Lugar de almirante
Sandra Cavalcanti era deputada da Arena, foi ao interventor Faria Lima :
- Almirante, tenho três reivindicações do partido para tratar com o senhor.
- Pois não, deputada.
- A primeira é a transferência de um fiscal do Estado para a capital. Ele está no interior, mas é um funcionário antigo e já merece uma posição melhor.
- Deputada, lugar de fiscal é na fiscalização. Qual é a segunda reivindicação ?
- É um gari doente, governador. Não pode ficar tomando chuva. Queríamos levá-lo para a sede da Comlurb, mas o Marcos Tamoyo não concorda. O senhor podia falar com ele ?
- Deputada, lugar de gari é na rua. Qual é a terceira ?
- Uma professora de Campo Grande. Por problemas de família, precisa vir para a Secretaria.
- Lugar de professora é na escola, deputada. Só isso ?
- Só, governador. Muito obrigada, até logo. E antes que me esqueça : lugar de almirante é no navio.
E foi embora. Quem conta é o amigo Sebastião Nery.
Contenção e alerta
Ainda não dá para fazer grande retrato sobre o governo Dilma. A própria permanece contida. Fez uma fala em cadeia nacional de TV, com abordagens já conhecidas, puxando o fio da confiança. O empresariado está quieto, em estado de alerta, procurando desvendar detalhes, esboços, pensamentos. No geral, os setores produtivos estão na expectativa. Há uma queixa, sim, sobre a expansão dos importados. Abarrotam as nossas prateleiras. Há uma reivindicação maior por parte da produção : desonerar a folha. E isso, anotem todos, isso vai ocorrer. Certo alívio vai ser proporcionado. A questão é o timing.
Mantega sob pressão
O ministro Guido Mantega permaneceu na equipe por sugestão especial do presidente Lula. Uma espécie de fiador da continuidade. Mas ele nunca foi totalmente palatável por Palocci, que age como primeiro-ministro do governo. Mantega é (ou era) considerado um ministro do bolso largo, gastador. Agora, vive sob pressão. Seus ouvidos recebem apelos constantes e intensos : segure a barra, não deixe a inflação disparar. E Dilma decide cortar R$ 50 bilhões do orçamento. Onde serão os cortes ? Nas verbas destinadas a projetos dos deputados. Vai haver chiadeira ? Vai, sim. Mas governo iniciante tem capacidade de prender as lágrimas, conter as pressões. Por enquanto.
Salário mínimo
A prova da tese acima exposta é o próprio salário mínimo. Núcleos da própria base governista gostariam de trabalhar com a proposta de R$ 560. Mas Dilma fechou questão em torno dos R$ 545. E vai ser mesmo o salário. Deve haver um furo entre 130 a 150 votos contrários. Mas o rolo compressor do governo empurrará o salário pela garganta dos descontentes.
Lupi sob cabresto
Quem não está numa posição confortável é o ministro Carlos Lupi, do Trabalho. É evidente que sua posição é a do cara espremido entre a cruz e a caldeirinha. Seu PDT, liderado por Paulinho da Força, aparece defendendo o salário de R$ 560. Lupi chegou a se manifestar nessa direção, mas a presidente o enquadrou. Eis aqui algo interessante e que pode abrir cenários para especulação. Temos um ministro endossado pelas Centrais Sindicais. Essas entidades não mantêm com o governo Dilma a mesma aproximação que tinham com o governo Lula. Dilma as conserva à distância. Lupi é um perfil corporativo. E os perfis corporativos não estão se dando muito bem na atual administração.
Sólido e líquido
Uma grande indagação se incrusta nos horizontes do amanhã : qual e como será o papel das Centrais Sindicais no governo Dilma ? Se continuarem a fazer manifestações nas ruas e nos corredores congressuais, poderão dar ideia de que estão agindo contra o governo. Na gestão anterior, elas conseguiram praticamente tudo o que reivindicavam. Agora, encontram resistências. Como ficará Lupi ? Do lado das Centrais, que endossam sua manutenção no cargo, ou do lado do governo ? Se a opção for por este, deverá continuar sólido, sob a contrariedade das Centrais; se optar por estas, deverá ser "líquido", e nessa condição, teria dificuldades para se manter na posição.
