Shopping centers - é devido o aluguel sobre vendas de produtos iniciadas em plataformas digitais?
quinta-feira, 2 de abril de 2020
Atualizado às 10:52
Texto de autoria de Roberto Wilson Renault Pinto
1. Introdução
Com o progresso tecnológico, as plataformas digitais tornaram-se instrumentos estratégicos na divulgação e nas vendas de produtos em geral, incluindo, pois, os lojistas de shopping centers, que, cada vez mais, se dedicam a essa prática empresarial.
Em contrapartida, o consumidor de produtos ofertados online deixou de ser, ao menos em parte, a pessoa que vai ao shopping center, fato este que afeta a relação contratual empreendedor/lojista, no que concerne ao pagamento do aluguel, mínimo e/ou percentual.
Esse trabalho destina-se a uma análise inicial sobre essa forma relativamente recente da realidade do mercado, no que tange à incidência do aluguel devido pelo lojista sobre os negócios jurídicos iniciados por plataformas digitais, previstos, ou não, nos contratos de cessão de uso de espaço entre este e o empreendedor de shopping center, que, ademais, podem ser afetados em razão de contrato entre lojista/ franqueado e franqueador, nos casos em que o franqueado recebe produtos do franqueador, a título de depósito, com a finalidade de entregá-los aos clientes do franqueador que adquirem os produtos deste pelas redes sociais, nas dependências do shopping center.
2. Relações jurídicas entre lojistas e empreendedor do shopping center e daqueles com os clientes
Neste contexto, podem-se vislumbrar, primeiramente, três tipos de relação jurídica na questão apresentada: uma entre empreendedor e lojistas; outra entre estes e seus clientes e uma terceira entre o lojista franqueado e o franqueador.
Na primeira e na terceira, a relação é empresarial, por força do art. 421-A do Código Civil1 (CC) e do inciso VIII do art. 3º da Lei nº 13.874, de 20.9.20192 (Lei da Liberdade Econômica), que consolidaram o entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre a interpretação das normas contratuais na relação jurídica em apreço, como paritárias.
De fato, empreendedor, lojista e franqueador são empresários, cujos direitos e deveres se presumem equilibrados, sem que nenhuma das partes possa ser intitulada de vulnerável, devendo prevalecer a comutatividade nas relações contratuais, a menos que se apresente algum desequilíbrio nessas relações, a ser tutelado pelos princípios gerais de Direito.
Essas exceções decorrem das limitações à liberdade de contratar, quando cláusulas contratuais colidem, especialmente, com os princípios da função social do contrato3 e da boa-fé objetiva4.
Por outro lado, nas relações entre lojista e/ou franqueador e cliente se aplica a legislação consumerista, conforme artigos 2º e 3º do Código de Proteção ao Consumidor (lei 8.078/90 - CDC)5, também chancelada pela doutrina e jurisprudência, que, no artigo 306 da lei consumerista, alcança a obrigação de o fornecedor realizar a venda de produtos online7 nas condições oferecidas, tal como nas vendas em geral de Direito Privado (art. 427 do CC8).
No presente trabalho, destaca-se a relação entre empreendedor e lojistas de shopping centers, vis à vis da questão apresentada, em que se busca alcançar a correta interpretação da incidência, ou não, do aluguel sobre a compra e venda iniciada através de plataformas digitais, isto é, fora do ambiente do shopping center, estendendo-se à relação entre lojista/franqueado e franqueador, em que se aproveita da estrutura organizacional e do espaço físico do centro comercial, para depósito e entrega aos clientes do franqueador, por intermédio do lojista, de produtos adquiridos através das redes sociais.
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Clique aqui e confira a íntegra da coluna.
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1 "Art. 421-A Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais [...]".
2 "Art. 3º. São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e crescimento econômicos do País, [...]: VIII ter a garantia de que os negócios jurídicos empresariais paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária, exceto as normas de ordem pública".
3 "Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato".
4 "Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé".
5 "Art. 2º. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".
"Art. 3º. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entres despersonalizados que desenvolvem atividade de [...] comercialização de produtos ou prestação de serviços".
6 "Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado".
7 LÔBO, Paulo. DIREITO CIVIL - CONTRATOS. São Paulo: Saraiva. 4ª ed. 2015. p 76.
8 "Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso".