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Quando Claus Roxin deu uma aula de Direito Penal ao Brasil

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Atualizado às 07:49

A edição especial da coluna Migalhas Criminais de hoje trata da influência do professor Claus Roxin no Direito Penal brasileiro, especialmente no contexto da Ação Penal 470, o "Caso Mensalão". Nosso convidado para homenagear a memória do doutrinador alemão é o professor Felipe Longobardi Campana. Felipe é doutorando e mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, especialista em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e assessor da Ministra Daniela Teixeira no Superior Tribunal de Justiça.

No texto a seguir, Roxin, falecido em 20/2/25, é lembrado pelo professor Felipe por sua significativa contribuição à teoria do delito, em especial à teoria do domínio do fato. No julgamento do "Mensalão", o Supremo Tribunal Federal utilizou essa teoria para justificar condenações, principalmente no caso do ex-Ministro Chefe da Casa Civil, argumentando que sua posição hierárquica indicava controle sobre os crimes cometidos. No entanto, em entrevista à Folha de São Paulo em 2012, o próprio Roxin esclareceu que a teoria exige prova concreta de que o agente em posição de comando emitiu ordens diretas para que os crimes fossem executados, criticando o uso equivocado de sua concepção.

O texto analisa, nesse contexto, os erros do STF na aplicação da teoria do domínio do fato, destacando a falta de individualização das condutas e a confusão entre a definição de autoria e a prova da autoria. Apesar do impacto positivo do debate acadêmico que se seguiu, com obras e pesquisas aprofundadas sobre o tema, o Judiciário brasileiro continua, na visão do nosso convidado, a cometer equívocos semelhantes, especialmente em crimes tributários, ao presumir autoria com base na hierarquia empresarial.

Com a palavra, então, com muita honra, o professor Felipe Campana.

***

No dia 20 de fevereiro os penalistas e as ciências criminais receberam a triste notícia do falecimento do Professor Dr. Claus Roxin, um dos grandes pensadores do Direito Penal da metade do séc. XX e do séc. XXI. Sua vasta produção acadêmica nos mais variados temas da teoria do delito e sua inegável influência em todo o mundo, inclusive e principalmente no Brasil, são provas do tamanho de seu legado.

Como forma de homenageá-lo, apresentamos hoje uma edição extraordinária da coluna, relembrando o momento histórico em que Claus Roxin deu uma aula de Direito Penal ao Brasil e demonstrando que muitos de seus "alunos" aprenderam com ele, mas outros ainda continuam precisando de reforço.

A aplicação da teoria do domínio do fato na AP 470 pelo STF

O ano era 2012 e o Supremo Tribunal Federal se viu diante de seu maior desafio em matéria de Direito Penal até então: julgar a ação penal 470, conhecida como "Caso Mensalão". De forma resumida, o caso dizia respeito a um esquema de pagamento de vantagens indevidas a parlamentares em troca de votos em projetos de lei, o que levou à acusação de crimes como de corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de dinheiro, associação criminosa, gestão fraudulenta e outros.

Dentre os temas controversos que a Corte Suprema teve de enfrentar neste julgamento, um chamou especialmente a atenção do homenageado, Professor Claus Roxin: a aplicação da teoria do domínio do fato.

É possível sistematizar a aplicação da teoria do domínio do fato no acórdão do STF que julgou a AP 470 em dois momentos: (i) para o afastamento da tese da inépcia da denúncia em relação ao crime de gestão fraudulenta por ausência de descrição das condutas individualizadas dos acusados e (ii) para a condenação do Ministro-Chefe da Casa Civil à época pelo crime de corrupção ativa dos parlamentares. Vejamos cada um desses momentos em detalhes.

(I) Afastamento da tese da inépcia da denúncia pelo crime de gestão fraudulenta

Uma das acusações formuladas pelo Ministério Público nesta ação penal foi a da prática de gestão fraudulenta de um Banco por meio da realização de contratos de mútuo sem as devidas garantias. Ocorre que a descrição da denúncia para este fato, nas palavras da Ministra Rosa Weber: "... se limitou a dimensionar todos os atos operados por meio da referida instituição financeira, com a presumida decisão de seus administradores responsáveis" (p. 1160 do inteiro teor do acórdão). Por conta disso, as defesas dos acusados argumentaram que se tratava de denúncia inepta, que descumpria com o exigido pelo art. 41 do Código de Processo Penal.

A Ministra Rosa Weber, ao enfrentar essa tese defensiva, lançou mão da teoria do domínio do fato da seguinte forma: "Em verdade, a teoria do domínio do fato constitui uma decorrência da teoria finalista de Hans Welzel. O propósito da conduta criminosa é de quem exerce o controle, de quem tem poder sobre o resultado. Desse modo, no crime com utilização da empresa, autor é o dirigente ou dirigentes que podem evitar que o resultado ocorra. Domina o fato quem detém o poder de desistir e mudar a rota da ação criminosa. Uma ordem do responsável seria o suficiente para não existir o comportamento típico. Nisso está a ação final.... Importante salientar que, nesse estreito âmbito da autoria nos crimes empresariais, é possível afirmar que se opera uma presunção relativa de autoria dos dirigentes" (p. 1.161 do inteiro teor do acórdão).