Mineirice, segundo Zé Abelha
Político mineiro é como essas fitas adesivas. Adere, depois começa a melar e finalmente descola. Aí, desprega.
Em matéria de sexo eu não aceito as novidades. Eu sou antiquado. Sexo pra mim é como o jogo de pingue-pongue : só dá pra dois.
Perfis corporativos
Na sequência do desenho acima, podemos desviar os olhos para os partidos políticos. A presidente não tem se curvado às pressões partidárias, deixando de nomear certas pessoas para cargos no governo. O exemplo mais forte é da indicação dos nomes do PMDB - leia-se Eduardo Cunha - para ocuparem diretorias em Furnas. O sentido corporativista está sendo realinhado neste governo Dilma. Não significa que ela fechará portas aos partidos. Continuará a governar com eles. Mas não aceita imposições. Os nomes devem ser ilibados, com carimbo técnico, e reconhecida experiência. Trata-se de um diferencial significativo da atual administração, comparando-se com o conceito de "terra arrasada", que predominava no governo anterior.
Segundo escalão
A presidente age nesse momento para evitar rompimento dos diques governamentais. Cada coisa no seu devido canto e no adequado tempo. As nomeações para o segundo escalão vão ocorrer, claro. Mas de maneira menos atabalhoada e mais focada nas adequações dos perfis aos cargos. Os perfis do PMDB com mais condições de ganharem cargos, logo após a votação do salário mínimo, são os de Geddel Vieira Lima, José Maranhão, Hélio Costa, Rodrigo Rocha Loures, Orlando Pessuti e Iris Rezende. Os outros partidos também encaminharam nomes. A relação está sendo analisada pelos ministros Antônio Palocci (Casa Civil) e Luiz Sérgio (Relações Institucionais).
DEM com chapa única
O DEM deverá ter chapa única na convenção de 15 de março, que definirá o novo comando do partido. José Agripino ou Marco Maciel deverão encabeçar a chapa.
Pelas curvas mineiras
No dia 31 de março de 64, Benedito Valadares encontra José Maria Alkmin e Olavo Drummond no aeroporto de Belo Horizonte :
- Alkmin, para onde você vai ?
- Para Brasília.
- Para Brasília, ah, sim, para Brasília.
Saem os três andando para o cafezinho. Benedito põe a mão no ombro de Olavo :
- O Alkmin está dizendo que vai para Brasília para eu pensar que ele vai para o Rio. Mas ele vai é para Brasília mesmo.
Mineiro diz que vai entrar na curva, mas entra mesmo é na reta.
Kassab vai para onde ?
Gilberto Kassab é um dos mais argutos políticos deste país. Tem tino e alta sensibilidade para captar mudanças de vento e de estação. Quer sair do DEM, mas dá débil sinal de que poderá nele permanecer; quer entrar no PMDB, mas pisca um olho para o PSB; acena com a possibilidade de criar um novo partido para, mais adiante, fazer sua fusão com... PMDB ou o próprio PSB. O PMDB percebeu sua movimentação e começa a dar sinais de inquietação. Espera que ele ingresse no partido em março. Já o PSB, de Eduardo Campos, tem grande interesse em cooptar Kassab. Vejamos as razões.
Mineirices, uai
Mineiro não adere, se acomoda. Depois, se incomoda e dá o troco.
Mineiro prefere não saber a dizer.
Três coisas preocupam : mineiro falando, mineiro escutando e mineiro calado.
A atração do PSB
O PSB é um partido de esquerda. Hoje, dirigido pelo governador Eduardo Campos, sua estrela mais ascendente, o partido tem forte inserção no Nordeste. Precisaria ter uma contrapartida no Sudeste, junto aos maiores colégios eleitorais do país, São Paulo e Minas. Kassab entraria como luva na mão nesse projeto. Poderia se transformar na ponta avançada de uma estratégia para ocupar espaços dominados pelo PSDB e pelo PT. Esses dois partidos começam a dar sinais de saturação. O PSB, engordado com a fusão do PDB, Partido da Democracia Brasileira, seria algo novo, a bola da vez, a sigla que poderia cooptar as classes médias urbanas, núcleos intelectuais insatisfeitos com as velhas siglas, etc. Diz-se que Lula estaria incentivando esse maquiavélico projeto, que é uma alavanca para quebrar a fortaleza tucana em São Paulo.
