Política & Economia NA REAL n° 81
terça-feira, 8 de dezembro de 2009
Atualizado em 7 de dezembro de 2009 14:31
Vergonha
Toda vez que ocorre uma crise política, ligada à corrupção, de grandes proporções, parte da classe política e até da sociedade mais informada se lamenta da legislação eleitoral e partidária brasileira, cujas falhas serviriam de incentivo a esse tipo de ação. E tome-se a panacéia : a reforma política. É certo que nossas leis são fracas neste ponto - não somente para inibir como também para punir, diante da morosidade do Judiciário. Porém, não é porque a lei é débil que se está autorizado a sentir a carne fraca e pecar. É uma questão de bons costumes. É o caso de se pensar, como Capistrano de Abreu, numa Constituição Federal (pelo menos para os homens públicos) de apenas dois artigos : Artigo 1º - Todo brasileiro deve ter vergonha na cara. - Artigo 2º - Revogam-se as disposições em contrário.
Lula e suas ilusões
Lula, na esteira do caso Arruda, foi um dos primeiros a sacar da cachola uma solução mágica para nossos males da corrupção. Relembrou que mandou duas reformas políticas para o Congresso e que deputados e senadores não quiseram saber dela. E defendeu uma Constituinte exclusiva, derivada da Câmara e do Senado, para mudar a legislação eleitoral e partidária do país. Trata-se de um acúmulo de informações trucadas e equívocos :
1. As propostas enviadas pelo governo eram restritas, não mexem nos reais problemas dessas leis.
2. O governo tem extraordinária maioria no Congresso, para aprovar o que quiser, sem precisar da oposição. Acaba, agora mesmo, de aprovar, em rara velocidade, a PEC do Calote - a dos precatórios. Se não aprovou a reforma política, a reforma partidária ou qualquer outra reforma é porque não quis, não se empenhou, não teve a vontade política que Lula tanto acusava seus antecessores de não terem.
3. A "Constituinte" que Lula quer, dizem bons juristas, é, no fundo, um estupro constitucional. E que pode se prestar a vários serviços, até mesmo mudar questões ligadas à duração de mandatos. E por aí adiante.
Quem tem medo
Para o tamanho do escândalo, foram tímidas, muito tímidas, as reações gerais no mundo político-partidário ao mensalão do DEM. Há pedidos de impeachment, é fato, protocolados por partidos. Mas tudo com muita cautela. Em casa que tem caixa dois, ninguém quer meter a mão na colmeia. Veja-se o voto do novo ministro do STF, José Antonio Toffoli, no caso do mensalão mineiro. Foi contrário ao indiciamento do ex-governador e atual senador tucano Eduardo Azeredo. Um dos argumentos apresentados está na mesma linha de defesa dos "mensaleiros" do PT.
Noites insones
Ainda vai dar muito mais o que falar do que se imagina a Operação Castelo de Areia, da PF, a respeito de patrocínios eleitorais da Construtora Camargo Corrêa. Peixes graúdos terão de dar explicações bem convincentes sobre dinheirinhos em suas contas.
Silêncios de minutos
Com os respingos que recebeu - e ainda receberá - do mensalão candango, o PSDB, bem mineiramente, vai ficar "na moita" nas próximas semanas em matéria de sucessão presidencial. Deu para trás a ideia de definir a candidatura presidencial tucano até meados de janeiro. É preciso deixar esfriar o assunto.
Radar NA REAL
Não há nada de relevante a informar no que tange ao funcionamento dos mercados de capital e financeiro mundo afora. Tudo corre na mais perfeita paz. As várias classes de ativos (renda fixa, ações, commodities, futuros, etc.) estão com variações moderadas, mesmo que os fundamentos ilustrem que a recuperação já atinge inclusive os EUA, muito embora por lá a superação dos sérios problemas da área financeira ainda devam ser superados. De nossa parte ainda acreditamos que os mercados vão "andar de lado" com eventuais "realizações de lucros" mais acentuadas.
4/12/09 |
(1) - Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais)
(2) - Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável
Foi para as mãos de Lula
Os resultados das duas eleições regionais petistas, mais importantes para o partido no contexto da sucessão presidencial, não saíram a contento para os propósitos de Lula de enquadrar o PT. Em MG, fortaleceu-se o grupo da candidatura própria - do ex-prefeito Fernando Pimentel - em detrimento de uma aliança com o PMDB de Hélio Costa. No RJ, com disputa cercada de acusações de fraude - os desdobramentos indicam que a dissidência do prefeito Lindberg Farias vai criar muitas complicações para um acerto sereno com o PMDB do governador Sérgio Cabral. No PA e na BA, a possibilidade de acordos PT/PMDB negociados partidariamente já se esgotou. Dilma não tem cacife para alterar o quadro. Lula vai ter de entrar em campo.
