COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas >
  3. Migalhas de Direito Privado Estrangeiro >
  4. A escape clause (a aplicação da lei com mais conexão com o caso concreto) e a flexibilização do lex rei sitae e de outros elementos de conexão

A escape clause (a aplicação da lei com mais conexão com o caso concreto) e a flexibilização do lex rei sitae e de outros elementos de conexão

terça-feira, 19 de março de 2024

Atualizado às 07:48

1. Introdução

Quando há conflito entre leis de diferentes países para regular situações privadas transnacionais, a solução geralmente é encontrada nos tradicionais elementos de conexão. Um deles é o lex rei sitae, segundo o qual se deve aplicar a lei do lugar do bem para disciplinar questões relativas à titularidade dele, como os direitos reais (estatuto real).

Se, por exemplo, compro um imóvel em Paris (França), o meu direito de propriedade sobre esse bem será disciplinado pela lei francesa, pois é a lei do lugar do bem. Não será a lei brasileira, ainda que eu tenha nacionalidade brasileira. Isso, porque vigora o lex rei sitae como elemento de conexão na maior parte dos ordenamentos jurídicos.

Uma figura interessantíssima que vem sendo admitida em alguns ordenamentos para flexibilizar esses elementos de conexão à vista das particularidades do caso concreto é a chamada escape clause.

Antecipamos que, apesar da falta de previsão expressa na legislação brasileira, entendemos como aplicável a escape clause. Deixaremos, porém, para outra oportunidade os fundamentos.

2. Escape clause

Convém aprofundar a cláusula de exceção, também chamada de cláusula de salvaguarda, de cláusula de escape ou, em inglês, de the escape clause ou exception clause.

Embora a doutrina portuguesa costume valer-se da expressão "cláusula de exceção", preferimos "cláusula de escape" como mais adequada tradução para evitar confusão com o uso que a doutrina brasileira faz do verbete "exceção" para diversas outras situações1. Nomenclaturas devem ser selecionadas de modo a evitar confusões prima facie do pesquisador.

Ela foi introduzida pelo Direito Alemão em 19992, especificamente no art. 46 da Lei de Introdução ao Código Civil Alemão (Einführungsgesetz zum Bürgerlichen Gesetzbuche - EGBGB). Como o referido dispositivo do EGBGB remete-se aos arts. 43 e 45, transcrevem-se todos eles3:

Art. 43.

Direitos in rem

(1) Os direitos reais são regidos pela lei do Estado em que a coisa estiver situada.

(2) Se a coisa à qual se vinculam os direitos reais chegar a outro Estado, esses direitos não podem ser exercidos em contradição com a ordem jurídica desse Estado.

(3) Se um direito real em um item que ingressa no País sem ter sido adquirido previamente, os fatos ocorridos no Estado de origem quanto à aquisição do item consideram-se feitas neste País.

Art. 45.

Meios de transporte

(1) Direitos reais sobre veículos de transporte aéreo, aquático e ferroviário são regidos pela lei do Estado de origem. Isto é:

                1. quanto às aeronaves, o Estado de sua nacionalidade;

                2. quanto às embarcações, o Estado onde estão registradas ou, se inexistir registro, o Estado do porto de origem ou do local de origem.

                3. quanto aos veículos ferroviários, o Estado de seu registro.

(2) A constituição de garantias reais sobre esses veículos sujeita-se à lei aplicável ao crédito garantido. A classificação entre as várias garantias reais segue o art. 43(1).

Art. 46.

Conexão substancialmente próxima

Se houver uma conexão substancialmente mais estreita com a lei de um Estado diferente daquele em que se aplicaria à luz dos arts. 43 e 45, então essa lei será aplicável.

A cláusula de exceção foi introduzida na Alemanha com o objetivo de socorrer as situações em que a lex situs se revelasse insuficiente diante de certas figuras jurídico-reais e com o intento de prevenir problemas gerados pela circulação de bens móveis4. Esse dispositivo permite afastar a lex situs em favor da lei de outro Estado com a qual as particularidades do caso concreto guardem maior conexão.

