Política & Economia NA REAL n° 236
terça-feira, 12 de março de 2013
Atualizado em 11 de março de 2013 09:10
Como o diabo gosta (ou a nova Dilma)
O "ministro sem pasta" do gabinete da presidente Dilma Rousseff, João Santana, está mais ativo do que nunca. O dedo do marqueteiro João Santana pôde ser visto na semana passada em várias ações da chefe. A principal foi o anúncio da eliminação dos impostos federais da cesta básica, agora acrescida de materiais de higiene pessoal. Foram eliminados o PIS/COFINS e o IPI, no que cabia. É meritória a mudança, isto não se discute. Estava ainda em estudos e a perspectiva oficial era de que fosse lançada no dia 1º de maio, nas comemorações do Dia do Trabalho. O discurso de sexta-feira, dia 8, era apenas para saudar o Dia Internacional da Mulher.
Como o diabo gosta (ou a nova Dilma) - II
No meio do caminho (ou do dia ?) surgiu uma pedra : pela manhã o IBGE anunciou outro incômodo índice de inflação, o IPCA de fevereiro, de 0,6%, superior a todas as previsões, de fora e de dentro do governo. A inflação anualizada foi jogada para 6,31%, com as previsões já apontando para o estouro do cume da meta (6,5%) em março. Os assessores de Dilma continuaram falando em "paciência" e "prudência", que era preciso esperar os efeitos das medidas adotadas nos últimos meses e que, no segundo semestre, a situação se inverterá. Dilma, porém, está em tempos eleitorais e, assim, entrou em campo a necessidade de combater a má notícia com um ato positivo. Veio, então, a redução dos impostos e o discurso da noite, visivelmente adaptado na última hora. É um movimento que se verá cada vez mais daqui para frente. A questão política condicionando as ações econômicas.
A força das palavrasSinal ainda desses tempos é o novo linguajar e o novo estilo de Dilma, visível nos dois palanques que ela ocupou na semana passada : no CE, na quarta-feira, e o televisivo, na sexta-feira. A presidente desfrutou, por assim dizer, momentos de Lula, do melhor Lula em comícios. Como, quando, por exemplo, disse que na hora da eleição se pode fazer "o diabo", que "as casas que o governo está entregando são também boas para tomar uma cervejinha", e quando avisou que "quem está no poder é uma mulher e, por isso, agressores em geral devem tomar cuidado". Sai a gerente tecnocrata entra a política de palanque. Quem ganha e perde com essas mudanças ?
Sinonímia"O diabo existe e não existe ?", pergunta Guimarães Rosa no monumental "Grande Sertão : Veredas".
Na obra do escritor mineiro os conselheiros de Dilma para os palanques poderão encontrar uma abundante sinonímia da palavra diabo, para enriquecer novos discursos presidenciais. Alguns deles, pela pesquisadora Nilce Sant'Anna Martins em "O léxico de Guimarães Rosa" : "Anhangão, Aquele, Barzabu, Berzebu, Belzebu, Bute, Capiroto, Ele, o Arrenegado, o Austero, o Azarape, o Bode-preto, o Cabrobó, o Canho, o Cão, o Careca, o Carocho, o Coisa-Má, o Coisa-Ruim, o Coxo, o Cramulhão, o Cujo, o Danador, o Das Trevas, Dê, o Debo, o Demo, o Demônio, o Dia, o Diogo, Dos Fins, o Drão, o Dubá, o Dubá-Dubá, o Ele, o Grão Tinhoso, o Homem, o Indivíduo, o Mafarro, o Mal-encarado, o Maligno, o Morcegão, o Nem-sei-que-diga, o O, o Ocultador, o Outro, o Pé-de-Pato, Pé Preto, o Que-Diga, O-que-não-existe, O-que-não-há, o Rapaz, o Satanão, o Sem-gracejos, o Severo-mor, o Solto, o Sujo, o Temba, o Tendeiro, o Tentador, o Tisnado, o Tristonho, o Tunes, O-que-nunca-se-ri, Xu". Em "Noites do Sertão" GR anotou : "Este mundo é diabrável para consumir gente". A política também.
