Política & Economia NA REAL n° 13
terça-feira, 5 de agosto de 2008
Atualizado às 10:01
A rede de intrigas de Brasília em grande estilo
Na ata da última reunião do COPOM os diretores do Banco Central não apenas avisam que vão trabalhar para derrubar "tempestivamente" a inflação (leia-se para 4,5% em 2009) como voltam a alfinetar o Ministério da Fazenda e o restante do governo informando que, dentre as pressões inflacionárias, estão "os efeitos das transferências governamentais neste e nos próximos trimestres".
Para o lado político governista, a "surpresa" ou o "susto" já passaram. Não é preciso fazer mais nada por enquanto. É esperar os efeitos da escalada nos juros promovida pelo BC. O Ministério da Fazenda já se sente fortalecido por voltar a defender as teses de que a inflação brasileira não é de demanda, portanto não exige o encarecimento do dinheiro. Vai recomeçar a pressão sobre o BC para que ele se contenha até o fim do ano, nas próximas três reuniões do Copom, a primeira no início de setembro.
A senha será uma enfiada de críticas à submissão do BC às opiniões do mercado, ou à "tesouraria", via pesquisa Focus. As profecias dos analistas do sistema financeiro se tornariam auto-realizáveis. O tom dessas críticas foi dado num artigo da semana passada do ex-ministro Delfim Neto, hoje consultor econômico privilegiado de Lula.
Em tempo : a pesquisa Focus desta semana elevou a previsão da taxa Selic para dezembro de 14,25% para 14,50%; como ela está em 13% hoje, falta ainda 1,5 ponto percentual para fechar a conta.
É isto que o governo quer evitar. Assim, o foco das queixas transfere-se de Guido Mantega para Henrique Meirelles.
O culpado é o Banco Central
No contexto exposto na nota acima, é proposital e significativo o silêncio do Ministério da Fazenda nos últimos tempos, sobretudo depois que o BC mostrou os dentes e apertou a política monetária com o objetivo de conter a inflação. Ninguém pelos lados da Fazenda quer se expor neste momento em que até Lula posa de autoridade monetária.
Comenta-se na Esplanada dos Ministérios que Guido Mantega teria até mesmo pedido as contas e desejado voltar para sua casa. Fato não confirmado.
Há, contudo, uma aposta política mais perigosa em curso: a política monetária mais apertada pode valorizar ainda mais o Real e desfavorecer a indústria nacional. Assim sendo, o pessoal da Fazenda vai recomendar aos reclamantes de uma conjuntura como esta para dar uma passadinha no Palácio do Planalto e falar para o Presidente que isso é culpa do pessoal de Henrique Meirelles. Na falta de voz própria, a Fazenda vai usar a garganta alheia...
História mal explicada
Como diziam os cronistas de antigamente, causou espécie a demissão do secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, anunciada de surpresa na quinta-feira passada. A explicação oficial de que foi a pedido, não convenceu. Menos ainda vale a insinuação, vazada no Ministério da Fazenda, de teria sido por causa de um velho processo, ainda inconcluso, de favorecimento da construtora OAS. O processo é antigo: porque ele não foi tirado antes?
A realidade é que o ministro Mantega se sentiu fortalecido para livrar-se do último remanescente que subiu ao comando da economia com seu antecessor, Antonio Palocci. Palocci é um fantasma, ainda muito ouvido por Lula, a assombrar o atual titular da Fazenda. Com a reabertura dos trabalhos do STF, Brasília voltou a especular sobre a possível volta do ex-ministro ao governo caso a representação contra ele no Supremo na história do caseiro Francenildo não seja aceita.
Incomodava, ainda, o excesso de autonomia da Receita em questões tributárias. A nova titular não terá a liberdade - nem o poder de veto - que tiveram Rachid e seu antecessor e mentor, Everardo Maciel. É de se prever mudanças na orientação da política de impostos, com um viés um pouco menos técnico. Nem por isso, com menor furor arrecadatório.
A Dilma o que é de Dilma
Os temores que assolaram o Palácio do Planalto nas últimas semanas não se dissiparam apenas o campo da economia e no terreno da inflação. Na política também a brisa voltou a soprar favorável e suavemente. A idéia de preservar a ministra Dilma Roussef, candidata preferencial de Lula à sua sucessão, caiu em desuso, depois que arrefeceram os tiroteios, de amigos principalmente, contra ela por causa do dossiê FHC e dos casos Daniel Dantas-BrOi.
Arquivou-se a intenção de limitar a participação dela na campanha eleitoral apenas no RS. E subiu no telhado a proposta de criar também uma gerência especial para o PAC-Social, nos moldes do trabalho que Dilma exerce no PAC Global. O nome mais provável era o do ministro da Educação, Fernando Haddad, tido como um possível coringa caso a opção Dilma fracasse. Pode até surgir ainda o gerente do PAC-Social, mas sem a força de Dilma. A tranqüilidade é tanta que Lula já se sentiu à vontade para explicitar abertamente sua preferência pela ministra e pedir para tratarem bem "a minha candidata".
