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Questões criminais no ramo da construção e incorporação de imóveis

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

Atualizado em 26 de fevereiro de 2025 11:57

A indústria da construção civil e da incorporação imobiliária exerce um papel estratégico no desenvolvimento econômico e social, gerando empregos, promovendo infraestrutura e impulsionando o crescimento urbano. Contudo, esse setor, devido à sua complexidade e à magnitude de seus projetos, também é vulnerável e sujeito a se deparar com a prática de crimes no seu cotidiano, o que pode comprometer a segurança e a imagem dos empreendimentos, como também gerar altos prejuízos aos financiadores de projetos imobiliários.

Nesse contexto, surgem questões relacionadas tanto aos crimes passíveis de cometimento por representantes de construtoras e incorporadoras, quanto aos crimes dos quais essas empresas podem ser vítimas.

Representantes das construtoras e incorporadoras imobiliárias

No curso da execução de projetos de construção e de incorporação imobiliária não é incomum depararmos com a atuação da polícia judiciária em atos investigativos e abertura de procedimentos apuratórios de crimes. Por vezes, obras são fiscalizadas por agentes policiais que identificam irregularidades as quais consideram estar diante de atos criminosos.

Nesse sentido, a polícia responsável por investigar crimes contra o meio ambiente é a mais presente em canteiros de obras de empreendimentos imobiliários. As incursões policiais geralmente fiscalizam situações relacionadas a crimes de desmatamento ilegal, descarte irregular de resíduos, poluição, entre outros delitos.

A presença da polícia judiciária em obras demanda atenção redobrada dos empreendedores e responsáveis técnicos, que devem garantir o cumprimento das normas ambientais e urbanísticas desde as fases iniciais do projeto. Isso inclui a obtenção de licenças e autorizações adequadas, a correta destinação de resíduos sólidos, a preservação de áreas protegidas e o atendimento às exigências de compensação ambiental, quando aplicáveis.

O não atendimento das regras legais relativas ao meio ambiente pode caracterizar a prática de ilícitos na esfera administrativa - passíveis de multas e embargo-, mas, em determinadas situações, também pode configurar ilícitos penais previstos na lei 9.605/98. A apuração minuciosa desses crimes por agentes policiais desagua na  responsabilização penal de pessoas diretamente ligadas às obras, assim como das construtoras e incorporadoras, na figura da pessoa jurídica, uma vez que nos casos de detecção de crimes ambientais a pessoa jurídica também é penalmente punida.

Outra situação bastante corriqueira no ambiente de obras, na qual são vistos alguns desdobramentos criminais, é a ocorrência de acidentes de trabalho. Nesses eventos, seja por desatenção dos trabalhadores, ausência de equipamentos de segurança ou por outras tantas circunstâncias, o resultado pode culminar em casos de lesão corporal ou morte de trabalhadores.

Por vezes, investigadores e peritos são acionados a comparecer aos canteiros de obra para apurar eventos dessa natureza e identificar os respectivos responsáveis. Promovida a investigação policial, os personagens ligados ao pelo fato são acusados de crimes previstos no Código Penal (geralmente culposos - sem intenção) e eventualmente punidos criminalmente, ao final de um processo penal.

Com menos recorrência, outras modalidades de crimes são observadas no mundo da construção civil. Representantes de construtoras e incorporadoras podem ser investigados por crimes contra a ordem econômica e as relações de consumo, quando se valem de práticas abusivas que afetam diretamente os adquirentes dos imóveis, como a publicidade enganosa, a omissão de informações essenciais sobre o empreendimento e a entrega de unidades em desacordo com o contrato ou memorial descritivo. Por exemplo, o Código de Defesa do Consumidor prevê penalidades para práticas que podem induzir o consumidor a erro.

Além disso, crimes contra a ordem tributária e a sonegação fiscal também são objeto de apuração em empreendimentos imobiliários. A omissão de receitas, a emissão de notas fiscais fraudulentas e a criação de empresas de fachada para evitar o recolhimento de tributos são condutas que podem configurar infrações previstas na lei 8.137/90 e no Código Penal.

Ademais, os delitos de falsidade ideológica e documental também são vistos no setor da construção civil e da incorporação imobiliária. Esses crimes ocorrem, por exemplo, quando há a inserção de informações falsas ou omissão de dados relevantes em documentos públicos ou particulares, como alvarás de construção, licenças ambientais e escrituras de imóveis. A falsidade documental pode ensejar punição criminal, conforme disposto nos artigos 297 e 299 do Código Penal.

Mas as empreses do ramo da construção civil também estão sujeitas a ser vítima de criminosos e de seus atos, que por vezes geram enormes prejuízos e transtornos.

Construtoras e incorporadoras podem ser vítimas

Quando se pensa nos crimes que afetam construtoras e incorporadoras, os primeiros que vêm à mente são o furto e o roubo de ferramentas, materiais, equipamentos e outros objetos utilizados nas obras. O grande fluxo de pessoas nos canteiros facilita o acesso a esses bens, e casos de desvios são frequentemente noticiados.

Medidas como vigilância eficiente, organização dos ambientes, gestão de estoque e controle de acessos ajudam a prevenir esses incidentes. Embora questões de segurança pública não sejam de responsabilidade direta das construtoras, ações internas de prevenção podem minimizar perdas. Além disso, a identificação e punição dos envolvidos são fundamentais para coibir novas ocorrências.

No entanto, as situações que mais preocupam atualmente o setor da construção civil são os golpes e fraudes. Há inúmeros relatos de esquemas fraudulentos que geram prejuízos consideráveis às empresas do ramo.

Entre os episódios mais comuns, destacam-se a falsificação de boletos bancários, a criação de empresas fictícias, o cadastramento indevido de fornecedores em sistemas de pagamento, a invasão de computadores, o desvio de dados e informações sensíveis e a simulação de operações financeiras. Essas práticas causam danos financeiros expressivos e comprometem a atividade das construtoras.

Muitas dessas fraudes contam com a participação de funcionários e agentes internos, que se aproveitam do acesso a informações privilegiadas para facilitar a execução dos golpes. Em grande parte dos casos, os crimes só são descobertos quando os prejuízos já atingiram proporções significativas.

A realização de auditorias internas é essencial para identificar fraudes, responsabilizar os envolvidos e, eventualmente, recuperar os valores desviados. A investigação externa, através da polícia também tem papel importante, especialmente quando são necessárias medidas legais mais rigorosas, como a quebra de sigilo bancário e a expedição de mandados de busca e apreensão.

Uma apuração bem conduzida não apenas permite a responsabilização dos infratores, mas também contribui para o aperfeiçoamento dos procedimentos internos e a recuperação de recursos.

Para mitigar riscos e evitar prejuízos, a melhor estratégia é a implementação de medidas rígidas de controle, o investimento em tecnologias que promovam transparência e eficiência nos processos e a adoção de um programa de compliance rigoroso, garantindo o cumprimento da legislação e a integridade das operações. Além disso, contar com assessoria jurídica especializada e adotar boas práticas de governança são fundamentais para a segurança e regularidade dos empreendimentos imobiliários.