A economia, na realOs tropeços do crescimento brasileiro são de natureza estrutural. O Brasil não pode ser o país do consumo de vez que é pobre no salário e no crédito, fruto do subdesenvolvimento industrial neste século da tecnologia. Não é o país do investimento, porquanto cresce pouco e com "voos de galinha" e tem no Estado um freio ao empreendedor e um empreendedor que não sabe gerir. Esta é a economia real. Todavia, há a "economia aparente" que é aquela que é marcada pelos "efeitos estatísticos" : o PIB deste ano pode crescer algo em torno de 3,5%, mas este número é tão sofrível quanto a estagnação de 2012. Além disso, a administração da presidente acumula crescentes inconsistências no que se refere à área fiscal, cambial e monetária - esta última sob risco de uma inflação elevada. O país da "economia aparente" é aquele que é enfraquecido perante as amplas possibilidades que tem. Faz-se anão quando poderia ser um gigante.
BC, previsívelConforme comentamos nesta coluna na semana passada, o BC cumpriu o script de fechar, mantendo o juro básico inalterado, o "período da falação". Daqui para frente deverá agir e subir a taxa de juros. A dúvida é a envergadura desta elevação. A nossa aposta é que o juro nominal sobe para algo entre 8,5% e 9% até o final do ano. O que significa que o juro real vai cair, porque a inflação é um fenômeno endógeno (formado pelos agentes) e está dizendo para quem quiser ver que ela está em alta.
A boa ideiaNo momento, a melhor ideia que existe é investir na bolsa dos EUA. O país vive uma crise, mas parece mais apto a superá-la no médio prazo que o Brasil, que não vive uma crise, mas não está apto a crescer consistentemente. Não é desprezível o movimento de saída de investidores daqui na direção do norte.
Alta tensão
Pelo menos na conta da maioria dos partidos, esta semana a presidente Dilma começa finalmente a definir as mudanças no seu ministério para reforçar os elos de sua aliança eleitoral. O primeiro a fazer as contas será Michel Temer. O partido deverá juntar mais um ministério no seu rosário, para MG, mas não deverá ser o dos Transportes. Como tem políticos e partidos demais, Dilma deve sacrificar alguns "técnicos" para atender a todas as ambições. Secretaria de Aviação Civil é um dos que entrarão na cota dos partidos. Especula-se que vá para Wellington Moreira Franco, peemedebista encostado na inexpressiva Secretaria de Assuntos Estratégicos. O Ministério da Ciência e Tecnologia também esteve para entrar no rol. Porém, a reação da comunidade científica à falência política do deputado Gabriel Chalita (PMDB/SP) salvaram este nicho. O PSD de Gilberto Kassab ganha o novo ministério da Pequena e Média Empresa, provavelmente para o vice-governador de SP, Guilherme Afif. Deve ganhar também alguma diretoria de estatal. Aliás, as estatais também serão usadas para saciar os aliados. A CEF, por exemplo, pode ganhar duas novas diretorias. Na Petrobras, Graça Foster faz de tudo para proteger sua fortaleza da sanha partidária. Haja cargo !
Partidos, longe do palanqueNo palanque presidencial, como se sabe, não falta a multidão de apoiadores, senadores, deputados, governadores, etc. e tal. Todos prontos para puxar o aplauso da multidão incauta. No Congresso o jogo é, cada vez mais, medíocre. Os partidos ditos "aliados" afiam as facas e operam a pauta congressual em prol de seus interesses. O governo, em alerta, sempre está negociando. A "reforma ministerial" não passa de um ajuste momentâneo de contas mediante pagamento futuro. O passado está pago. São 39 ministérios, afinal de contas.
Como antes, como sempreO pastor Marco Feliciano (PSC/SP), contra as minorias, na presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Gabriel Chalita, investigado pelo MP, presidente da Comissão de Educação da Câmara. Paulo Maluf e os mensaleiros José Genoino e João Paulo Cunha membros titulares da CCJ. O Congresso continua olhando a sociedade apenas de esguelha.