A introdução da cláusula de exceção pelos alemães não se ateve ao estatuto real. Alcançou também matérias de obrigações e de responsabilidade civil, conforme art. 41 do EGBGB. Veja o seu teor5:

Art. 41.

Conexão substancialmente próxima

(1) Se houver uma conexão substancialmente mais estreita com a lei de um Estado diferente da aplicável nos termos dos arts. 38 a 40(2), aplicar-se-á a lei desse outro Estado.

(2) Uma conexão substancialmente mais próxima pode ser baseada:

                1. em uma relação jurídica ou de fato entre pessoas envolvidas na obrigação;

                2. nos casos do art. 38, parágrafos 3 e 3, e do art. 39, sobre o fato de as pessoas envolvidas terem sua residência habitual no mesmo Estado no momento dos fatos relevantes. O art. 40, parágrafo 2º, 2ª parte, aplica-se mutatis mutandi.

O supracitado art. 41 do EGBGB prevê a cláusula de escape para flexibilizar os elementos de conexão adotados como regra geral para o enriquecimento sem causa (art. 38, EGBGB), gestão de negócios (art. 39, EGBGB) e responsabilidade civil (art. 40, EGBGB).

O art. 46 do EGBGB pode ser complementado pelo art. 41 do EGBGB, pois ambos versam sobre a cláusula de escape, embora para domínios diferentes (o art. 46 para o estatuto real, e o art. 41 para os estatutos obrigacional e de responsabilidade civil). Por exemplo, a ideia de avaliar eventual conexão mais próxima a partir da análise da proximidade dos sujeitos envolvidos - tal qual previsto no art. 41(2) - pode ser transposto para a aplicação da cláusula de escape para o estatuto real.

Chama a atenção a preocupação com terceiros de boa-fé no art. 41(2) do EGBG.

O preceito reconhece o direito real de garantia como acessório em relação a um veículo e, por isso, determina aplicação da lei que rege o crédito para a constituição do direito real de garantia.

Todavia, preocupado com terceiros de boa-fé, o dispositivo estabelece que, para determinar o grau de prioridedade entre os ônus reais incidentes sobre o veículo (como na hipótese de pluralidade de direitos reais de garantia sobre o mesmo bem), aplica-se a lex rei sitae.

Com isso, outros titulares de direitos reais de garantia não serão prejudicados no caso de concorrência na excussão da coisa: a ordem de prioridade será da lex rei sitae, e não uma aleatória que poderia ser escolhida a depender do crédito garantido. Não haverá insegurança jurídica quanto à lei regente da ordem de prioridade creditória.

O art. 41(2) do EGBGB, em suma, prestigia o professio iuris (a autonomia conflitual) para afastar a lex rei sitae, salvo no que for prejudicial a terceiros de boa-fé6.

Parece-nos que o art. 23 do EGBG também prevê uma cláusula de escape, apesar de não fazer referência expressamente à ideia de conexão. O critério aí seria o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente ("o interesse superior da criança") para afastar a regra geral do elemento de conexão. Transcreve-se o referido dispositivo7:

Art. 23.

Consentimento

A necessidade e a outorga de consentimento da criança e da pessoa a ela relacionada à luz do direito de família como requisito de atribuição de um nome ou de adoção são adicionalmente regidas pela lei da nacionalidade da criança. Quando o interesse superior da criança assim o exigir, será aplicada a lei alemã.

A cláusula de escape também está presente na legislação da Suíça e da União Europeia.

Na Suíça, a referência é aos arts. 15 e 48 do Código Suíço de Direito Internacional Privado (Switzerland's Federal Code on Private International Law - CPLI)8:

Art. 15.

