A CAMPANHA COMEÇOU
Lula deu início à campanha. É essa a interpretação que se pode fazer, a partir da decisão presidencial em abrir dois poços d'água na seara da colheita de votos. O primeiro jorrará água nos campos parlamentares. Cerca de R$ 1,1 bilhão será destinado a emendas de parlamentares. Algo como toma-lá-dá-cá. O segundo irrigará projetos fundamentais - e eleitoreiros, claro - na seara da infra-estrutura. Além das verbas já comprometidas nos Ministérios, haverá uma injeção de mais R$ 700 milhões para projetos prioritários. O X da questão : os parlamentares, mesmo beneficiados, só vestirão a camisa de Lula, caso esteja ele muito bem nas pesquisas. Lula começou a campanha com uma primeira reunião para tratar de quê ? De grana.
BASTIDORES DA CAMPANHA
Lula já começa a escolher o grupo assessor principal. Esbarra no busílis : quem comandará a campanha, com o capitão José Dirceu fora do jogo ? É evidente que Dirceu estará jogando, mas em posição secundária. Se ganhar visibilidade na campanha de Lula, poderá gerar efeito bumerangue. Palocci, como ministro, estaria fora do jogo. Luiz Dulci, perfil de professor, seria adequado ? Berzoini é um nome mais do que queimado. O marqueteiro sondado, João Santana, brigou com seu antigo parceiro, Duda Mendonça. Este, por sua vez, poderá integrar a "assessoria da moita", como já está sendo designado o grupo que vai ajudar na campanha, por baixo do pano, com receio de sujar a campanha de Lula com uma participação visível e ativa.
Lula acredita ter como certos os bolsões da pobreza e dos fundões do país que votaram maciçamente em seu nome. Por isso, o esforço maior estará voltado para a reconquista da classe média. Será uma tarefa difícil. E não haverá tempo para que projetos de interesse dessa classe provoquem efeitos eleitoreiros, como, por exemplo, a liberação do FGTS para pagamento de mensalidades escolares. Mesmo se isso acontecer, a classe média não recuará de seu distanciamento. A classe média é cooptada por conceitos, idéias, doutrina, perfil. Não tem muito entusiasmo ante qualquer apelo populista.
A querela dos tucanos também já começou. A declaração do prefeito carioca César Maia, de que apóia o nome de José Serra, foi o som do sino para o início de uma luta de muitos rounds. Maia, ao ver o estrago, já começa a dizer que não disse o que disse. Alckmin, irritado, diz que Serra tem dito que não será candidato. Serra diz que não disse ser candidato, quando todos sabem que vive dizendo isso. Diante de tantos disse-não-disse, vejamos os pontos fracos e fortes de cada um.
José Serra é um político bem mais experiente que Geraldo Alckmin. Veio antes. Foi um grande secretário de planejamento de Franco Montoro. Arrumou as finanças do Estado. Foi um parlamentar de excelente performance. Um dos mais ativos e produtivos parlamentares na Constituinte. Tem boa visão de economia - macro e micro economias. E uma visão adequada do mundo. Ou seja, é um grande técnico, que consegue aliar o conhecimento ao modo de gestão. Como gestor, seus feitos na área do Ministério da Saúde ganharam fama internacional. Sabe formar uma boa equipe. Cerca-se de bons assessores. E gosta de monitorar e cobrar as ações dos auxiliares. Enfim, é mais preparado que Geraldo Alckmin como candidato à presidência da República.
José Serra é uma figura que exprime arrogância. Passa a impressão daquele professor chato, que vive puxando a orelha dos alunos. Como professor "sabe tudo", não admite ser contestado por ninguém. Em termos de comunicação, dá ênfase à linguagem metalingüística, ou seja, às explicações didáticas e objetivas, às explanações que se tornam monótonas, apesar de claras. Essa forma de comunicação é típica de schollars em salas de aula. Serra também exprime frieza, distanciamento emotivo. Parece não se envolver com o interlocutor. Atire-se nele um saco de confetes de elogio ou jogue-se nele uma dúzia de ovos, que ele manterá a postura fria, de pessoa intocável, inatingível. Quanto ao índice de intenção de votos, a impressão é a de que sempre bate num teto histórico, não tendo capacidade de evoluir, crescer, expandir a taxa eleitoral. Seu mais alto índice de intenção de votos, entre os tucanos, explica-se : é ainda o nome mais lembrado, resultado da última campanha.