Companheiro
O ministro Celso Amorim, das Relações Exteriores, deslocou-se na semana passada, fora da agenda, da Europa para o Irã. O governo brasileiro farejou que as reações negativas à aproximação com Mahmoud Ahmadinejad, bem maiores do que imaginou a vã filosofia itamaratyana. Hora de recolher os flaps e tentar corrigir o incorrigível. Sabe-se também que há setores da defesa nacional preocupados com esta aproximação.
É bom prestar a atenção
Quem ouviu muito atento à copiosa explanação sobre a política da Petrobras, feita pelo presidente da empresa, José Sérgio Gabrielli no encontro anual da indústria química, saiu de lá com duas certezas (e preocupações) :
1. A Petrobras não tem condições de garantir à indústria química (e certamente a outras também) o abastecimento de gás para fins industriais nem em quantidade nem em boas condições de preço. Ou seja, elas terão de utilizar outros combustíveis, mais poluentes, e entram em campo com menos poder de competição com os concorrentes de outros países.
2. A estatal tem sido forçada pelo ONS (operador do setor elétrico) a fornecer gás (às vezes em regime de urgência) às termoelétricas movidas a este tipo de combustível. Gabrielli disse que às vezes recebe um pedido desses para cumprir num prazo exíguo de duas horas. Sinais de que estão havendo gargalos no sistema elétrico.
Tudo ao consumo
A aposta do governo para 2010 está toda no consumo. Embora diga, por exemplo, que as isenções fiscais para carros, móveis, materiais de construção podem terminar em 2010, não deve ser bem assim. Não é também absolutamente certo que novas isenções nos produtos finais estão fora de cogitação. Em compensação, outras isenções fiscais, tipos para máquinas e equipamentos, estão praticamente com os dias contados.
Mercado eleitoral - classes C, D e E
Quem está determinando as decisões de política econômica não é apenas o mercado financeiro, o mercado cambial ou tais. O determinante é o que se pode chamar de mercado eleitoral, traduzível na seguinte máxima : tudo o que deixar feliz o eleitor/consumidor, especialmente o de baixa renda, tem prioridade. Um dos pilares é a expansão do crédito dito popular. A compra de parcela do Banco Panamericano pela CEF tem esse foco. No terreno das obras e projetos, a prioridade é para o que tem visibilidade e é passível de ser inaugurado durante o processo eleitoral.
Comprar Brasil
A Petrobras criou na semana passada normas para dificultar, em seus negócios, a compra de material estrangeiro. Há dias, o Ministério da Saúde, fez o mesmo em relação à compra de equipamentos. É o projeto "Compra Brasil" : o governo quer usar as compras governamentais - da administração direta e das estatais - para incentivar a produção nacional. Este foi um dos temas mais discutidos na semana passada entre representantes do setor público e empresarial semana passada na Fiesp.
Um alerta de Delfim
Entusiasta do atual governo, portanto insuspeito de "terrorismo", o ex-ministro Delfim Neto terminou assim seu artigo da semana passada no jornal Valor Econômico :
"(...) é mais do que evidente que o conhecimento econômico é fundamental para uma administração pública que deseje estimular o crescimento com alguma justiça social e equilíbrios interno e externo, e que ignorá-lo tem custos sociais imensos. O exemplo mais claro é a obediência às identidades da Contabilidade Nacional que governos mais sanguíneos tentam frequente e inutilmente violar e pagam caro por isso."
Enigmático ? Nada. O ex-deputado paulista se refere, obviamente, às manobras contábeis que o governo está utilizando para tentar mascarar, um pouco, os desarranjos que já começam a aparecer nas contas federais.
As gigantes nacionais
Temos mais uma fusão enorme na praça, a das Casas Bahia com o Grupo Pão de Açúcar. A sequência de operações de fusão, no geral, contam com a "benção" do governo, sobretudo do BNDES. Em tese, espera-se que a formação de empresas maiores fortaleça a capacidade de competir desta empresas. É preciso, contudo, saber exatamente de onde vem esta "fortaleza". A concentração traz muitas economias de escala, sobretudo na órbita dos custos. Todavia, o maior temor é que estas empresas adquiram poder de mercado que lhes permita manipular preços e margens, seja de si próprias, seja de seus fornecedores. Em poucas palavras, a "fortaleza" das empresas parece residir na exploração de mais lucros dos bolsos dos consumidores locais. Interessante notar que as estruturas para fiscalizar tais fusões (CADE, por exemplo) são bem mais frágeis que aquelas que financiam tais projetos (BNDES e outros bancos oficiais). O consumidor parece desprotegido e sujeito às mazelas que virão com a concentração do mercado.
Bancos estão pagando resgate
O Bank of America já repagou ao governo e FED os valores referentes ao apoio recebido no âmbito do TARP - Trouble Assets Relief Plan. Há outros grandes bancos norte-americanos estruturando planos para reembolsar o tesouro e as autoridades monetárias. Certamente um bom sinal : a pressão para ter apoio oficial está declinando. Há um outro lado da moeda : isto permitirá que os executivos possam voltar a ter os seus gordíssimos planos de compensação (bônus).