Em suma, no voto a Ministra Rosa Weber entendeu que em crimes empresariais não havia necessidade de descrever a conduta individualizada de cada um dos acusados, pois, partindo da teoria do domínio do fato, é autor aquele que tem controle sobre os fatos e, na empresa, quem tem controle é quem ocupa o cargo de dirigente, razão pela qual ele é presumivelmente o autor do crime.

(II) Condenação do Ministro-Chefe da casa civil pela prática do crime de corrupção ativa de parlamentares

Outra acusação feita pelo Ministério Público foi a da prática do crime de corrupção ativa de parlamentares pelo Ministro-Chefe da casa civil do Governo, mais especificamente da compra de apoio político em projetos do Congresso Nacional. O ponto central da discussão era que o Ministro-Chefe da Casa Civil, pelo cargo que ocupava, foi descrito como o "principal articulador dessa engrenagem", realizando encontros para tratar de repasses de dinheiro e acordos políticos e que tinha muito poder a ponto de garantir que nada aconteceria com os demais integrantes da engrenagem (p. 4612-4613 do inteiro teor do acórdão). Porém, não se descreveu as contribuições concretas do Ministro-Chefe da Casa Civil para os crimes de corrupção ativa dos parlamentares.

Sendo assim, o Ministro Relator do caso, Joaquim Barbosa, lançou mão da teoria do domínio do fato afirmando: "...Como salienta o penalista JUAREZ CIRINO DOS SANTOS, a definição de autor baseada na teoria do domínio do fato é a que se adotada na dogmática penal desde que Hans Welzel, pela primeira vez, mencionou-a, em 1939. Veio a ser desenvolvida por Claus Roxin e, nas palavras do abalizado estudioso brasileiro, é a teoria que define "todas as formas de realização ou de contribuição para a realização do tipo de injusto" (p. 4701 do inteiro teor do acórdão). Adiante, o Ministro ainda menciona a figura da "autoria de escritório" dentro da teoria do domínio do fato para confirmar a condenação do Ministro-Chefe da Casa Civil pela posição de líder que ocupava (p. 4704 do inteiro teor do acórdão).

O Ministro Joaquim Barbosa foi seguido por outros Ministros, que argumentaram não só que a teoria em questão era compatível e aplicável ao sistema jurídico-penal brasileiro, como também a utilizaram para confirmar a mencionada condenação.

A título de exemplo é possível citar o Ministro Ayres Britto, que chegou a afirmar em um aparte durante o julgamento: "Agora, essa Teoria do Domínio do Fato pode ser compreendida no plano da fungibilidade, que é da substituição do agente, como também da infungibilidade: o agente não pode ser substituído. Então, quem não podia ser substituído nesse esquema, sob pena de fazer o esquema ruir? Quem era o regente da orquestra? O mais insubstituível ou infungível de todos. A Teoria do Domínio do Fato conduz, também, a esse raciocínio" (p. 5226-5227 do inteiro teor do acórdão).

Outro exemplo foi o voto do Ministro Celso de Mello, que, após exposição teórica sobre o concurso de pessoas e conclusão que a teoria do domínio do fato não implica em responsabilidade penal objetiva, transcreveu a seguinte lição doutrinária "Lapidar, sob tal aspecto, a autorizada lição de DOUGLAS FISCHER ("Requisitos de Denúncias Penais que envolvam Delitos Complexos e/ou com Autoria Delitiva", item 4, 2012), que, ao referir-se ao tema da teoria do domínio do fato, em coautoria, acentua que "é preciso compreender a realidade das coisas para se ter como premissa importante de que, muitas vezes, pelo modo e por quem praticadas (ou por quem ordenadas as práticas delitivas), não há como descrever detalhes e minúcias sobre o nexo causal entre o autor e o fato. Mas é possível se afirmar que o fato não se realizaria sem a ação (controle) daquele que detinha o domínio dele (.)" (p. 5207 do inteiro teor do acórdão - grifos do original).

A voz dissidente foi a do Ministro Ricardo Lewandowski, que afirmou: "O próprio Claus Roxin ... manifestou preocupação com o alcance indevido que alguns juristas e certas cortes de justiça, em especial o Supremo Tribunal Federal alemão, estariam dando a ela, especialmente ao estendê-la a delitos econômicos, sem observar que os pressupostos essenciais para sua aplicação - dentre os quais a fungibilidade dos membros da organização delituosa - "existem apenas no injusto do sistema estatal, no 'Estado criminoso dentro do Estado', assim como a Máfia e formas semelhantes de manifestação da criminalidade organizada". Feitas essas considerações, e analisados todos os elementos constantes dos autos, especialmente as condutas descritas na denúncia, chego à inelutável conclusão de que os fatos nela descritos não se revestem da excepcionalidade que o Parquet pretende lhes atribuir, razão pela qual tenho que a dita "teoria do domínio do fato" não comporta aplicação ao caso sob exame" (p. 4953-4954 do inteiro teor do acórdão).

