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Waldomiro, um agente da mudança

terça-feira, 30 de março de 2004

Atualizado em 29 de março de 2004 15:53

Francisco Petros*

Waldomiro, um agente da mudança

O escândalo de corrupção do assessor palaciano Waldomiro Diniz trouxe à tona uma discussão muito mais ampla sobre o governo do Presidente Lula do que inicialmente poderia ser imaginado. Como numa crônica de Nelson Rodrigues, extrapolou-se do ordinário para além da realidade aparente.

Em "circunstâncias normais" não é razoável que um fato específico como este pudesse se amplificar a ponto de se tornar o amálgama de uma série de outros fatores que colocam o país numa situação, a meu ver, vulnerável do ponto de vista da estabilidade política, social e econômica.


Ora, a investigação de um caso ou mesmo de uma rede de corrupção é um "caso de polícia" ou de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Para a Polícia Federal o caso já foi. No que se refere a CPI, houve uma grave agressão à Democracia. De qualquer forma, espera-se que a partir das investigações surjam as punições derivadas da Justiça. Todavia, nas últimas semanas, verificou-se que esta crise espalhou-se e colocou em evidência fatores que, uma vez combinados, podem gerar uma deterioração significativa na evolução da economia brasileira. Em primeiro lugar, ficou nítido que as alianças políticas no âmbito do Legislativo e da Federação (especialmente, num ano de eleições municipais) são mais um fator de instabilidade do que de estabilidade. O custo do "enterro" das CPIs no Congresso é alto de vez que abriu a oportunidade para que os partidos aliados ao Partido dos Trabalhadores (PT) pudessem ampliar as suas parcelas de poder na gestão do governo e do Estado. Esta "ampliação" tornou-se um jogo não-cooperativo de vez que adiciona mais paralisia à execução das políticas do governo. Cargos e posições políticas nos mais variados níveis do Estado são "negociados" de maneira pouco conseqüente do ponto de vista operacional. Trata-se "apenas" de cumprir acordos feitos anteriormente nas Casas Legislativas. Tudo para que o governo não fosse investigado. Até mesmo, a votação de uma emenda constitucional permitindo a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado está sendo "negociada". Mudar a Constituição neste item nos parece um exagero. Contudo, faça-se a "pequena política", útil ao momento, mesmo que às custas de uma Carta que deveria valer para gerações e não para legislaturas.


A outra variável que surgiu na atual crise foi a contestação crescente da política econômica. A insatisfação social é crescente, como provam as últimas pesquisas de opinião. Fruto do alto desemprego e da falta de perspectivas de crescimento sustentado. Uma em cada cinco pessoas habilitadas ao trabalho está desempregada na região metropolitana de São Paulo. A taxa de desocupação do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística está ao redor de 12% e desde o final de 2002 está acima de 10%. Trata-se de uma tragédia social, especialmente por alcançar principalmente as pessoas com mais de 40 anos e os jovens que se formam no ensino médio e superior. Além disso, há o subemprego e a informalidade sem que exista uma rede de proteção social capaz de detê-los. O relatório anual do BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento, divulgado neste último fim de semana, chama a atenção para a questão e levanta inclusive a hipótese de que as economias latino-americanas possam passar por mais instabilidades políticas em função da falta de esperança surgida pelo alto desemprego. Além disso, há o risco de que a recuperação econômica do continente seja abortada por esta deterioração das expectativas internas no que se refere às políticas econômicas e sociais e pelo provável início do aperto monetário, a partir do final deste ano, no mercado internacional.


Num quadro como este, a crise "Waldomiro Diniz", detonou críticas à manutenção do atual status da política do Governo e abriu a oportunidade para movimentos paredistas como os dos fiscais agrícolas e da Polícia Federal. Começam a surgir "alternativas" à atual política econômica. Algumas absolutamente consistentes. Outras apenas utilizadas para que se possa "barganhar" apoio político junto a um governo mais frágil.


Aparentemente, não teremos soluções definitivas no curto prazo para a atual crise política. Talvez porque ainda não tenha sido percebido pelos agentes que não se trata de algo episódico. Trata-se de algo mais profundo, da exposição mais explícita de nossas mazelas políticas, sociais e econômicas. Waldomiro Diniz, sem dúvida nenhuma, é um personagem menor. Contudo, um personagem que surge num horizonte carregado de problemas.


É difícil fazer um prognóstico sobre como as coisas evoluirão. O Governo jura que na economia tudo continuará como dantes, combinando o "receituário ortodoxo" que ironicamente "legitima" o Partido dos Trabalhadores perante o "mercado".


Esta certamente não é uma concepção abstrata. Conhecemos os resultados obtidos nos últimos anos por esta "ortodoxia", baseada numa racionalização estranha de uma realidade trágica uma vez que o país não cresceu.


As imensas dificuldades da economia brasileira deixam evidente que será difícil permanecer dentro do padrão da atual política. "A sua manutenção é vista como fator crucial para que não haja retrocesso", diz Presidente Lula. Resta saber o que Sua Excelência dirá quando a sociedade perceber que sob o atual status da política econômica não haverá progresso. Como dizia Keynes, "problemas excepcionais requerem políticas excepcionais". O atual momento do país exige muita ousadia somada a muita responsabilidade.


Waldomiro não imaginava que pudesse fazer tanto...

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* Economista e pós-graduado em Finanças. Foi Vice-Presidente e Presidente (1999-2002) da APIMEC - Associação Brasileira dos Analistas e Profissionais do Mercado de Capitais (São Paulo).







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