Política & Economia NA REAL n° 115
terça-feira, 24 de agosto de 2010
Atualizado em 23 de agosto de 2010 16:05
Chaves para o terceiro mandato I
Desde que as pesquisas de opinião passaram a convergir e a apontar a probabilidade até de uma vitória de Dilma no primeiro turno, tanto no centro do poder quanto nos setores da sociedade mais bem informados, mudou-se o eixo da discussão. Não mais se debate o que seria um possível governo de oposição, que mudanças de rumo poderiam ser feitas caso José Serra se elegesse, mas como será um governo Dilma - se uma continuidade perfeita da gestão Lula ou um governo de fato novo, menos pragmático na política e mais intervencionista na política. No entorno da ex-ministra garante-se que ela imprimirá sua própria marca a sua administração, sem renegar os legados de Lula, principalmente na área social. Manterá também os pilares da política econômica, em suas linhas gerais uma construção do mandato de Fernando Henrique. Porém terá linhas próprias, mais desenvolvimentista ainda.
Chaves para o terceiro mandato II
A grande definição da política econômica virá do papel que dois personagens, que já estão com o terno de posse prontos, terão : Antonio Palocci e Luciano Coutinho. Se as opiniões de Palocci prevalecerem, as ideias válidas no primeiro mandato de Lula, estarão de volta. Se der Coutinho, vai valer a fase inaugurada com a entrada de Guido Mantega no ministério da Fazenda. Mas quem acompanha os humores do presidente Lula e suas cada vez mais explícitas manifestações públicas, não tem dúvidas : ele está vendo na sua frente o terceiro mandato que não pode disputar por não ter encontrado respaldo suficiente no mundo político e ter enfrentado resistências na sociedade. A chave desse terceiro mandato estaria no movimento multipartidário que o presidente já avisou que vai liderar com alegado propósito de facilitar a aprovação no Congresso das reformas estruturais que ele não conseguiu realizar. No entanto, há quem veja nisto o nascimento do PL - Partido do Lula - com o qual Lula manteria influência decisiva na política e na administração pública a partir de 2011.
A economia sob Dilma
É um erro pensar a política econômica da provável eleita Dilma como uma reprodução ou continuidade daquela estabelecida pelo presidente Lula. Dilma tem uma visão mais "burocrática" da economia, centrada em critérios "técnicos" e com objetivos determinados. Sua visão política da economia está estruturada na crença de que o Estado é a força-motriz do processo de crescimento. Não há aversão ao setor privado, mas Dilma acredita que as suas limitações e aversão ao risco são consideráveis num país emergente como é o Brasil. Lula prefere-se ocupar da política e estrutura a economia sobre pilares gerais (macroeconômicos) e sabe escolher prioridades a partir de sua sensibilidade política. Dilma está acostumada a lidar com aspectos microeconômicos. Ainda terá de ser provada em temas mais sistêmicos. É difícil que, diante de uma conjuntura tranquila, ela venha a mudar os pilares macroeconômicos. Todavia, é difícil estimar como Dilma avaliará cenários menos favoráveis. Os agentes econômicos permanecem tranquilos com Dilma na crença de que a macroeconomia seguirá sem maiores variações. O tempo dirá. Mas que fique o alerta : Dilma não é pessoa sem ideias próprias.
O cenário externo
Temos insistido nas últimas semanas para a inversão das expectativas nas principais economias mundiais. Agora o questionamento sobre a possibilidade de uma recessão prolongada é aberto e os temores com a redução da atividade econômica na China começam a pipocar, aqui e ali. O Brasil tem uma economia relativamente fechada e os efeitos sobre as expectativas ainda são pequenos. Todavia, não se deve subestimar os riscos externos. Estes são significativos e começam a rodear o mundo emergente, no caso a Índia e a China. O Brasil não será exceção muito embora o bom fundamento no curto prazo seja uma barreira positiva para que a contaminação externa seja minimizada. Dilma eleita terá de lidar com isto, uma tarefa nova para o seu primeiro mandato da vida.
Confissão ?
Lula, Mantega, Dilma e companhia garantem que não há nada de errado na política fiscal do governo, não há nenhum desarranjo como dizem os oposicionistas e muitos economistas. Pois bem, a Folha de S.Paulo de segunda-feira, pelos bem informados repórteres Kennedy Alencar e Valdo Cruz, anunciou que Dilma já está discutindo com Lula e seus assessores um duro ajuste na contas oficiais para ser aplicado no início de seu governo. Coisa que pegaria, até mesmo, os generosos reajustes dos funcionários públicos. Ora, se não há desarranjo, por que o ajuste fiscal ?
Radar NA REAL
20/8/10 |
TENDÊNCIA | ||
SEGMENTO | Cotação | Curto prazo | Médio Prazo |
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Mercado Acionário | |||
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- S&P 500 | 1.071,69 | baixa | baixa |
- NASDAQ | 2.179,76 | baixa | baixa |
(1) Títulos públicos e privados com prazo de vencimento de 1 ano (em reais).
