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Porandubas nº 593

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Atualizado às 07:51

Renovação da política

Nesses tempos de renovação partidária e, queira Deus, da purificação de alguns costumes, a coluna relembra essa história, como exemplo.

Robaina, vereador do MDB de Bagé/RS, ficou no PMDB depois da extinção da Arena e do MDB. Vivo, pôs a mulher no PDS. O senador Pedro Simon estranhou:

- Robaina, como é que você fica no MDB e sua mulher no PDS?

- Pois é, presidente. Ainda tenho três filhos para a reforma partidária.

O eleitor no furacão

O pleito de 7 de outubro vai ficar marcado na história como o mais devastador da velha política nesses tempos de crises política, econômica e ética. O eleitor fez questão de dar um recado tão intenso, que nem mesmo as pesquisas detectaram seu impacto. A velha política foi jogada na cesta do lixo. Grandes figuras da política tradicional foram alijadas do processo. A renovação veio em cheio. Foi a eleição das surpresas. No contraponto, outsiders apareceram, entre os quais o empresário Romeu Zema, em Minas Gerais, e o juiz Wilson Witzel no Rio de Janeiro, que disputarão o segundo turno da campanha contra Antônio Anastasia e Eduardo Paes.

Petismo e anti-petismo

No plano presidencial, o pleito se caracterizou por ser uma disputa entre o petismo e o antipetismo, na esteira do clássico bordão tão ecoado pelos petistas: "Nós e Eles". O PT foi amplamente castigado pelo voto do Sudeste, maior reduto eleitoral do país (Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo) e, ainda, por enclaves do Sul, Centro-Oeste e Norte. O petismo deu boa resposta no Nordeste, onde, com exceção do Ceará (Ciro levou a melhor), Haddad bateu Bolsonaro.

Quase 1º turno

Com quase 50 milhões de votos, o capitão quase ganhou no 1º turno. Houve um empuxo na última semana, a formar uma onda bolsonariana que puxou classes médias, contingentes das margens, setores produtivos e engajamento de grupos identificados com as bancadas evangélica, agronegócio, profissionais liberais. O voto útil acabou não aparecendo na quantidade desejada e assim Ciro Gomes, que poderia ser o catalisador dessa modalidade, ficou para trás.

Campanha inusitada

Vimos uma campanha inusitada: mais curta, mais asséptica quanto à limpeza das ruas, mais contundente na área dos discursos, cheia de ódio entre os militantes. E mais: os dois mais rejeitados foram os dois mais desejados, a denotar que a polarização acaba jogando a questão da rejeição ao segundo plano. Também foi uma campanha onde o líder dos votos ficou praticamente afastado das ruas. O atentado que sofreu - uma facada na barriga em Juiz de Fora - obrigou-o a ficar em um hospital e em sua casa.

Inversão

Praticamente sem recursos, o capitão Bolsonaro inverteu a ordem dos eixos do marketing eleitoral: sem aparecer, teve a mais forte visibilidade em função do simbolismo que passou a representar e da forte inserção de seu nome nas redes sociais. Vídeos sobre ele correram nas redes. Tiradas picantes e algumas cheias de humor. Ganhou a batalha da comunicação de bico calado. A articulação social foi a perna do marketing mais desenvolvida nessa campanha: os movimentos organizados praticamente realizaram as tarefas dos cabos eleitorais.

Radicalização

Haddad foi empuxado de Lula, a partir da prisão na PF em Curitiba, onde praticamente montou o comitê central da campanha petista. O padrinho transferiu cerca de 40% dos votos do Nordeste para seu afilhado. Não passou mais pela onda bolsonariana que bateu na região na última fase da campanha, com eleitores cheios de vigor e dispostos a fazer carreatas. O bolsonarismo fez campanha com a tocha acesa, assumindo posições radicais. Foi mais forte que o PT na radicalização. O PT ficou refém da Lava Jato, escondendo os erros e malfeitos de dirigentes e ex-dirigentes envolvidos na operação.

Dilma, a esquecida

A ex-presidente Dilma Rousseff foi esquecida na campanha de Haddad. Ficou em Minas Gerais, onde esteve sempre na frente das pesquisas. Nunca o PT fez purgação de seus pecados, na tentativa de querer terceirizar as responsabilidades pelo mensalão e pelo petrolão. Dilma se consolava com a perspectiva de pode enfrentar no Senado seus acusadores e apoiadores do impeachment que sofreu. E eis que os mineiros lhe dão um novo castigo: sem votos para sua eleição. Será difícil para a ex-presidente voltar a ter importância na moldura política.

Dirceu, o estraga festa

José Dirceu, o maior estrategista do PT, cometeu o deslize de dizer que uma coisa é ganhar uma eleição e outra é tomar o poder. O que seria uma questão de tempo para o partido. O efeito foi o de dar medo, sob a ilação de que o PT poderia trilhar os caminhos de um golpe. Ruim para Haddad. Vamos acompanhar o 2º turno para captar a expressão de Dirceu.