Cláusula de exceção

1. A lei designada por este Código não será aplicada nas situações excepcionais em que, à luz das circunstâncias, seja manifesto que o caso tem apenas uma muito limitada conexão com aquela lei e possui uma conexão muito mais forte com outra lei.

2. Este artigo não se aplica no caso de escolha da lei pelas partes.

Art. 48.

Lei aplicável

1. Os efeitos do casamento serão regidos pela lei do Estado de domicílio dos nubentes.

2. No caso de os nubentes terem domicílios diversos, os efeitos do casamento serão governados pela lei do Estado do domicílio com o qual o caso concreto tenha uma conexão mais próxima.

(...)

O supracitado art. 15 do CPLI aplica-se a todos os elementos de conexão, inclusive ao lex rei sitae, enquanto o retrocitado art. 48 foca o estatuto matrimonial.

No âmbito do direito comunitário europeu, a cláusula de escape está no Regulamento (UE) Roma I (Regulamento UE nº 593/2008) e no Regulamento (UE) Roma II (Regulamento UE nº 864/2007). Nesses casos, a cláusula de escape aplica-se para o estatuto obrigacional (obrigações contratuais e extracontratuais).

Confira os itens 20 e 21 do considerando e o art. 4º(3) do Regulamento (UE) Roma I9:

(20)  Se o contrato apresenta uma conexa~o manifestamente mais estreita com um pai´s diferente do indicado nos n.ºs 1 ou 2 do artigo 4.º, uma cla´usula de salvaguarda devera´ estabelecer que e´ aplica´vel a lei desse outro pai´s. Para determinar qual e´ esse pai´s, devera´ ser tido em conta, nomeadamente, se o contrato em questa~o esta´ estreitamente ligado a outro contrato ou a uma se´rie de contratos. 

(21) Na falta de escolha, se a lei aplicável não puder ser determinada com base no fato de o contrato poder ser classificado num dos tipos especificados ou como sendo a lei do país de residência habitual do contratante que deverá efetuar a prestação característica do contrato, o contrato deverá ser regulado pela lei do país com o qual apresenta conexão mais estreita. Para determinar qual é esse país, deverá ter-se em conta, nomeadamente, se o contrato em questão está estreitamente ligado a outro contrato ou a uma série de contratos.

(...)

Artigo 4.º

Lei aplicável na falta de escolha

1. Na falta de escolha nos termos do artigo 3.o e sem prejui´zo dos artigos 5.o a 8.o, a lei aplica´vel aos contratos e´ determinada do seguinte modo: 

a)  O contrato de compra e venda de mercadorias e´ regulado pela lei do pai´s em que o vendedor tem a sua reside^ncia habitual; 

b)  O contrato de prestac¸a~o de servic¸os e´ regulado pela lei do pai´s em que o prestador de servic¸os tem a sua reside^ncia habitual; 

c) O contrato que tem por objecto um direito real sobre um bem imo´vel ou o arrendamento de um bem imo´vel e´ regulado pela lei do pai´s onde o imo´vel se situa; 

d)  Sem prejui´zo da ali´nea c), o arrendamento de um bem imo´vel cele¬ brado para uso pessoal tempora´rio por um peri´odo ma´ximo de seis meses consecutivos e´ regulado pela lei do pai´s em que o proprieta´rio tem a sua reside^ncia habitual, desde que o locata´rio seja uma pessoa singular e tenha a sua reside^ncia habitual nesse mesmo pai´s; 

e)  O contrato de franquia e´ regulado pela lei do pai´s em que o fran¬ queado tem a sua reside^ncia habitual; 

f)  O contrato de distribuic¸a~o e´ regulado pela lei do pai´s em que o distribuidor tem a sua reside^ncia habitual; 

g)  O contrato de compra e venda de mercadorias em hasta pu´blica e´ regulado pela lei do pai´s em que se realiza a compra e venda em hasta pu´blica, caso seja possi´vel determinar essa localizac¸a~o; 

h)  Um contrato celebrado no a^mbito de um sistema multilateral que permita ou facilite o encontro de mu´ltiplos interesses de terceiros, na compra ou venda de instrumentos financeiros, na acepc¸a~o do ponto 17) do n.º 1 do artigo 4.º da Directiva 2004/39/CE, de acordo com regras na~o discriciona´rias e regulado por uma u´nica lei, e´ regulado por essa lei. 