Estratégia
Por enquanto, o governo e o PT vão concentrar seus maiores esforços em boicotar a candidatura de Eduardo Campos, minando suas forças e pressionando aliados a não embarcarem na canoa do pernambucano e em impedir, o quanto for possível, o nascimento do Rede Sustentabilidade de Marina Silva. Se o partido dela não nascer até o fim de setembro, não poderá disputar as eleições do ano que vem e a ex-ministra do Meio Ambiente terá dificuldades de encontrar uma legenda com algum peso para disputar a presidência. Ela e o Partido Verde já não se bicam. A determinação é evitar, de todo modo, as duas candidaturas, pois ambos tendem a tirar mais votos de Dilma do que de um candidato oposicionista. Com os dois no páreo, como já demonstrou a candidatura de Marina e seus quase 20% dos votos em 2010, um segundo turno é inevitável.
Estratégia - II
Outra providência é tentar incentivar, indiretamente, a dissensões no PSDB, com José Serra. As notícias de que Serra pode vir a ser candidato por outro partido, o PPS, por exemplo, se os tucanos optarem por Aécio Neves, nem sempre partem do grupo serrista ou do partido liderado por Roberto Freire. É cantado também por governistas, discretamente. O Palácio do Planalto, com o "ministro sem pasta" João Santana, prepara uma primeira rodada de pesquisas eleitorais para sentir o ambiente depois que a candidatura de Dilma subiu nos palanques. Em um dos cenários com o nome dos possíveis candidatos, Serra será incluído. A esperança palaciana é que, pelo recall de outras vezes que concorreu, o tucano paulista apareça bem colocado e isto gere confusão no tucanato. Mais confusão do que já está hoje. No fundo, Dilma, o PT e Lula preferem disputar com Serra. O ataque a Aécio vai ser calibrado no ritmo alcançado por sua candidatura. Se começar a crescer e o mineiro aumentar o tom de suas críticas, vai ser também mais combatido. E vai começar por MG, com Dilma dando mais atenção a seu Estado para desfazer a "intriga" de que ela é uma mineira que não liga para Minas.
Só na cadeia
Em tempos mais duros da política brasileira, costumava-se dizer, com cruel ironia, mas com uma dose de verdade, que a esquerda no Brasil só se unia na cadeia. Os partidos de oposição ao governo Federal no país não são propriamente de esquerda e não há ninguém neles ameaçados de perseguição política, portanto, será muito difícil que eles marchem unidos na sucessão presidencial de 2014.
A verdadeira batalha do petróleo
O assunto da divisão dos royalties do petróleo ainda vai render muito, e dar muita dor de cabeça a presidente Dilma. Sua estratégia final de não interferir na votação dos vetos no Congresso na semana passada já deixou fraturas. A batalha judicial pode ser longa. Dependendo dos arroubos de cada um, pode assustar os investidores que se preparavam para disputar os leilões de novas áreas de exploração de petróleo, previstos para maio e novembro. Especialmente o de novembro, focado no pré-sal. Nada do que acontecer nessa seara, no entanto, tem o poder explosivo de um outro "abacaxi" (criado por ele mesmo) que o governo precisará descascar para que os leilões previstos se realizem com algum sucesso : equilibrar a situação financeira da Petrobras.
A verdadeira batalha do petróleo - II
A nova lei de concessões, pelo sistema de partilha, estabelece que a estatal petrolífera brasileira deve participar com pelo menos 30% nos consórcios que ganharem a licitação e deve ser a operadora única do campo. Com que dinheiro, depois dos sacrifícios que lhe foram impostos nos últimos anos para ajudar na política antiinflacionária ? Tão difícil que já especula até que o Palácio do Planalto está apenas esperando um momento político mais adequado para tirar um pouco desse peso das costas das estatais, rebaixando as exigências.
ImprovisoO aumento de 5% no óleo diesel, liberado na semana passada, menos de um mês do último reajuste, mostra, no mínimo como a equipe econômica anda improvisando em suas políticas, conduzidas ao sabor de circunstâncias e conveniências inflacionárias e eleitorais. De remendo em remendo o artesão pode perder a mão.
Radar NA REAL
8/3/13 | TENDÊNCIA | ||
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(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável
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