(2) Em relação ao dólar norte-americano
NA - Não aplicável
Não são poucas as notícias que dão conta da falta de ânimo dos partidários de Serra. Dão a eleição como perdida. No círculo mais próximo de Serra comenta-se a personalidade centralizadora do candidato (não é fato novo), sua visão arcaica da comunicação e a sua pouca disposição em relação às mudanças. O mais incrível de tudo isto, é a passividade : diante de uma eleição difícil e do avanço de Dilma nas intenções de voto, por que não ser inventivo do ponto de vista da propaganda ? Por que não ser arrojado na "forma" da apresentação do candidato oposicionista ? A única inovação sensível foi chamar o candidato de Zé. Convenhamos : um político que foi chamado a vida inteira de Serra ser chamado agora de Zé soa ridículo. Além disto, foi perdida a oportunidade da primeira semana da campanha de TV do candidato na qual os eleitores estão mais propensos a ouvir o que os presidenciáveis tem a dizer. É muito provável que tudo continue igual, exceto as pesquisas que devem continuar apontando o favoritismo de Lula.
Agora, é o Congresso
Garantida, na ótica oficial a vitória de Dilma no primeiro turno, as atenções oficiais vão se concentrar um pouco mais nas eleições para alguns governos estaduais - São Paulo, por exemplo - e nas eleições para a Câmara e o Senado. O plano é fazer bancadas fortes na Câmara e no Senado, esmagar a oposição nas duas casas para que Dilma tenha uma vida legislativa sem aborrecimentos.
É quando eles divergem
Nesse ponto, PT e PMDB deixam de ser aliados e passam a ser inimigos. O PMDB sabe que se não fizer as maiores bancadas na Câmara e no Senado terá de ceder o comando de um das duas casas - seria a Câmara, onde ele pode ficar menor que o PT - para o aliado. No Senado o governo ficará mesmo com um novo mandato para José Sarney, um aliado que bem fornido não cria problemas. Perder a Câmara mancha os planos do PMDB de dividir ao meio o poder com Dilma, sustentado no tripé presidência da Câmara - presidência do Senado - vice-presidência da República. O governo conta com um crescimento legislativo expressivo do PSB para tentar contrabalançar o peso do apetite peemedebista.
A divisão do bolo
Alheios aos debates sobre os rumos políticos e ideológicos que terá um provável governo Dilma, os partidos aliados, pragmáticos como eles só, já fazem suas listas de ministérios e outros cargos que pretendem ocupar. E dentro dos partidos já começam a surgir disputas entre companheiros. Está crescendo o recurso ao velhíssimo fogo amigo.
O silêncio dos inocentes
Experientes, os peemedebistas hibernaram. Deixaram os aliados se atritarem. Enquanto isso, na surdina, acertam suas contas e fazem a lista de cobranças. Que, pelo que se sabe, não será pequena. Informações levantadas pelo Estadão dão conta de que querem espaço até na área econômica. Os peemedebistas finalmente perceberam que, mesmo com ministérios com bolso recheado, como Minas e Energia e da Integração Nacional, por exemplo, se não estiverem na boca do caixa, também, podem ter suas ações restringidas por contenções orçamentárias.
A esperança não morre
Celso Amorim, Guido Mantega e Henrique Meirelles alimentam a esperança de permanecerem em Brasília em 2011 com Dilma no Planalto. Os dois primeiros nos mesmos lugares onde estão hoje, Meirelles com um upgrade para um dos ministérios econômicos, segundo se diz um compromisso do atual presidente. Poderia ser também o "homem do PMDB" na seara da economia. A lista dos que querem continuar é imensa. Este é um dos dilemas da candidata petista, caso vença como apontam as pesquisas : se mantém as mesmas caras, dá a impressão de que Lula ainda dá as cartas no governo. Isto pode até ser bom na identificação com a população. Porém, será este o papel que ela própria se reserva - guardando o lugar do titular enquanto ele está impedido de atuar ?
Tédio noturno
O grande Stanislaw Ponte Preta (pseudônimo do jornalista Sérgio Porto) dizia, tal a pobreza estilística da tevê brasileira em meados dos anos 1960, que o melhor da televisão no Brasil era o botão de desligar. Os partidos nacionais, com sua propaganda de boa qualidade técnica, mas nenhuma qualidade política, estão fazendo um grande esforço para tornar o aforismo do sobrinho de Tia Zulmira uma realidade em 2010. Não é de graça que na primeira semana de campanha obrigatória tenha caído em cerca de 10% o número de televisores ligados na hora em que os políticos vão ao ar.
Os avestruzes
Reunidos no litoral paulista, os dirigentes das empresas de telecomunicações no Brasil soltaram uma "Carta de Guarujá" com as reivindicações do setor para os próximos anos. O palavrório de sempre, que certamente vai parar em alguma gaveta dos comitês eleitorais, depois de receber uma manifestação formal dos candidatos, a favorita nas pesquisas à frente. E tudo ficará na mesma. Eles ainda não perceberam - ou não querem - que, se eleita, a ex-ministra Dilma vai aprofundar o avanço governamental neste setor. Se há duas áreas em que Dilma vai ser mais Dilma e o PT ideológico mais PT será na das telecomunicações e da comunicação social.
Só no Brasil mesmo
A Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados considerou inconstitucionais os projetos de autoria do STF e da Procuradoria Geral da República que fixam o valor do subsídio mensal de ministro do STF e do Procurador Geral em R$ 30,6 mil em janeiro de 2011 e atribuem ao presidente do Supremo e ao procurador o direito de fazer a revisão desse valor a partir de 2012 por simples ato administrativo, a revelia do Congresso. Só falta agora o STF e a PGR estabelecerem novos cálculos da inflação e as normas de política monetária no Brasil. Bobagens à parte, invasão de competência de lado, as duas propostas e ensejam, sim, discussões políticas e econômicas mais aprofundadas.