CENÁRIOS
O cenário político, a partir da Delegacia de Polícia em que se transformou o Congresso Nacional, começa a abrir os seguintes cenários: 1. a imagem de Lula não permanecerá incólume até o final, ficando sujeito às intempéries, propiciando reais condições de vitória a um candidato de oposição; 2. Lula continuará blindado até as margens eleitorais, indo para o segundo turno com um candidato de oposição, mas ganhando com pequena margem; 3. Lula perderá pontos, mas terá forças suficientes para ganhar porque as oposições, no segundo turno, estarão rachadas; 4. Lula não será candidato à reeleição, cedendo lugar ao ministro Palocci. Nesse momento, o cenário 2 parece o mais provável;e o cenário 4, o mais improvável.
PALOCCI CANDIDATO
O ministro Antônio Palocci só seria candidato no cenário de queda de imagem de Lula em proporções alarmantes. Nesse caso, o PT caminharia fatalmente rachado para as eleições, na medida em que a política econômica de Palocci constitui, hoje, o principal divisor de águas entre grupos petistas. A cartilha econômica do ministro não lhe daria a vitória. Seria um candidato praticamente isolado, com o apoio de parcelas do sistema produtivo. Não de todo o sistema produtivo.
PARTIDOS E MALAS
O PT, abalado com o dinheiro encontrado numa sacola e na cueca de um assessor do líder do PT, na Assembléia do Ceará, irmão do ex-presidente petista José Genoino, ao sentir que as ondas críticas estavam ameaçando de maneira irrecuperável sua imagem, vê nas sete malas do deputado João Batista, bispo da Igreja Universal e do PFL de São Paulo, flagrado com R$ 10 milhões, uma tábua de salvação. Há quem aposte que vai expressar o discurso de que, mala por mala, a do PT ainda é a menor. Mais ainda: tentará alargar a rede de implicados. Quanto mais nomes envolvidos com as denúncias, melhor será para o PT. A estratégia é a de construir uma parede de mosaicos iguais. Quem vai notar a diferença entre um tijolo e outro?
PFL ÁGIL
O PFL agiu rápido e afastou de suas hostes o deputado João Batista. É difícil, porém, apagar por completo a mancha na imagem. O deputado era pefelista e essa ligação será repetida incessantemente. O flagrante certamente irá para os programas eleitorais de 2006. César Maia, se for candidato, vai ter de explicar que o dinheiro era da Igreja Universal. Mas a explicação já entra no sistema cognitivo do eleitor como ruído.
DINHEIRAMA EM ALTOS REAIS
O dízimo não paga imposto desde 1889, quando se instalou a República e o Estado separou-se da Igreja. Portanto, sem tributação, o dinheiro dos fiéis, por ocasião dos cultos, acaba sendo jogado em sacos e sacolas, seguindo, depois, para os cofres das Igrejas. Até ai tudo bem. Mas o lugar de depósito deveria ser o cofre dos bancos. Dinheirama em espécie, levada em sacos, precisa ser declarada. E comprovada. Uma pergunta que fica no ar: como se transformou uma montanha de pequenas contribuições - R$ 1, R$ 5, R$ 10 - em notas de R$ 50 e R$ 100? Nas sete malas da Igreja Universal, havia dinheiro pequeno. Mas, e o dinheiro grande? Qual foi a alquimia responsável pela transformação?
UMA QUESTÃO FILOSÓFICA
Quando um fiel tira do bolso o dízimo, oferece sua contribuição amparado na força da fé. Qual a rota do dízimo? Resposta conveniente: pagamento de despesas das igrejas, pagamento de salários dos colaboradores, aquisição de bens materiais e construção de mais igrejas etc. Ou seja, o dízimo é uma espécie de semente de perpetuação da fé dos crentes.Tudo dentro da lógica religiosa. E quando o dízimo é desviado para aquisição de coisas que extrapolam a fé? Quando as pirâmides de dízimos são usadas para aquisição de estruturas comerciais, que passam a negociar, por exemplo, interesses empresariais por intermédio de publicidade? Como podemos cognominar esse fenômeno? Outra questão: ao ingressar nessa transição, o Estado também contribui para o enriquecimento de grupos? Pistas: dinheiro do povo serve para adquirir sistemas de comunicação; as concessões para exploração de sistemas de comunicação são dadas pelo Estado. Logo, o Estado, com a ajuda do povo, e do povo mais humilde, acaba favorecendo grupos de comunicação de identidade religiosa. Que podem tranqüilamente semear searas privadas e burilar os negócios. Algum advogado aceita o desafio de destrinchar tais questões?
MINISTÉRIO SEM MISTÉRIO
O novo Ministério de Lula não apresentou nenhum mistério. Previsível e com feição mais técnica. Os ministros do PMDB entraram na troca de seis por meia dúzia. O partido ganhou três ministérios, e luta por um quarto. Ocorre que essa composição não gerará resultados eficazes. Vejamos: um ministro, Silas Rondeau, técnico, foi indicado pelo senador José Sarney. Não se tratou, portanto, de indicação institucional do partido. Outro ministro, o senador Hélio Costa, foi indicação da bancada do Senado, sob o patrocínio de Renan Calheiros. Institucionalmente, o partido não foi ouvido. O terceiro ministro, Saraiva Felipe, teria sido indicado pela bancada da Câmara? Não. Indicação de Renan Calheiros e José Sarney, que pensaram em desconstruir a banda oposicionista do partido. Lembrando: Saraiva era secretário geral do PMDB e disputava com José Borba a liderança, sob os auspícios da banda oposicionista onde estão o presidente Michel Temer, os 7 governadores e o ex-governador Garotinho, este mesmo um grande entusiasta da candidatura do deputado mineiro. Pois bem: ao aceitar o Ministério, Saraiva Felipe traiu o grupo da oposição. E os deputados da situação não contêm a indignação: "esse cara era da oposição, lutou contra nós, e agora é ministro? " Em resumo: dentro do PMDB, a impressão é a de que a emenda da reforma saiu pior que o soneto.
HELIO DE COSTAS
O ministro Helio Costa começou o seu mister dando as costas às operadoras de telefonia fixa. Pelo tom inicial, disse que iria lutar para acabar com o valor da assinatura. Ataca os valores cobrados pelas empresas. Depois, pareceu recuar, dizendo que não propôs acabar com a assinatura básica. Mas deixou em aberto a questão, quando expressou a condicional.... "não quero dar a impressão de que vamos acabar com essa taxa da noite para o dia". Quer debater o tema. No fundo, o ministro está pretendendo reverter uma situação combinada por ocasião da privatização do setor. A assinatura básica tem sua lógica na base tecnológica e de qualidade, fincada sobre o eixo da universalização de serviços, e seu desmonte representará um rude golpe nas operadoras. Uma medida com esse alcance terá fatalmente impacto sobre os negócios internacionais no Brasil, abrigando, ainda, grandes interrogações sobre os marcos regulatórios.
OUTRO COSTA NA DESPEDIDA
O petista Humberto Costa, ao se despedir do Ministério da Saúde, falou alto: "saio de cabeça erguida e mãos limpas". O sucessor, Saraiva Felipe (PMDB), depois de ouvir o discurso, suspendeu 80 portarias, que poderiam gerar um gasto de R$ 1 bilhão ao ano. Coisa suficiente para atormentar o ex-ministro Costa e produzir outra sugestão de despedida: "saio de cabeça quente e mãos sujas".
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