2. Caso os contratos na~o sejam abrangidos pelo n.o 1, ou se partes dos contratos forem abrangidas por mais do que uma das ali´neas a) a h) do n.o 1, esses contratos sa~o regulados pela lei do pai´s em que o contraente que deve efectuar a prestac¸a~o caracteri´stica do contrato tem a sua reside^ncia habitual. 

3. Caso resulte claramente do conjunto das circunsta^ncias do caso que o contrato apresenta uma conexa~o manifestamente mais estreita com um pai´s diferente do indicado nos n.ºs 1 ou 2, e´ aplica´vel a lei desse outro pai´s. 

4. Caso a lei aplica´vel na~o possa ser determinada nem em aplicac¸a~o do n.º 1 nem do n.º 2, o contrato e´ regulado pela lei do pai´s com o qual apresenta uma conexa~o mais estreita. 

Confira, ainda, os itens 14, 18, 19 e 20 dos Considerandos bem como o art. 4º(3), o art. 10º(4), o art. 11º(4) e o art. 12º(2)(c) do Regulamento Roma II10:

(14) A exige^ncia de certeza juri´dica e a necessidade de administrar a justic¸a nos casos individuais sa~o elementos essenciais de um espac¸o de justic¸a. O presente regulamento estabelece os factores de conexa~o mais apropriados para a consecuc¸a~o desses objectivos. Consequentemente, o presente regulamento estabelece uma regra geral, mas tambe´m regras especi´ficas e, em certas disposic¸o~es, uma «cla´usula de salvaguarda» que permite na~o aplicar essas regras se resultar claramente do conjunto das circunsta^ncias do caso que a responsabilidade fundada em acto li´cito, ili´cito ou no risco apresenta uma conexa~o manifestamente mais estreita com outro pai´s. Assim, este conjunto de regras cria um quadro flexi´vel de regras de conflitos. Ale´m disso, permite ao tribunal em que a acc¸a~o e´ proposta tra- tar os casos individuais da forma adequada. 

(...)

(18)  A regra geral consagrada no presente regulamento devera´ ser a lex loci damni, prevista no n.º 1 do artigo 4.º. O nº 2 do artigo 4.º devera´ ser visto como uma excepc¸a~o a este princi´pio geral, criando uma conexa~o especial caso as par- tes tenham a sua reside^ncia habitual no mesmo pai´s. O n.º 3 do artigo 4.º devera´ ser entendido como uma «cla´usula de salvaguarda» relativamente aos n.ºs 1 e 2 do mesmo artigo, se resultar claramente do conjunto das circunsta^ncias do caso que a responsabilidade fundada em acto li´cito, ili´cito ou no risco apresenta uma conexa~o manifestamente mais estreita com outro pai´s. 

 

(19) Deverão ser previstas regras específicas para os casos especiais de responsabilidade fundada em ato lícito, ilícito ou no risco em relação aos quais a regra geral não permite obter um equilíbrio razoável entre os interesses em presença. 

