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Política & Economia NA REAL n° 3

terça-feira, 3 de junho de 2008

Atualizado às 07:48

Inflação lá nos Estados Unidos

Os consumidores norte-americanos estão com a crescente expectativa de que a trajetória do aumento de preços possa se acelerar nos próximos anos, segundo pesquisa realizada pela University of Michigan e pela agência de notícias Reuters. A média de inflação dentre os americanos pesquisados indica que estes esperam um aumento de 3,4% ao ano nos próximos cinco a dez anos. Trata-se da mais alta expectativa desde 1995 e mostra uma forte aceleração vis-à-vis a última pesquisa realizada em março quando a média era de 2,7%. Este indicador é muito importante para as decisões de política monetária do Federal Reserve, o Banco Central dos EUA e é um dos mais desafiadores do ponto de vista dos gestores do dólar de vez que se trata de "expectativas" que, para serem revertidas, exigem ações objetivas de política monetária e forte presença na opinião pública do país.

No curto prazo, a situação é particularmente preocupante, pois os consumidores esperam que a inflação atinja 5,2% nos próximos doze meses, o mais alto nível desde 1982. Há, ademais, o risco de que a dinâmica da inflação tome o rumo dos salários que até agora estão contidos pela menor atividade econômica. Ocorreria, tal qual nos anos 70, um processo de estagflação. O ex-presidente do Fed Alan Greenspan tem se apressado em emitir a sua opinião de que o cenário estagflacionário não é o mais provável, pois a contenção da atividade econômica e o estouro das bolhas especulativas vão contribuir para um ambiente mais saudável a partir de agora. Greenspan é voz muito acatada pelos investidores mundo afora e parece estar defendendo a sua longa gestão no Fed, muitas vezes acusada de ser a responsável pela formação de muitas bolhas especulativas. Resta saber se esta influente voz será ouvida pelo consumidor comum, aquele que vai ao supermercado e ao posto de gasolina e fica cada dia mais pessimista.

Inflação cá no Brasil

Se nos Estados Unidos o cenário de inflação não é muito promissor, no Brasil as inquietações são, sobretudo, de médio prazo (próximos 12 meses). Nem mesmo os maiores críticos da política de juros altos do Banco Central do Brasil desmentem que a inflação está em alta e se espalhando do segmento de preços no atacado para o varejo. A alta dos alimentos e, mais agudamente, a elevação dos preços dos combustíveis estão a alimentar a inflação em quase todos os segmentos pesquisados pelos institutos que calculam a inflação. Nesta semana, a alta do gás consumido nos domicílios está aumentando 18% e é mais um fator a preocupar as autoridades monetárias. Há, sem dúvida, uma divergência de condução do assunto entre os ministérios econômicos localizados na Esplanada dos Ministérios e a diretoria do Banco Central, liderado por Henrique Meirelles. Na Fazenda, acredita-se em um comportamento moderado em relação aos juros básicos e maior contenção fiscal - a Fazenda diz que subiu "informalmente" a meta de superávit primário (saldo fiscal antes do pagamento dos juros da dívida pública) de 3,8% do PIB para 4,3% em 2008 - nos últimos 12 meses encerrados em abril o superávit foi de 4,2% do PIB. Além disso, o ministro Mantega anda bastante entretido com a formação do controvertido Fundo Soberano do Brasil (FSB) que, segundo ele, fará um "papel anticíclico" no que se refere à taxa de câmbio e aos resultados fiscais. Já no Banco Central, a história é outra: os diretores do BC vêem o aumento da taxa de juros como "a" alternativa para conter o consumo e, por conseguinte, a inflação. Isso pode significar uma onda seqüencial de alta na taxa de juros básico: sairia do atual patamar de 11,75% para 14% ao final do ano. Na próxima reunião do COPOM, hoje e amanhã, as expectativas dos agentes do mercado financeiro são de uma elevação entre 0,5% a 0,75% (maior probabilidade de ocorrer) na taxa básica. Todavia, anote aí: não será surpresa se o BC fizer uma alta de 1,00% e "mostrar os dentes" para inflação e, de quebra, para o próprio governo e o mercado.

E o cofrinho ?