Mourão na contramão

Da banda bolsonarana, a expressão que causou aborrecimentos foi a do vice, o general Mourão. Falou sobre o 13º de modo a dar lugar à especulação: Bolsonaro vai acabar com ele. Quis explicar os detalhes técnicos do 13º como se isso fosse o suficiente para melhorar a compreensão de sua fala. Pior. Deu ideia de que o assunto seria enfrentado em um governo do capitão, que acabou dando um puxão de orelha no general. Como o falador irá se comportar no 2º turno?

Mudanças

Que mudanças poderão ocorrer nos contingentes eleitorais? Vamos a algumas posições, a partir do reconhecimento de que os votos em campanha intensamente polarizada tendem a se manter. Mas é visível o esforço de Haddad para arrastar partidos e lideres do "centro democrático", como a ele se refere. Os votantes de Ciro Gomes e os setores intelectuais do PSDB tendem em grande parte a correr em direção a Haddad. Ma há tucanos que perfilarão ao lado de Bolsonaro, como o candidato ao governo de São Paulo, João Doria. Já FHC e seu entorno irão para a banda de Haddad. Ciro já declarou apoio ao petista. Isso importa?

Autonomia do eleitor

O que se constata nesse pleito é a autonomia do eleitor, sua disposição de não seguir os caminhos traçados por candidatos de quaisquer partidos. Uma parcela dos eleitores de Ciro até pode caminhar com Haddad, mas isso não significa que o pedetista transfira o voto de seus maiores redutos. Quem é contra o PT, não vai raciocinar sob o manto de conceitos de democracia, autoritarismo, liberalismo, social-democracia, etc. Há um ranço antipetista imune às doutrinas.

PSL, o grande salto

O PSL é o partido com a maior força vitoriosa. Com 52 deputados, vem logo depois do PT, ganha posição de 1ª bancada. E assim podemos descobrir que um nanico pode ser catapultado às alturas. Não se sabe o que ocorrerá com ele. Mas, ante a perspectiva de extinção de 14 siglas, em função das obrigações contidas na cláusula de barreira, a vingar já nesse pleito, pode ser que o PSL venha a ganhar uma leva de congressistas. A conferir.

A cláusula da purificação

A eleição de domingo, além de toda a varrição que provocou na política, ainda servirá para purificar a barafunda de partidos sem alma e quase sempre sem ideologia que infesta o panorama. Dos 35 existentes, 14 não conseguiram atingir um desempenho mínimo nas urnas e perderão instrumentos fundamentais para sua sobrevivência. Serão impedidos pela cláusula de barreira. A nova regra exige ao menos 1,5% dos votos válidos nacionais ou mínimo de nove deputados em pelo menos nove Estados. Esses partidos ficarão sem tempo de propaganda no rádio e na TV, sem os recursos do fundo partidário e sem estrutura no legislativo, como gabinete partidário, assessores, etc.

Partidos sem verba. E seu futuro?

Em princípio, deverão ficar de fora a Rede (de Marina Silva), o PC do B (vice na chapa do PT), o PRTB (aliado de Jair Bolsonaro), além de Patriota, PHS, PRP, PMN, PTC, PPL, DC, PMB, PCB, PSTU e PCO. Ainda não é uma lista definitiva, pois há pendências judiciais na contagem dos votos. Vai cair bem o número de partidos de mão estendida no toma lá, dá cá de nossa política.

São Paulo

As campanhas no Brasil mostraram surpresas, com o deslocamento dos competidores nas pesquisas de intenção de voto. Em São Paulo, o governador Márcio França, em terceiro, acabou desbancando Paulo Skaf, do MDB. França vai disputar com João Doria, do PSDB, cujo maior desafio é administrar a alta rejeição - 38% - pelo fato de não ter sido bem recebida pelo eleitor sua renúncia ao cargo de prefeito de São Paulo. França tem condições de aproveitar a maré crescente que o embala. João terá de bater forte no petismo. Para onde irá Alckmin? Mas seu apoio terá eficácia eleitoral?

Em Minas

Outro grande desafio do PSDB é o enfrentamento com Zema em Minas Gerais. Anastasia, até então, liderava com folga as pesquisas de intenção de voto. Até aparecer o fenômeno Zema, que vai de Bolsonaro. Um cultor do capitão. É possível que o 2º maior colégio eleitoral do país dê adeus ao tucanato. Mas o senador Anastasia é muito bem avaliado em sua administração anterior, a par de ser um político de alta expressão.

E o nordeste?

A região nordestina vai continuar sendo colorida pela tinta vermelha do petismo? É bem possível. Mas minha bola de cristal está envolvida por intensa névoa cinzenta, que não oferece condições para fazer prognósticos.