(20) A regra de conflito de leis em mate´ria de responsabilidade por produtos defeituosos devera´ responder aos objectivos que consistem na justa repartic¸a~o dos riscos inerentes a uma sociedade moderna de alta tecnologia, na protecc¸a~o da sau´de dos consumidores, na promoc¸a~o da inovac¸a~o, na garantia de uma concorre^ncia na~o falseada e na facilitac¸a~o das trocas comerciais. A criac¸a~o de um sistema em cascata de factores de conexa~o, acompanhada de uma cla´usula de previsibilidade, constitui uma soluc¸a~o equilibrada em relac¸a~o a estes objectivos. O primeiro aspecto a ter em conta e´ a lei do pai´s onde o lesado tenha a sua reside^ncia habitual, no momento em que tenha ocorrido o dano, se o produto tiver sido comercializado nesse pai´s. Os outros elementos da cascata sa~o desencadeados se o produto na~o tiver sido comercializado nesse pai´s, sem prejui´zo do n.º 2 do artigo 4.º e da possibilidade de uma conexa~o manifes- tamente mais estreita com outro pai´s. 

(...)

Artigo 4.º

Regra geral

1. Salvo disposic¸a~o em contra´rio do presente regulamento, a lei aplica´vel a`s obrigac¸o~es extracontratuais decorrentes da responsabilidade fundada em acto li´cito, ili´cito ou no risco e´ a lei do pai´s onde ocorre o dano, independentemente do pai´s onde tenha ocorrido o facto que deu origem ao dano e independentemente do pai´s ou pai´ses onde ocorram as conseque^ncias indirectas desse facto. 

2. Todavia, sempre que a pessoa cuja responsabilidade e´ invocada e o lesado tenham a sua reside^ncia habitual no mesmo pai´s no momento em que ocorre o dano, e´ aplica´vel a lei desse pai´s. 

3. Se resultar claramente do conjunto das circunsta^ncias que a responsabilidade fundada em acto li´cito, ili´cito ou no risco tem uma conexa~o manifestamente mais estreita com um pai´s diferente do indicado nos n.ºs 1 ou 2, e´ aplica´vel a lei desse outro pai´s. Uma conexa~o manifestamente mais estreita com um outro pai´s podera´ ter por base, nomeadamente, uma relac¸a~o preexistente entre as partes, tal como um contrato, que tenha uma ligac¸a~o estreita com a responsabilidade fundada no acto li´cito, ili´cito ou no risco em causa. 

Artigo 10.º

Enriquecimento sem causa

1. Se uma obrigac¸a~o extracontratual que decorra de enriquecimento sem causa, incluindo o pagamento de montantes indevidamente recebidos, estiver associada a uma relac¸a~o existente entre as partes, baseada nomeadamente num contrato ou em res- ponsabilidade fundada em acto li´cito, ili´cito ou no risco que apresente uma conexa~o estreita com esse enriquecimento sem causa, e´ aplica´vel a lei que rege essa relac¸a~o. 

2. Sempre que a lei aplica´vel na~o possa ser determinada com base no n.º 1 e as partes tenham a sua reside^ncia habitual no mesmo pai´s no momento em que ocorre o facto que da´ origem ao enriquecimento sem causa, e´ aplica´vel a lei desse pai´s. 

3. Sempre que a lei aplica´vel na~o possa ser determinada com base nos n.º 1 ou 2, e´ aplica´vel a lei do pai´s onde tenha ocorrido o enriquecimento sem causa. 

4. Se resultar claramente do conjunto das circunsta^ncias do caso, que a obrigac¸a~o extracontratual que decorra de enriquecimento sem causa tem uma conexa~o manifestamente mais estreita com um pai´s diferente do indicado nos n.os 1, 2 e 3, e´ aplica´vel a lei desse outro pai´s. 

Artigo 11.º

Negotiorum gestio

1. Se uma obrigac¸a~o extracontratual que decorra da pra´tica de um acto relativamente a nego´cios alheios sem a devida autorizac¸a~o estiver associada a uma relac¸a~o previamente existente entre as partes, baseada nomeadamente num contrato ou em responsabilidade fundada em acto li´cito, ili´cito ou no risco que apre- sente uma conexa~o estreita com essa obrigac¸a~o extracontratual, a lei aplica´vel e´ a lei que rege essa relac¸a~o. 

