Política & Economia NA REAL n° 49
terça-feira, 28 de abril de 2009
Atualizado em 27 de abril de 2009 19:43
Terça-feira, 28 de abril de 2009 - nº 49
Judiciário e Legislativo se desgastam, Executivo cresce
O STF e o Congresso estão seus papéis invertidos. É sintoma de uma perigosíssima doença para o regime democrático. O Congresso, que deveria dar mais atenção à "voz rouca" das ruas, está de costas para a opinião pública. As medidas que estão sendo adotadas tanto pela Câmara quanto pelo Senado para conter os desvios "comportamentais" dos parlamentares e até de parte do corpo de funcionários das duas casas, estão muito aquém do necessário para que o Legislativo comece a retomar a confiança dos cidadãos. Estas mudanças parecem feitas para tudo permanecer como está. A faxina e a dedetização tem de ser muito mais profunda. O STF, de quem se exige serenidade, isenção político-ideológica e distanciamento para tomar suas decisões, parece ter sido "mordido" pelo bichinho da "espetacularização" que tomou conta da política e da administração pública em todo o planeta : (i) está nos debates públicos pela conquista da opinião pública quando os ministros, a começar (e principalmente) pelo presidente da Casa, Gilmar Mendes, discutem e opinam sobre quase tudo na mídia, sem reservas ; e, (ii) está na política quando um ministro como Joaquim Barbosa insta o colega a sair "às ruas". São papéis trocados, que desgastam as duas instituições, e que no longo prazo (pelo andar da carruagem, não tão longo assim) pode se transformar numa séria crise institucional. Esse quadro amplia o fosso já existente entre o Executivo de um lado, e Legislativo e Judiciário de outro. Esse desequilíbrio não é saudável numa democracia. Não é á toa que o presidente Lula tem se arvorado a dar conselhos "comportamentais" ora a um, ora a outros dos dois poderes. E não é de graça que há muito o Executivo tem avançado sobre as prerrogativas alheias.
Dilma e a sucessão : especulações precipitadas
Tão logo ficou conhecida a delicada situação de saúde da ministra Dilma Roussef, o mundo político, ainda perplexo e chocado, passou a elucubrar sobre as possíveis repercussões da doença sobre o quadro sucessório, uma vez que ela é a candidata preferida de Lula. E é, em conseqüência, a candidata também da base governista, pois não há no PT, nem entre os aliados, força capaz de contrariar as vontades presidenciais. Muito embora haja gente que não esteja totalmente satisfeita com a opção de Lula, seja porque tenha outros interesses, seja porque não veja na ministra densidade político-eleitoral para a empreitada. Qualquer especulação agora, além de desrespeitosa, é prematura. A candidatura da ministra ainda é uma obra em construção, e o próprio Lula, embora esteja empenhado até o limite do possível na campanha de Dilma, sabe que é real a possibilidade da candidatura não vingar, independentemente de como estiver a saúde da ministra na hora decisiva. O projeto Dilma está quase que inteiramente ligado à permanência do sucesso da política econômica do governo e dos bons ventos que sopraram. É esta a variável que conta, com ou sem Dilma em boas condições. E ela só começará a exibir seus contornos a partir do último trimestre do ano. Se a situação não entrar nos eixos, o projeto Dilma fica ameaçado, pois os aliados e até os petistas vão começar a pressionar para Lula escolher um plano B. Não é por outra razão que Lula tem feito algumas apostas perigosas - e temerárias - em matéria de política anticíclica. Ele quer garantir a qualquer preço um crescimento da economia brasileiro próximo dos 2% este ano, para evitar o "fogo amigo" que começará a atingir sua pupila se ela não subir com mais consistência nas pesquisas eleitorais. E isso, repita-se, depende mais da economia e de Lula do que das condições físicas dela.
O Plano B - 1
O governo está interessado em dar um basta nessas especulações que começaram no momento em que foi revelada a situação de saúde da ministra Dilma, não somente para preservar a principal assessora do presidente, mas também para evitar as brigas na base aliada pelo Plano B. Não é a exploração desse quadro pela oposição que o governo deve temer, até porque se a opinião pública perceber qualquer deslize nesse sentido ela estará acabada. Ele tem de temer mesmo é os aliados, que já andam até alimentando a mídia com nomes de possíveis opções de Lula para substituir Dilma.
O Plano B - 2
O ex-ministro e atual deputado pelo PSB do Ceará, Ciro Gomes, pode dar adeus à suas pretensões de, em caso da opção Dilma falhar, ser ele o candidato do coração de Lula à presidência em 2010. Ou, então, de compor a chapa com a ministra, como vice. A última demonstração de destempero verbal do ex-ministro, semana passada na Câmara, assustou possíveis parceiros. Mostrou que ele não tem equilíbrio suficiente para enfrentar situações adversas, numa campanha que promete ser dura. Além do mais, quem quer ser presidente ou vice não pode sair do eixo com tanta facilidade como Ciro sai.