Carece de maiores explicações o novo formato do Fundo Soberano do Brasil (FSB) - ou o "cofrinho", como o apelidou, com mais razão ainda seu mentor, o ministro da Fazenda, Guido Mantega. O anúncio de que o governo vai fazer uma economia adicional de 0,5% do PIB - cerca de R$ 13 bilhões - a serem esterilizados no FSB, foi aplaudido, mas gerou ainda muitas dúvidas e desconfianças.

Talvez porque a medida, com a nova formulação, muito diferente daquela que o próprio Mantega apregoava, tenha sido anunciada meio na correria. Tanto que pegou de surpresa até um defensor do um maior aperto fiscal do governo agora, o ministro Paulo Bernardo. A impressão é que o governo correu para mostrar disposição de austeridade antes da reunião do Comitê de Política Monetária. E que a Fazenda quis desfazer a imagem de que somente o Banco Central trabalha para abater a ameaça de um novo surto inflacionário.

Perguntas pertinentes :

1. Por que não tornar oficial o aumento de 0,5% no superávit, aumentando a meta de 3,8% para 4,5%?

2. Por que não usar o dinheiro para abater a dívida pública e reduzir as despesas com juros?

3. Como será a utilização desse dinheiro "esterilizado"?

4. Se há recursos para jogar no "cofrinho", por que insistir na criação da Contribuição Social para a Saúde?

5. Por que não anunciar junto uma poda real nos gastos, especialmente os de custeio da máquina administrativa, indicando as contas que serão cortadas ? Do jeito que está, fica a impressão de que o governo está apenas segurando mais um pedaço do fabuloso excesso de arrecadação que terá este ano, não cortando de fato.

Se não explicar direito esses pontos e outros que estão sendo levantados por alguns especialistas, o governo pode não inverter as expectativas inflacionárias negativas dos agentes econômicos. Nem convencer o Banco Central. Fica a impressão de que o governo não quer jogar mais duro publicamente para não inverter as expectativas eleitorais dos partidos da base aliada.

Sobe e desce

Todo o episódio do FSB, com as idas e vindas do ministro Guido Mantega, serviram para mostrar que o titular da Fazenda não é a única voz influente com o presidente Lula em matéria de economia. Além de dividir o cenário com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, tem as suas sugestões analisadas para Lula também por economistas de fora, petistas ou não. Entre eles o ex-ministro Delfim Netto e o Professor Luiz Gonzaga Beluzzo.

Na outra ponta, Meirelles está cada mais desenvolto. E não necessariamente na sua atividade principal, a de "guardião da moeda". Abriu mais espaços para a política - à luz do sol, pois nos bastidores, discretamente, sempre manteve seus contatos. Tanto para neutralizar os ataques provindos do mundo político e do PT em especial, por causa da taxa de juros, como para manter acesa a chama de suas pretensões futuras.

Está abrindo espaços na agenda para os políticos com mais freqüência e até recebeu oficialmente a bancada do PT, com quem sempre andou às turras - obviamente para explicar questões de economia. Está testando o ambiente para ver até onde pode ir.

Universo das intrigas

Por falar em candidaturas, a intriga de bastidores corre solta contra a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef. E o movimento não tem origem no território da oposição, como pareceria natural ocorrer. É fogo amigo mesmo. Não passa dia sem que algum jornal, alguma coluna, não divulgue uma reportagem ou uma notinha dando conta do surgimento de um bloco anti-Dilma no PT ou informando que o presidente Lula já não estaria tão entusiasmo assim com a candidatura de sua aliada. Ele já estaria para acionar os planos B, C, D... J - e por aí vai. É bom ter cautela nessas análises. Estamos no terreno das especulações e dos balões de ensaio.

Exclusivo

De Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro das Comunicações e ex-presidente do BNDES

"A decisão da Fitch, uma das três grandes agências internacionais de avaliação de riscos, de elevar o rating soberano do Brasil para o grau de investimento consolida um novo estágio para a economia brasileira. As regras que orientam as aplicações de grandes investidores institucionais, nos Estados Unidos e em outros países do primeiro mundo, exigem que o grau de investimento seja referendado por pelo menos duas agências de risco.

