Legitimidade das Câmaras Arbitrais nas ações de desconstituição de decisões arbitrais
terça-feira, 22 de fevereiro de 2022
Atualizado às 07:58
RECURSO ESPECIAL Nº 1.433.940 - MG (2014/0024753-9)
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA DE PROCEDIMENTO ARBITRAL. POLO PASSIVO. ÓRGÃO ARBITRAL INSTITUCIONAL. CÂMARA ARBITRAL. NATUREZA ESSENCIALMENTE ADMINISTRATIVA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA. 1. A instituição arbitral, por ser simples administradora do procedimento arbitral, não possui interesse processual nem legitimidade para integrar o polo passivo da ação que busca a sua anulação. 2. Recurso especial provido. STJ. Rel. Min. Vilas Bôas Cueva, j. 02.10.17.
Em linhas gerais, o posicionamento do STJ a respeito da legitimidade da administradora do procedimento arbitral é irretocável. Da mesma forma, a inclusão dos próprios árbitros no polo passivo de uma ação em que se busca a desconstituição de uma decisão arbitral afigura-se igualmente incorreta.
Nenhuma dessas pessoas possui legitimidade para tanto. O absurdo seria tão grande quanto o de incluir o Poder Judiciário e o juiz que proferiu uma determinada decisão no polo passivo de uma ação rescisória.
A legitimidade decorre de uma regra simples: aquele que for o titular de uma determinada relação de direito material estará, ao menos em tese, habilitado a figurar num processo em que se discute essa relação. Nos termos do disposto no art. 18 do CPC, "ninguém pode pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico". Em outras palavras, apenas os titulares do direito material é que podem figurar como partes no processo em que esses direitos serão discutidos, ressalvadas, obviamente, as hipóteses de substituição processual.
Daí por que, repita-se, esse leading case do STJ que está em tela é irretocável, mas desse entendimento não decorre, obviamente, que em nenhuma hipótese a instituição arbitral pode ser parte num processo.
Se a gestão do procedimento arbitral foi temerária por parte de uma determinada instituição, nada impede que, a título de indenização, essa instituição seja ré numa determinada demanda.
Nesse caso, a relação material discutida não envolve invalidação da decisão arbitral, mas sim a má-fé ou a desídia da instituição arbitral na administração de um determinado litígio arbitral. É o caso, por exemplo, de culpa in eligendo a nomeação de um presidente de painel arbitral que não reúne condições mínimas de conduzir uma determinada arbitragem, quando dessa condução advém algum prejuízo às partes justamente pela ausência de capacidade técnica do presidente do painel. Nesse caso, a instituição arbitral responde pelos prejuízos decorrentes da sua falta de critérios de escolha de presidentes de painel, quando lhes competir essa escolha.
Também se pode pensar na responsabilidade das instituições arbitrais pela guarda e proteção de documentos e informações pessoais (LGPD), pelos atrasos na condução dos procedimentos dentre tantas outras situações.
Em síntese, a legitimidade sempre decorrerá da análise dos pedidos formulados em juízo e estes, por certo, sempre estarão conectados a uma determinada relação de direito material que se pretende discutir em juízo.