COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas >
  3. Porandubas Políticas >
  4. Porandubas nº 507

Porandubas nº 507

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

Atualizado às 08:32

Abro a coluna com uma mineirice.

Engano de segundo grau

31 de março de 1964. Benedito Valadares se encontra com José Maria Alkmin e Olavo Drummond no aeroporto de Belo Horizonte :

- Alkmin, para onde você vai ?

- Para Brasília.

- Para Brasília, ah, sim, muito bem, para Brasília.

Os três saem andando para o cafezinho, enquanto Benedito cochicha no ouvido de Drummond :

- O Alkmin está dizendo que vai para Brasília para eu pensar que ele vai para o Rio. Mas ele vai mesmo é para Brasília.

A ciência política designa esse tipo de artimanha como engano de segundo grau. Explicando : engano meu interlocutor, dizendo-lhe a verdade para tirar proveito da sua desconfiança. Dizem que a versão original da historinha tem origem judia e expressa com humor o contorcionismo a que leva a ocultação de informações : "Que sacanagem, o senhor quis fazer-me acreditar que vai a Minsk. Acontece que o senhor não vai a Moscou, vai mesmo a Minsk".

Lula e a caçada

Lula fez longo artigo na Folha de São Paulo, ontem. Denunciou a "caçada judicial" montada contra ele pelos procuradores, Polícia Federal e Judiciário. Acusa "ritos burocráticos vazios". Disse que nunca roubou, não foi corrompido nem tentou obstruir a Justiça. Alega que não pretendem condenar o Lula, mas o projeto político que ele representa. E arremata com o mote de que "estão destruindo os fundamentos da democracia no Brasil".

Nada aconteceu de ruim

Pelo artigo de Lula, nada de ruim aconteceu no país nos anos do lulopetismo/dilmismo. Ao contrário. O que existe é uma trama para desmoralizar o PT e os seus líderes. O caradurismo do ex-metalúrgico chega ao ponto de afirmar que o país caminha na direção de um "estado de exceção".

Mentira vira verdade

Ou seja, o PT construiu uma pátria ética, asséptica, racional, com quadros de mérito na administração Federal. Tudo que a Justiça fez e faz é um jogo de perseguição das elites e da imprensa burguesa contra eles, os verdadeiros patriotas. Pano de fundo da engenharia cognitiva : quando a pessoa coloca uma ideia fixa na cabeça e passa anos a fio falando bem dela, acaba acreditando ser ela a pura expressão da verdade. É assim que Luiz Inácio transforma mentiras em axiomas lulistas.

Clima quente

Enquanto Luiz Inácio insiste na ideia de perseguição contra ele e o PT, o clima interno no partido está perto de ebulição. Alas desunidas, rachas à vista. Formou-se o grupo Muda PT, abrigando cinco correntes de esquerda, entre as quais a Mensagem ao Partido. Este Grupo defende um Congresso imediato para debater o futuro do PT e escolher uma nova direção. Bate de frente contra a tendência majoritária CNB - Construindo um Novo Brasil, liderada por Lula.

Acordo PSDB e PMDB

2018 ainda é uma réstia muito difusa no horizonte político. Mas o andar da carruagem política poderá descobrir uma intersecção de interesses entre tucanos e peemedebistas. O PMDB tem dito e repetido que terá candidatura própria nas eleições de 2018. Quer deixar de ser mero coadjuvante, mesmo sendo o principal sustentáculo do poder central. Mas na política não existem regras imutáveis. A flexibilidade é o termômetro que sempre mede a temperatura dos entes partidários. Por essa visão, o candidato do PMDB poderá ser, por exemplo, um tucano. E os tucanos, por uma questão de impasse interno no PSDB, poderão fechar posição em torno de uma candidatura bancada pelo PMDB. Tudo é possível.