Mercados melhoraram rápido demais ? I
Como os leitores que prestam atenção no noticiário puderam perceber, houve nas últimas seis semanas uma melhora significativa no desempenho dos principais mercados financeiros e de capitais. O Brasil não foi exceção. Ao contrário, está claro que os títulos de renda fixa e variável do país e de suas empresas são destino preferido dos investidores nestes tempos de crise. Este desempenho satisfatório dos mercados não é surpresa. De fato, ele representa certa estabilização diante da trágica crise que se desenvolve desde o ano passado. Há crescente confiança no combalido sistema financeiro internacional - este aspecto é condição essencial e necessária para que se possa, pouco a pouco, recuperar o crédito entre as instituições financeiras, empresas e indivíduos. A temporada de resultados das empresas com ações cotadas em bolsas também deu alento aos investidores. O que se vê são resultados muito ruins, mas de muitas formas já espelhados no valor das empresas. A contratação da atividade econômica ainda deve provocar mais ajustes no mercado corporativo, mas a magnitude destes ajustes será decrescente daqui para frente.
Mercados melhoraram rápido demais? II
Há um gap entre expectativas e realidade no mercado financeiro. A realidade futura pode ser pior ou melhor que as expectativas. E vice-versa. Portanto, o que é percebido neste momento pelos analistas e investidores pode não se realizar mais na frente. A crise corrente decorre de expectativas exageradas sobre o futuro, um processo especulativo imenso e irresponsável. A nossa percepção é que a partir de agora as coisas tendem a ser melhores que as (piores) expectativas dos investidores. O futuro não é brilhante, mas pode não ser a tragédia que muitos preconizaram. (Lembremo-nos que muitos do que pregavam o paraíso há poucos meses estão a propalar o inferno agora!). De toda a forma, nós acreditamos que é provável que nas próximas semanas os mercados mundiais, incluindo o brasileiro, possam sofrer um ajuste negativo. Não será uma piora estrutural, mas trata-se de um processo natural de realização de lucros numa conjuntura ainda revestida de dúvidas e mazelas. A gripe suína chega neste exato momento de ajuste dos mercados.
A gripe suína vai pegar nos mercados
Até o nome desta peste é feio! A influenza chega para prejudicar as pessoas e os mercados. É fato significativo e um enorme temor para os países. Setores econômicos mais vulneráveis a esta epidemia vão sofrer muito, como, por exemplo, o setor de alimentos, as linhas aéreas e o setor de turismo. A força das medidas adotadas nos EUA e no México parecem indicar um cenário muito ruim. As medidas são duras e o governo de ambos os países devem ter informações de que a epidemia é mais grave do que parece. É certo que diante de uma coisa tão séria os governos tenham de combinar o pragmatismo das medidas para conter a disseminação da epidemia com a arte de evitar o pânico. O mais perigoso deste processo é que ainda não se sabe exatamente o tamanho do problema. Este parece ter avançado mais que as próprias autoridades sanitárias dos países pudessem perceber. Do ponto de vista do funcionamento dos mercados é sempre recomendável manter a cautela, mas os fatos nos obrigam a alertar os nossos leitores que neste momento é mais prudente acreditar que os efeitos sobre os preços dos ativos podem ser mais significativos que as primeiras tendências parecem apontar.
Radar "NA REAL"
Baseados na nossa expectativa de "realização de lucros" nos principais mercados mundiais, bem como no mercado brasileiro, acreditávamos até a semana passada numa queda moderada nos valores dos ativos de renda fixa e variável. A gripe suína deve agravar este processo numa magnitude difícil de ser estimada, mas que não deve ser desprezível. Assim sendo, pioramos as nossas estimativas para o real (em relação às moedas mais fortes) e os mercados acionários externos e locais.
24/4/9 |
(1) - Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais)
(2) - Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável
Protecionismo agrícola
Esta epidemia de gripe suína deve ter um efeito estrutural imediato sobre os mercados. O protecionismo, um dos maiores riscos depois do débâcle nos mercados ao longo de 2008, vai se espalhar juntamente com o vírus da influenza. Não tenhamos dúvidas disto. As empresas do setor vão ter que se redobrar com mais esta epidemia. Justificativa de ouro para que os países mais ricos levantem as muralhas do comércio.
Japão em queda livre
No início do ano acreditava-se que a economia japonesa, cuja higidez do sistema financeira foi recuperada depois de longa crise desde os anos 90, pudesse sofrer menos durante a atual crise que a média dos países mais ricos. Pois bem: do início do ano, quando se acreditava numa queda de 2,5% do PIB, as estimativas pioraram significativamente. A queda do PIB no ano fiscal de abril/09 a abril/10 deve ser de mais de 6,0%, segundo dados do FMI. Assim sendo, o governo japonês está propondo um enorme pacote de estímulo fiscal da ordem de US$ 155 bilhões. Trata-se do quarto pacote a se lançado desde o início do ano. As exportações japonesas podem cair cerca de 30% este ano e as importações 10%. O desemprego deve alcançar o patamar equivalente da maior taxa desde a II Guerra: 5,4%.
Brasil : e o médio prazo ?