A partir de agora podemos esperar um direcionamento expressivo de recursos institucionais, de longo prazo e grande estabilidade, para vários segmentos do mercado brasileiro de capitais. Os benefícios da decisão da Fitch vão ser maiores do que o aparecimento deste fluxo de novos recursos financeiros. Esta decisão representa uma mensagem muito mais ampla para os mercados internacionais na medida em que coloca um selo de qualidade e segurança na economia brasileira como um todo."

Microsoft desafiada

O Brasil e a Índia apelaram junto a International Electrotechnical Commission (IEC) contra a aprovação do Microsoft's Office Open XML como padrão para o formato aberto de documentos eletrônicos. Essa decisão é importantíssima, pois viabiliza que a gigante do software participe de licitações governamentais ao redor do mundo para projetos que exigem "formatos abertos" e livre acesso por parte dos usuários. Dificilmente a decisão do IEC será mudada.

Apenas um encontro simbólico

A reunião de 60 Chefes de Estado nesta semana em Roma, incluindo o presidente Lula, sob o guarda-chuva da United Nations Food and Agriculture Organization (FAO) para tratar da inflação dos alimentos e seus efeitos nos países pobres, bem como as questões e os efeitos colaterais da produção crescente de biocombustíveis, tem tudo para dar em nada. Afinal de contas, os países em desenvolvimento e os EUA encontram razões fortes na alta dos preços de energia para fomentar as plantações de milho (um risco maior para a inflação dos alimentos), soja e cana-de-açúcar (que produzem menores efeitos na alta dos preços dos alimentos). Desejam, assim, aumentar a produção de biocombustíveis.

Já os países europeus, que têm menores possibilidades para a produção de biocombustíveis, desejam que existam políticas que norteiem o setor em todos os rincões da terra. Contudo, a separação mais nítida é aquela entre países ricos que subsidiam fortemente seus setores agrícolas não-competitivos e os países pobres, que são competitivos, mas que perdem os acessos aos mercados de produtos primários dos países ricos. Por tudo isso, até as colunas mais subterrâneas do belíssimo Fórum Romano sabem que na capital italiana sobrará conversa e faltarão decisões. A única coisa certa é que "o combustível dos ricos está competindo com a comida dos pobres", conforme disse o diretor de assuntos externos da Unilever Willem Jan Laan.

O Brasil vai estar nesta no centro do furacão. O discurso do presidente Lula é aguardado com grande expectativa. Ele já deu neste domingo uma mostra de que não vai ficar na defensiva, vai bater duro nos críticos da política brasileira do etanol e também do trabalho na lavoura de cana. Sem contar a questão da Amazônia e do desmatamento. Entre outras coisas, numa entrevista coletiva em Roma, disse que não reconhece autoridade moral para criticar o Brasil em que já acabou com todas as suas florestas. Falou também no emprego de 25 milhões de pessoas na Amazônia.

Sabe-se que esse jogo é pesado e que por detrás de muitos dos ataques ao etanol brasileiro, ao controle do desmatamento e até às questões trabalhistas escondem-se, além de boas intenções, muitas segundas intenções também. Por isso, além do discurso duro, o Brasil precisa apresentar programas, projetos, ações objetivas, para não dar pretextos aos críticos. Discurso e prática aqui precisam combinar urgentemente.

Bolsas em alta

Aqui o Ibovespa subiu 6,96% em maio, quase oito vezes o rendimento médio da renda fixa em reais. Nos EUA, o índice de ações S&P 500 subiu 1,1% no mês e o NASDAQ subiu 4,6%. São as bolsas as que devem melhor indicar as expectativas dos investidores sobre a atual crise econômica mundial provocada pela derrocada do crédito imobiliário nos EUA. Fique atento.

E o petróleo ?

O barril do petróleo subiu 12% no mês de maio. Isso mesmo: 12%. A cada dia todos estão se convencendo que o problema maior no curto prazo no mercado da commodity negra não está relacionado com a produção conforme palavras do argelino Chakib Jelil do cartel da OPEP. É a especulação que tem norteado a trajetória do petróleo. Nesta semana, a gestor de Hedge Fund George Soros e o presidente da Bolsa Mercantil de Chicago Terrence Duffy deporão na Comissão Regulatória de Energia dos EUA sobre o tema. Será muito interessante analisar os argumentos de um especulador e do chefe da bolsa na qual são negociados os maiores volumes de contratos de commodities do mundo. Além disso, as autoridades que regulam os mercados financeiros norte-americanos estão aumentando o grau de fiscalização sobre os investidores nos mercados futuros. A suspeita é que eles estejam fazendo o que todos sabem que fazem: especulando freneticamente.