Quem trombar com Dilma no governo, no PT ou na base aliada vai sofrer fraturas expostas.
O verdadeiro espírito olímpico
Os jogos olímpicos foram fundados em 776 a.C. pelos gregos. Tratava-se de um festival que envolvia todo o "continente grego" que, diga-se, era formado por várias cidades-estados e descendências, dos dórios aos macedônios. Uma manifestação de diversidade. Embora tivessem um sentimento religioso em louvor a Zeus, tratava-se de um festival de jogos atléticos e musicais protegidos por uma daquelas tréguas sagradas que interrompiam intermitentemente as guerras. Havia um sentimento de unidade e liberdade entre os atletas e a exaltação dos "hábitos gregos" que exalavam a vontade de evitar os "hábitos bárbaros". Os hábitos gregos incluíam a valorização da cidadania, da crença nas maiorias, nos respeitos aos direitos civis e na tolerância mútua às diferenças. As olimpíadas eram a consagração dos mais supremos valores helênicos que fundaram aquilo que denominamos de processo civilizatório em todo o Ocidente. Valores que até hoje são escassos...e o jogo político e ideológico invadiu de vez o mundo olímpico.
Made in China I
Ao nos defrontarmos com a abertura dos jogos olímpicos em Pequim temos a lamentar a existência de um governo autocrático, arcaico no que tange a cultura dos valores mais caros ao ser humano, baseado na censura à informação, promotor do massacre do Tibete e assim por diante. Completa o cenário a inexistência da genuína democracia com uma cultura de massas de pior espécie em meio à poluição extremada da natureza e ao aproveitamento propagandístico dos jogos helênicos que promovem um governo que perpetua os piores valores sociais, políticos e econômicos. Tudo muito distante daquele ano de 776 a.C.
Quando adentrar ao Estádio Olímpico de Pequim a bela bandeira azul e branco dos helênicos, devemos nos lembrar do cenário trágico promovido pelo governo comunista da China que macula a humanidade neste momento. Infelizmente, com a aceitação plena e temerosa de todos os países envolvidos naqueles tristes jogos.
Made in China II
Parte do mundo político e burocrático na Ásia, na África até em "nuestra latino-americana" observa com atenção - e com uma ponta de inveja - o experimento chinês na área política e econômica. A tentativa de criar uma economia de mercado, competitiva, aberta para o planeta e sustentada por um regime autocrático - uma "ditadura socialista de mercado", segundo a definição da professora Merle Goldman, da Universidade de Harvard, é um sonho acalentado não apenas pelos órfãos da velha esquerda como pela velha direita. De uma forma parecida, este também é um objetivo da Rússia de Putin.
Bovespa : para onde vai ?
O Brasil tem sido um celeiro de bons resultados no que tange ao desempenho de seu mercado financeiro e de capital nos últimos seis anos. Os investidores colecionaram resultados brilhantes que enriqueceram aqueles que acreditaram que o cenário extremamente favorável no mercado internacional teria resultados ainda mais brilhantes por estes lados. Neste contexto, a perda de R$ 438,5 bilhões do valor das 398 empresas que negociam suas ações na nova BMF Bovespa é apenas uma pequena perda. Nos últimos seis anos, desde o início do governo Lula, o Índice Bovespa subiu mais de oito vezes em termos de dólares. O valor de mercado das empresas do Bovespa atualmente é de R$ 2,138 trilhões, quase duas vezes o PIB do país.
Considerando-se o cenário externo deteriorado, e a "contaminação" que ele deve proporcionar ao Brasil, é muito improvável que tenhamos um cenário promissor no curto prazo. Referimo-nos aos próximos seis meses pelo menos. O excelente cenário externo dos últimos seis anos trouxe bonança ao mercado brasileiro. Por ora, trará algum sofrimento.
Nos EUA, desemprego em alta
Em julho a taxa de desemprego nos Estados Unidos atingiu a marca de 5,7% (5,5% em junho), o patamar mais alto nos últimos cinco anos. Trata-se do sétimo indicador negativo seguido de desemprego. Desta forma, consolida-se a evidência de que a recessão campeia pelas terras norte-americanas. O consumo está em queda por dois motivos básicos: (i) o desemprego está a contribuir para a redução do consumo, bem como a elevação da inflação que faz declinar a renda disponível e (ii) aqueles que estão empregados estão com medo de perder o emprego e aumentam a taxa de poupança.
Os dois candidatos à presidência do país, Barak Obama e John McCain lançaram na semana passada suas propostas para sanar a recessão. Em ambos os casos, as propostas incluem um papel expansionista para o Estado com o objetivo de aumentar o poder de compra dos trabalhadores e da imensa classe média americana. Tudo muito bonito, mas o déficit fiscal é gigantesco e a atração de capitais externos está em declínio. O buraco é mais embaixo.