Os tucanos

Os tucanos, como se sabe, têm três candidatos : Aécio Neves, o presidente atual da sigla, que detém formidável recall da campanha anterior, quando perdeu por pouco para Dilma ; Geraldo Alckmin, o forte governador de São Paulo, que tem condição de sair bem avaliado no maior conjunto eleitoral do país, e ainda vitaminado pela vitória de João Doria no primeiro turno do pleito paulistano ; e José Serra, eterno candidato, que está ganhando volume de imagem no Ministério das Relações Exteriores. Quais as chances de cada um ?

Chances

As circunstâncias balizarão as decisões. Hoje, o quadro que se apresenta mostra posição mais favorável a Aécio Neves, até pelo fato de que ele manobra muito bem a máquina partidária, tendo maioria expressiva dos comandos. Ocorre que Aécio corre o risco de sair com a imagem suja dos constantes bombardeios a que é submetido pela operação Lava Jato. Nesse caso, Alckmin abriria campo para se viabilizar como candidato. José Serra é quem detém menor influência na engrenagem partidária. Mas a ele não faltariam condições e estímulo para sair como candidato pelo PSD, de Kassab, por exemplo, ou pelo próprio PMDB, partido que o acolheria com satisfação. O desempenho pessoal de cada um funcionará como alavanca de empuxo.

E a Lava Jato, hein ?

Pergunta que teima em aparecer nas rodinhas políticas e jornalísticas : e a Lava Jato durará quanto tempo, que atores novos pegará, quais os impactos que terá na moldura de 2018 etc. ? A resposta não é fácil. Algumas pistas podem ajudar a desvendar dúvidas. A primeira : o novelo do fio está sendo desfiado. Não dá para parar no meio sob pena de gerar dissonâncias sociais e volume crítico acentuado por parte da mídia. As investigações correrão até as proximidades eleitorais.

Uns e outros

Boa parcela de políticos será represada em função de eventual condenação em segunda instância, o que impedirá seus passos na arena eleitoral. Outra parcela poderá ser jogada no cofre das doações oficiais. A comprovação de recursos de campanhas livrará alguns de penalidades. E mesmo no caso de caixa dois, a tendência aponta para o alívio na situação de possíveis receptores. São meras inferências. Passíveis ou não de confirmação.

PEC 241

A PEC 241 ganha apoio e defesa de imensa parcela de economistas, gestores públicos e políticos. A cada dia, a massa de artigos e entrevistas sobre a necessidade de conter os gastos públicos, estabelecendo um teto para eles, ganha densidade. São poucos os que ainda fazem críticas, entre estes os que insistem na tese de que a PEC acabará diminuindo gastos na área social. E esse aspecto, segundo eles, poderá implicar retrocesso. O governo, por sua vez, promete que não faltarão recursos para a saúde e educação, áreas prioritárias. O importante no debate é que a semente da racionalidade na questão dos gastos públicos começa a florescer. E assim o Brasil volta aos trilhos.

No Senado

É possível que a PEC 241 ganhe um número maior que os 366 alcançados na primeira votação da Câmara. Vai depender do quórum. Mas o tom crítico tem diminuído, o que leva a crer em aprovação maciça. No Senado, o presidente Renan Calheiros promete encerrar as duas votações em novembro. E preparar a casa para o grande debate em torno da reforma da Previdência.

Previdência

A reforma da Previdência é vista como a única alternativa para garantir o futuro dos aposentados. O problema é : que aspectos reformar ? Idade da aposentadoria, tempo de contribuição, gatilho para idade de aposentar ante a extensão da vida média do brasileiro, integração da previdência privada e da previdência pública etc. ? Como conciliar tudo isso em um bloco uniforme ?

As Centrais e o barulho

São muitos aspectos que estão sobre a mesa do debate. E o que se deve fazer ? Dialogar, debater, analisar, usar o bom senso. Não adianta chilique de Centrais Sindicais, que ameaçam fazer greve geral. O que as Centrais querem ? Ver o estouro da boiada ? Essas Centrais precisam perceber que os tempos mudaram. As tetas do Estado já não contêm leite para satisfazer suas bocarras.