Voto facultativo
É bem provável que mudanças na área da política abriguem o voto facultativo. Já estamos maduros para aprovar a ideia.
E o PMDB ?
O PMDB poderia ser também o partido a abrigar o PDB de Kassab. O problema é a garantia da vaga para a candidatura ao governo em 2014. Kassab teme que o partido não lhe abra todas as portas. Hoje, o partido está sob o controle do vice-presidente Michel Temer. Que tem boa relação com o prefeito de São Paulo. Michel apenas expressa um aviso : há no partido alguns grupos que devem ser considerados e respeitados, a partir do grupo comandado pelo ministro Wagner Rossi, da Agricultura. Seu filho, Baleia Rossi, preside, hoje, a Comissão Provisória, eis que o Diretório Estadual foi auto-dissolvido. Kassab prefere o PMDB por ser um partido com maior capilaridade. A questão é : a janela que propiciaria sua migração. Trata-se de uma alternativa, mas é muito difícil sua aprovação logo agora em março. Esse é o X da questão. Nesse caso, a criação de um novo partido volta a ser a opção mais forte.
Atraso ?
Sei não. A base para a Copa e as Olimpíadas está cheia de buracos. As equipes olham para os espaços e não sabem por onde começar.
Os Gomes e as viagens
Os Gomes do Ceará, Cid, o governador, e Ciro, o irmão, ex-ministro, ex-deputado e ex-candidato a muita coisa, apreciam viajar pelo mundo afora. Vez ou outra o governador Cid é flagrado em viagens que abrem críticas. Agora, está no exterior, viajando em um Falcon do Grupo Grendene. Grupo que recebe incentivos fiscais do governo do Ceará.
Mais mineirice
A velhice tem duas vantagens : não ir pra guerra e acreditar nos planos do governo.
Mineiro só tem medo de quatro coisas, porque são imprevisíveis : caneta de Juiz, bunda de neném, vaca prenha e urna.
Político mineiro não adere a político grande pra não ficar pequeno.
Fux e o ficha limpa
Esse ministro Luiz Fux deverá fazer bonito no STF. Preparado, culto, esforçado, aberto. Respira ares de modernidade. Trata-se de um ministro que assume compromissos sérios com a meta de administração da Justiça. E já se diz plenamente favorável ao projeto ficha limpa. Com ele a decisão : a lei valerá para as eleições do ano passado ? Hoje, o caso está empatado.
Paes contra Meirelles
Henrique Meirelles, escolhido por Dilma para ser Autoridade Pública Olímpica (APO), responsável pelos programas da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016, começa ser bombardeado. Desta feita, pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, que gostaria de ver pessoa mais ligada a ele no comando daquelas operações. Sua alegação é a de que o Rio terá papel de vanguarda na realização do programa. Orlando Silva, o bom ministro dos Esportes, é outra pessoa inconsolável com a perda dessa operação.
Padilha
O ministro Padilha, da Saúde, faz bom trabalho nesse início. Sem alardes, mas elegendo prioridades.
Conselho aos vereadores
Esta coluna dedica sua última nota a pequenos conselhos a políticos, governantes e líderes nacionais. Na última coluna, o espaço foi destinado às Centrais Sindicais. Hoje, volta sua atenção aos vereadores :
1. A Casa Parlamentar dos Municípios é construída com os tijolos da base do edifício político do país. Deve ser, por excelência, a casa mais aberta às demandas do povo.
2. Por isso, no momento em que o país inaugura um novo ciclo político-administrativo, urge que as Câmaras de vereadores procurem respirar o ar das municipalidades, interpretando os sentimentos e expectativas das comunidades.
3. Em vez de debater questões individuais ou de abrir polêmica sobre apoios e oposições aos prefeitos, as Casas Legislativas deveriam organizar pautas de alta significação social, a partir da infraestrutura física e da rede de serviços sociais.
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