Geraldo Alckmin revelou-se quando o governador Mário Covas deu-lhe a atribuição de comandar o processo de privatização da malha das rodovias no Estado. Tornou-se um grande gerente. Calmo, equilibrado, discreto, sempre passou a impressão de ser um fiel executor de Covas. Um homem que se podia confiar a toda prova. Com a morte do grande líder, um perfil de grandeza, Alckmin chegou ao centro da política paulista, como governador e comandante de um processo. Tornou-se sinônimo de equilíbrio, harmonia, boa convivência com adversários. A discrição ajudou-a a sair de muitos tiroteios. Conhece bem a realidade socioeconômica de São Paulo, é capaz de discorrer sobre os mais variados assuntos de forma fluente, sem se atrapalhar e ficar nervoso diante de intervenções, queixas e acusações de adversários. O fato de ser menos conhecido do que Serra é um fator favorável, ao contrário do que se pode imaginar. Por isso, seu potencial de crescimento, em uma campanha, é maior do que o de Serra. Numa reta final, polarizada, poderá agregar mais.
ALCKMIN : PONTOS FRACOS
Alckmin não tem a ousadia, que é mais do que a coragem. Ter ousadia é saber aproveitar as deixas, subir montanhas, mesmo quando elas parecem insuperáveis. Sua fala não tem a contundência que o Brasil carece, nesse momento. Dilui-se na maré das expressões mais fortes que se ouvem por todo o território. É um paulista que não conhece muito bem o Brasil. Quando viaja pelos Estados, causa boa impressão, pela gentileza, capacidade de ouvir, pela maneira com que agrada o interlocutor, mesmo que não diga grandes coisas. Tem sido assim seu périplo de poucas viagens pelo país. E isso é o que chega aos nossos ouvidos de analistas e consultores políticos. Não se cerca de grandes assessores. Parece gostar de uma assessoria mais secundária, mais improvisada, menos profissional, mais jovem, menos politizada. Ultimamente, para aparecer, colocou um pouco de veneno nas falas. Mas não se ouve dele uma idéia forte sobre o Brasil. Geraldo Alckmin é um gerente muito bom e deixa transparecer o perfil de bom pai de família. Chega-se, até, a ouvir : Alckmin é o sogro que os jovens brasileiros gostariam de ter.
PTSUNAMI À VISTA ?
Esse envio de R$ 1 milhão, em dinheiro, para a Coteminas, empresa têxtil, pertencente ao vice-presidente da República, poderá ser mais uma grande dor de cabeça para o PT. A Coteminas reconhece ter recebido o dinheiro. O PT não reconhece o envio da quantia, apesar de reconhecer o débito de R$ 11 milhões à empresa. Se Delúbio Soares, irritado, abrisse a boca, o PT e Lula seriam tragados pela primeira ventania do ptsunami. Delúbio, porém, luta para evitar um dilúvio.
Aviso aos navegantes : se a verticalização não cair, a campanha será uma. Se cair, será outra. Por exemplo : se continuar o mesmo sistema da última campanha, pelo qual as alianças nos Estados obedecerão ao esquema de alianças feito no plano federal, o PMDB não terá candidato próprio. Será quase impossível sustentar uma candidatura própria com o engessamento de alianças. Garotinho já pode começar a tirar o seu cavalo da chuva. O PMDB quer derrubar a verticalização. O esforço do presidente do partido, Michel Temer, é hercúleo. Mas os interesses partidários são muito divergentes.
JOBIM DÁ ADEUS AO SONHO
Se Nelson Jobim, presidente do STF, tinha o sonho de vir a ser o candidato de consenso do PMDB à presidência da República, também pode começar a expulsar a idéia do seu sistema cognitivo. Não por conta da manutenção eventual da verticalização. Mas por conta da postura politizada, e muito criticada, à frente da mais alta Corte do país.
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