2. Sempre que a lei aplica´vel na~o possa ser determinada com base no n.º 1 e as partes tenham a sua reside^ncia habitual no mesmo pai´s no momento em que ocorre o facto que da´ origem ao dano, e´ aplica´vel a lei desse pai´s. 

3. Sempre que a lei aplica´vel na~o possa ser determinada com base nos n.os 1 ou 2, é aplicável a lei do país onde tenha sido praticado o ato.

4. Se resultar claramente do conjunto das circunsta^ncias do caso que a obrigac¸a~o extracontratual que decorra da pra´tica de um acto relativamente a nego´cios alheios sem a devida autorizac¸a~o tem uma conexa~o manifestamente mais estreita com um pai´s diferente do indicado nos n.os 1, 2 e 3, e´ aplica´vel a lei desse outro pai´s. 

Artigo 12.º

Culpa in contrahendo

1. A lei aplica´vel a uma obrigac¸a~o extracontratual decorrente de negociac¸o~es realizadas antes da celebrac¸a~o de um contrato, independentemente de este ser efectivamente celebrado, e´ a lei aplica´vel ao contrato ou que lhe seria aplica´vel se tivesse sido celebrado. 

2. Caso na~o possa ser determinada com base no n.o 1, a lei aplica´vel e´: 

a)  A lei do pai´s onde ocorre o dano, independentemente do pai´s em que tenha ocorrido o facto que deu origem ao dano e do pai´s ou pai´ses em que ocorram as conseque^ncias indi- rectas desse facto; ou, 

b)  Quando as partes tiverem a sua reside^ncia habitual no mesmo pai´s no momento em que ocorre o facto que da´ origem ao dano, a lei desse pai´s; ou, 

c)  Se resultar claramente do conjunto das circunsta^ncias do caso que a obrigac¸a~o extracontratual, decorrente de negociac¸o~es realizadas antes da celebrac¸a~o de um contrato, tem uma conexa~o manifestamente mais estreita com um pai´s diferente do indicado nas ali´neas a) e b), a lei desse outro pai´s. 

__________

1 Aludimos, exemplificamente, às figuras da exceção de contato não cumprido, da exceção de inseguridade, da exceção como meio de defesa diante de uma pretensão etc.

2 DEUTSCHER BUNDESTAG. Entwurf eines Gesetzes zum Internationalen Privatrecht für außervertragliche Schuldverhältnisse und für Sachen. Publicado em 1999 (Disponível aqui).

3 Tradução livre (FEDERAL MINISTRY OF JUSTICE. Introductory Act to the Civil Code (Einführungsgesetz zum Bürgerlichen Gesetzbuche - EGBGB). Disponível aqui).

4 PATRÃO, Afonso. Autonomia conflitual na hipoteca e reforço da cooperação internacional: Removendo obstáculos ao mercado europeu de garantias imobiliárias. Lisboa/Portugal: Livros Horizonte, 2017, p. 481.

5 Tradução livre (FEDERAL MINISTRY OF JUSTICE. Introductory Act to the Civil Code (Einführungsgesetz zum Bürgerlichen Gesetzbuche - EGBGB). Disponível aqui).

6 VAN DER WEIDE, Jeoroen. Party Autonomy in Dutch International Property Law. In: WESTRIK, Roel; VAN DER WEIDE, Jeroen. Party Autonomy in International Property Law. Munich/Germany: European Law Publishers, 2011, p. 112.

7 Tradução livre (Federal Ministry of Justice, 2022).

8 Tradução livre (FEDLEX. Federal Act on Private International Law. Data 18 de December 1987 (Disponível aqui).

9 Regulamento (CE) nº 593/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho (Roma I). Data: 17 de junho de 2008 (Disponível aqui).

10 Regulamento (CE) nº 864/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho (Roma II). Data: 11 de julho de 2007 (Disponível aqui).