JP Morgan encerra aquisição do Bear Stearns

O JP está concluindo a aquisição do BS. Comprou por uma bagatela de tostões o BS que quebrou no rol de problemas originados pela crise do setor imobiliário norte-americano. Duas coisas para acompanhar: o destino de 8 mil funcionários do BS que serão demitidos pelo JP e o comportamento das agências de classificação de riscos em relação à análise dos riscos do JP depois da aquisição.

Imposto e impostura

Os operadores políticos do governo vacilaram. E hoje já não podem assegurar que conseguirão aprovar, com a facilidade que esperavam, o substituto do imposto do cheque, agora rebatizado de Contribuição Social para a Saúde (CSS). Nem ao menos sabem se conseguirão aprová-lo para valer este ano ainda. Embora o governo tenha maioria tranqüila na Câmara e no Senado para conseguir, respectivamente, os 257 votos da Câmara e os 41 do Senado para criar o imposto. E não dependa, portanto, da oposição. Aliás, como não dependia na prorrogação da CPMF.

A idéia era apresentar o projeto e levá-lo ao plenário a toque de caixa para evitar as pressões contrárias da sociedade, uma das razões de muitos votos contrários à CPMF no Senado. O plano era votar na Câmara terça-feira passada e nesta terça ou quarta no Senado. Não funcionou - e mais uma vez, repita-se, não foi pela barricada montada pela oposição.

Primeiro porque os oposicionistas não têm número para barrar nada. Depois porque a barricada poderia ser seriamente abalada - os governadores, de um modo geral, querem mais verbas para a saúde. Os secretários estaduais até estiveram em Brasília na semana passada para prestar solidariedade à nova CPMF. O motivo real da vacilação dos "pais adotivos" (o pai de fato é o governo) da CSS no Congresso foi a incerteza quanto ao comportamento da própria bancada governista.

Uma incerteza que não está ligada às dúvidas que porventura os parlamentares tenham sobre a necessidade, a qualidade e mesmo a oportunidade do novo imposto. Não eram essas, com exceções cada vez mais raras, as considerações de parte da bancada governista. O que incomodou os aliados foi a pressa do governo em votar o projeto, sem debates, sem negociações, sem conversas. E esta é a chave - "conversas". O que explica em parte a correria da semana passada. Não dar tempo para articulações que acabam batendo fundo no Orçamento.

Por isso, é possível que a CSS não seja votada nem hoje terça-feira nem esta semana na Câmara. É preciso refazer articulações. Poderão ser feitas até algumas concessões para dourar a pílula, conseguir votos da oposição e neutralizar os "negociantes". De qualquer forma, não passa pela mente oficial abrir mão do imposto, embora dele não necessite.

Coronelismo eletrônico

O site "Contas Abertas", que presta um excelente trabalho à sociedade acompanhando com muita eficiência e competência a execução das contas públicas no país, divulgou há dias uma informação preciosa e que mostra bem como todo o nosso sistema político está preparado para a manutenção do status quo:

271 políticos em atividade são sócios ou diretores de empresas de radiodifusão no Brasil. Os números não incluem aqueles que têm relações informais ou indiretas com esses meios, como por exemplo, por intermédio de parentes ou laranjas.

Dos 27 partidos políticos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 20 estão representados por políticos como proprietários de veículos de radiodifusão.

São 147 prefeitos, 55 deputados estaduais, um governador, 48 deputados federais e 20 senadores com vínculo direto e oficial com os meios de comunicação.

(Os números fazem parte do projeto "Donos da Mídia", um estudo para traçar um panorama completo da mídia no Brasil)

Num país como o nosso, no qual o rádio e a televisão têm um papel fundamental na formação e informação da população, um quadro desses ajuda a cristalizar uma situação que precisa urgentemente de mudança, prejudica a renovação dos quadros político-partidários, o arejamento da vida pública nacional.

Nos Estados Unidos, até porque por lá não existe o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão, esses veículos estão perdendo espaço para a Internet como fontes de informação políticas eleitoral dos cidadãos. Por aqui isso ainda vai demorar muito.