Há evidências factuais de que as medidas governamentais para conter os efeitos da crise externa estejam a produzir resultados. A atividade industrial, embora com significativa piora em relação aos números do ano passado, mostra sinais de estabilização. O mesmo pode se falar em relação ao desemprego, apesar da tendência estrutural ser a de queda no nível das contratações. A sólida posição de nossas reservas somada à possibilidade de se gastar mais sem afetar demasiadamente o cenário fiscal do governo no curto prazo são os dois pilares desta recuperação. Há um terceiro aspecto, este endógeno, produzido pela própria crise: a inflação está dominada, especialmente em função do bom desempenho do real perante as principais moedas mundiais. Os investidores internacionais voltaram com força para comprar ativos brasileiros. Este cenário é de curto prazo e adequado para a fase aguda da crise internacional. As questões mais importantes, porém, vão se concentrando no médio prazo, sobretudo se considerarmos a aproximação das eleições do ano que vem. Seria de grande valia para o país e os agentes econômicos que o governo sinalizasse minimamente sobre as políticas a serem adotadas quando a crise for superada. Crescem as preocupações com a estabilidade da relação dívida pública/PIB, bem como com a qualidade das despesas públicas. Este é o "calcanhar de Aquiles" do governo e do país e sobre o qual nem a administração federal e nem mesmo a oposição tem propostas efetivas e realizáveis. Permanecer estático perante o tema é erro sério de condução da política econômica, cujo sucesso no curto prazo pode ser obscurecido pela falta de sinais sobre o futuro mais longínquo.
Protógenes escuta, fala e também come
Noite de domingo na capital paulista. Umas oito e meia. Pizzaria lotada e uma fila de espera longa e paciente. Adentra na pizzaria tradicional o delegado Protógenes acompanhado de pessoas de meia idade, todas muito interessadas nas palavras do delegado. Um fotógrafo absolutamente careca registra cada passo do policial em meio a pisadas nos pés e empurrões nos pacientes clientes. Protógenes está em trajes formais: terno azul marinho com listras azuis reluzentes, camisa branca e gravata bordô. Uma imagem da Santa de Fátima lhe adorna a lapela. O cabelo, já escasso, em perfeito alinhamento. Ao traje conservador se sobrepõe um par de óculos moderninho (na falta de melhor palavra). A fila de espera não anda rápido, mas logo se ouve o grito do organizador : Protógenes, quatro pessoas! Impassível o delegado vai passando por entre aqueles que esperam enquanto uma senhora, aquelas conservadoras paulistanas dos Jardins, sussurra ao pé do ouvido de alguém: só porque é delegado passa na frente ! Protógenes senta à mesa com seus comensais e prossegue a tertúlia. Moderado é o delegado. Come uns poucos pedaços de pizza e fala e fala. Escuta de forma absolutamente interessada (e legal). Parece sereno. Sem medo de perder o emprego. Nada é pantagruélico. Nem dantesco (sem trocadilhos, é claro !). Nem tudo termina em pizza, nós sabemos! A história ainda não foi toda contada, não é Dr. Protógenes? Em tempo : Protógenes quer um mandato eletivo. Por via das dúvidas...
Questão de caixa
Melhor não contar nos próximos meses com nenhuma redução nos preços da gasolina e talvez nem mesmo do óleo diesel. Folga há. O problema é que a Petrobrás está precisando engordar seu caixa para investimentos e o Tesouro Nacional necessitando de recursos para cobrir parte das renúncias fiscais concedidas nos últimos meses e pagar os aumentos dos gastos de Brasília com o custeio da máquina federal e a folha de pagamentos. Uma diminuição nos preços dos combustíveis só será considerada se houver algum risco de um retorno das pressões inflacionárias. O que ninguém está vendo no horizonte - nem o BC. Como ensinou há poucos dias o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, o preço da gasolina é também político. E uma espécie de imposto oculto.
E a concorrência ?
São fortes as pressões (até agora bem sucedidas) das grandes redes abertas de televisão sobre a Anatel e o ministério das Comunicações para que este não autorize a multiprogramação na televisão digital. O sistema brasileiro, adaptado do modelo japonês, permite até quatro emissões (programação) diferentes por canal. Aliás, esta foi uma das vantagens apresentada pelo ministério para justificar a preferência pelos japoneses em detrimento do sistema americano e japonês. Agora, não parece bem assim. E como fica o consumidor nessa história ? Quem tem medo da concorrência. Aliás, a TV Cultura de São Paulo lançou há cerca de dois meses sua multiprogramação, com programas de qualidade, e foi instada pelo ministro Hélio Costa a tirar os canais adicionais do ar, pois não estava "autorizada". Há mais de um mês espera a licença formal e Brasília nem nada com isso. Em tempo : a quantas anda a fábrica de chips prometida pelos japoneses como compensação pela escolha do sistema deles ? Sumiu das conversas oficiais. Como desconfiava muita gente bem informada na época, foi conversa apenas para engabelar o distinto público brasileiro. Ou será que nossas autoridades foram enganadas ? Não venham com a desculpa que a crise, etc, etc...