Um evento sem importância
A reunião do Federal Reserve, o banco central norte-americano desta terça-feira será um acontecimento de menor importância para o mercado internacional. A taxa de juros básica deve ser mantida em 2% ao ano e o informe da autoridade monetária continuará a fazer alertas sobre a perspectiva de desaceleração da atividade econômica e sobre a alta da inflação. Para o cidadão comum a preocupação relevante é se ele vai ficar empregado e se o preço do galão de gasolina vai cair.
Intervenção Contínua
Com transparência, mas sem muito alarde na semana passada o Federal Reserve, o banco central dos EUA e o Banco Central Europeu (BCE) informaram na semana passada aos transeuntes do mercado financeiro internacional que o socorro aos bancos continuará. Ambos os bancos centrais abriram linhas de crédito há noventa dias para assistir aos combalidos bancos privados que emprestaram recursos para o especulativo mercado imobiliário e se deram mal. Se o pior da crise passou não sabemos, mas muitas instituições financeiras ainda precisam da ajuda da viúva. Às expensas dos contribuintes do Velho Continente e da América.
A solução está no Mercosul
É ilusão acreditar em alguma solução para a Rodada de Doha de liberalização comercial em menos de dois anos. Por mais boa vontade que tenham o presidente Bush e os dirigentes da China e da Índia depois dos apelos do presidente. A eleição nos EUA paralisa tudo. Com esta paralisia, o Brasil, que apostou todas as fichas em Doha, desprezando a possibilidade de acordos bilaterais e regionais, terá necessariamente de apelar para esses esquemas para tentar mais lá fora. Aliás, como admitiu o próprio chanceler Celso Amorim. O caminho do confronto na OMC é árduo, demorado e pouco produtivo.
Inicialmente, deveremos reatar nossos laços no Mercosul, esgarçados por disputas com o Paraguai e o Uruguai e pela posição final do Brasil nas negociações em Genebra, que desagradou os argentinos. Pelas regras do bloco, os países não podem negociar separadamente, apenas em conjunto. Somente após isso será possível pensar em retomar as conversas com a União Européia com os Estados Unidos (4+1). Ao fim e ao cabo, o Brasil já sabe : terá de fazer mais concessões aos parceiros do Cone Sul antes de ir para mesas mais amplas.
China e Índia : embate em Doha
O diretor do Centro para o Desenvolvimento Global (sigla em inglês, GDC), Kimberly Elliot resumiu muito bem o fracasso da Rodada Doha: "O fracasso repetido da rodada evidencia que falta habilidade das partes envolvidas para lidar com problemas complexos tais como, mudanças climáticas, altos custos do petróleo e dos alimentos".
A verdade é que a China e a Índia estão exercendo crescente poder nestas negociações e estão pouco dispostos a ceder no que tange às suas capacidades de impor tarifas e restrições não-alfandegárias à concorrência externa, sobretudo no que se refere aos produtos agrícolas. Além disso, a indústria chinesa e a indiana teriam de fazer ajustes tremendos para readequar as suas plantas industriais aos novos padrões ecológicos das principais economias mundiais.
Neste contexto, o Brasil teria uma série de oportunidades, mas simplesmente não tem uma estratégia consistente para implementar em tais negociações. Fica preso à idéia de liderar o bloco sul-americano e pouco avança nas negociações comerciais bilaterais.
Uma coisa é certa: o protecionismo está em alta. Essa coisa de livre comércio é "conto da carochinha". Na campanha eleitoral americana os candidatos fazem discursos nacionalistas e pouco se importam com o ocorre no mundo. Para eles é mais importante dizer que vão garantir os empregos em Wisconsin, para citar um exemplo, que discutir acordos de livre-comércio neste mundão de Deus...
O retorno do Duce
Quem pensava que o fascismo era coisa do passado pode ler os jornais italianos e verificar que na Itália de Berlusconi a coisa vai mal. O governo de Silvio não pára de acusar os ciganos de serem os responsáveis pela alta criminalidade do país, bem como está a implementar medidas altamente discriminatórias contra a imigração no país.
Uma frase significativa e simbólica do caráter do Governo Berlusconi foi ouvida da boca de Umberto Bossi, ministro do governo responsável pelas políticas antiimigração e membro do partido direitista da Liga Norte: "Não sei o que a esquerda deseja, mas nós estamos prontos! Se eles quiserem conflito temos sempre 300 mil homens na mão". Seria a reedição dos grupos para-militares de Benito Mussolini? Em Roma já se chama o controvertido líder italiano de Duce. Tratava-se do apelido preferido de Mussolini.
E a Europa ? Vai ficar quieta diante da ameaça representada por Berlusconi ?