Fundo partidário

O PT vive seu inferno astral. Mais denúncias jorram : pagou empresas com recursos do Fundo Partidário ; pagou ao marqueteiro João Santana também com esses recursos ; e ainda patrocinou viagens internacionais para seus militantes com dinheiro do Fundo Partidário. Em 2015, recebeu para o Fundo cerca de R$ 116 milhões, o maior volume.

Contas separadas

É possível separar as contas de candidatos a presidente e a vice. Esta hipótese foi aventada pelo ministro Luiz Fux. Portanto, as contas da ex-presidente Dilma Rousseff e as do atual presidente Michel Temer poderão ser analisadas de maneira separada. O argumento de Fux : "Tendo em vista preceito constitucional de que a pena não passa da pessoa do infrator, eu acho que não é irrazoável separar as contas prestadas". O ministro Gilmar, presidente do TSE, também já deu indicações nessa direção. Coisa para 2017.

O acordado sobre o legislado

Atentemos para uma questão que tem agitado o Judiciário : a questão da prevalência da autonomia coletiva (negociação entre patrões e empregados) sobre a legislação. O STF, por meio de alguns de seus ministros, já se pronunciou sobre a força da coisa acordada sobre a coisa legislada. Mas o TST entende que o princípio da autonomia deve ser "relativizado", não podendo ser aplicada a todos os direitos que os trabalhadores negociarem. Ministros questionam a natureza jurídica do "negociado", dizendo que os precedentes do STF sobre a matéria (negociado X legislado) têm sido pontuais, não podendo se estender indiscriminadamente para todos os direitos e tipos de negociação.

TST legisla ?

Dessa forma, o TST parece fechar questão com a tese : a Justiça do Trabalho é quem avaliará o que pode ou não ser negociado. Donde surge a inevitável questão : os ministros do TST podem julgar em contrário ao entendimento da Suprema Corte ? O fato é que o TST, ao que se induz, quer a manutenção de um Estado cada vez mais conflituoso na sociedade. Afinal, quanto mais conflitos, mais poder deterá. A recíproca é verdadeira. Daí a observação de que o TST abusa de uma função que não lhe é inerente : a de legislar.

Campanha negativa

A campanha eleitoral norte-americana está no clímax da propaganda negativa. Hillary Clinton e Donald Trump pouco falam de seus programas para dar ênfase aos ângulos que sujam as imagens de ambos. Pergunta : essa é uma novidade nos EUA ? Não. A revolução francesa de 1789 pode ser considerada o marco da propaganda agressiva nos termos em que hoje se apresenta. Ali, os jacobinos, insuflados por Robespierre, produziram um manual de combate político, recheado de injúrias, calúnias, gracejos e pilhérias que acendiam os instintos mais primitivos das multidões.

Nos EUA

Na atualidade, é a Nação norte-americana que detém a referência maior da propaganda agressiva, mola da campanha negativa. Este formato, cognominado de mudslinging, apresenta efeitos positivos e negativos. No contexto dos dois grandes partidos que se revezam no poder - democrata e republicano -, diferenças entre perfis e programas são mais nítidas e a polarização sustentada por campanhas combativas ajuda a sociedade a salvaguardar os valores que a guiam, como o amor à verdade, a defesa dos direitos individuais e sociais, a liberdade de expressão, entre outros. Nem sempre a estratégia de bater no adversário gera eficácia. Na campanha atual, Trump perde nesse campo.

Cinco questões

Na campanha entre Bill Clinton e Bob Dole, em 1996, cinco questões básicas relacionadas a valores permitiam prever se alguém votaria num ou noutro. Os que deram respostas predominantemente conservadoras votaram em Dole. Aqueles cujas respostas relevaram que estavam menos comprometidos com os valores tradicionais votaram em Clinton. As perguntas eram as seguintes :

"1. Acredita que sexo antes do casamento seja moralmente errado ?

2. A religião é importante na sua vida ?

3. Já se interessou por ver pornografia ?

4. Tem opinião mais desfavorável sobre alguém que engana o cônjuge ?

5. O homossexualismo é imoral ?"

(Dick Morris em Jogos de Poder)