O homem na beira do poço joga uma pedra. Zé sente a dor e olha para cima, irritado, sem compreender nada. Grita furioso:

- O que você quer? Não vê que estou ocupado?

O desconhecido se surpreende e volta a aconselhar:

- Aí tem a corda, pegue-a, que eu puxo.

Mais irritado ainda, Zé responde sem olhar para cima:

- Não vê que estou ocupado, ó cara. Não tenho tempo para me preocupar com sua corda.

E recomeça seu trabalho.