A aula do Professor Claus Roxin ao Brasil

As diversas menções à teoria do domínio do fato e ao nome do Professor Claus Roxin pelos Ministros do STF no maior julgamento criminal da história da Corte chamou a atenção não só dos juristas, mas de jornalistas e da sociedade em geral, e acabaram chegando ao seu conhecimento.

Por conta disto, no dia 11 de novembro de 2012, Roxin concedeu entrevista ao Jornal Folha de São Paulo, na qual ensinou com a clareza e a simplicidade de seus escritos que "A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem"; disse ainda que afirmar que alguém é autor de crime somente pela sua posição hierárquica "seria um mau uso" da teoria; afirmou também que "quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado" e concluiu de forma categórica que "a posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato"1.

Nesta breve entrevista, o Professor alemão fez afirmações simples, mas com enorme profundidade, tornando-se uma verdadeira aula que transcendeu os conceitos da teoria do domínio do fato e atingiu os passos mais elementares para a aplicação do Direito penal por um julgador.

Em primeiro lugar, quando Roxin afirmou que a pessoa que ocupa a posição no topo precisa "ter comandado esse fato, emitido uma ordem", o que ele indicou foi que, muito mais básico do que afirmar os critérios do "domínio do fato", é preciso identificar uma conduta praticada por todos os indivíduos. Deixou claro que qualquer condenação penal precisa que um indivíduo tenha praticado uma conduta e, por isso, afirmar que alguém é autor do crime somente pela sua posição hierárquica seria um mau uso da teoria. A teoria do domínio do fato não substitui a necessidade de que o acusado tenha praticado uma conduta, mas antes pressupõe essa prática.

Já neste ponto os Ministros se equivocaram, pois, ao invés de identificarem as condutas concretas para condenar os acusados pelos crimes de gestão fraudulenta e corrupção ativa, o que fizeram foi utilizar o uso coloquial do termo "domínio do fato" para substituir a necessidade de identificar as condutas praticadas.

Em segundo lugar, ao afirmar que a ordem deveria ser provada, Roxin destacou que essa conduta individualizada - a ordem - é objeto de prova no processo penal. Portanto, quando se identifica conduta de um indivíduo que ocupa um cargo de superior hierárquico, ainda é preciso que o Ministério Público prove que aquela conduta realmente foi praticada. Logo, a teoria do domínio do fato também não substitui a necessidade de provar as condutas.

Aqui novamente os Ministros erraram, pois buscaram na teoria do domínio do fato o caminho para "presumir a autoria" em detrimento das provas necessárias das condutas, quando a teoria do domínio do fato é uma teoria que estabelece um critério para definir quem é o autor do crime. E é preciso deixar claro: "prova da autoria" e "definição de autor de um crime" são conceitos diferentes. A prova da autoria, no processo penal, é a prova de quem praticou a conduta descrita na denúncia. A definição do autor de um crime é a utilização de um critério jurídico para definir, dentre os vários intervenientes em um fato criminoso, quem é o autor e quem é partícipe.   

Por fim, em terceiro lugar, ao afirmar que a posição hierárquica não fundamenta o domínio do fato, Roxin finalmente adentrou no debate sobre os critérios da teoria. Assim, uma vez identificada a conduta de cada interveniente e provadas as suas ocorrências, passa-se ao exame jurídico para definir quem é autor e quem é o partícipe nos fatos, o que se denomina de teoria do concurso de agentes.

De início, é preciso ter em mente que essa definição de autor e partícipe é um problema concreto no direito penal alemão, pois o Código Penal traz expressamente a separação entre as duas figuras (sistema diferenciador). Logo, os penalistas precisam se debruçar para tentar encontrar critérios que melhor as distinguem. No Brasil esse problema não é tão claro, pois o Código Penal não apresenta essa distinção, admitindo que todos os concorrentes para o fato serão igualmente responsabilizados por ele (art. 29 do CP).

Porém, caso se adote o sistema diferenciador no Brasil, é necessário contextualizar que a teoria do domínio do fato é uma teoria que procura apresentar um critério para definir quem é o autor de crimes comuns, dolosos e comissivos, distinguindo-o dos partícipes. O que diz a teoria é: será autor do crime aquele que, com seu comportamento, controlar o se e o quando do crime. Esse controle pode acontecer em três hipóteses: (i) quando o agente controla a própria ação (autoria imediata): situação em que o agente, ao realizar a conduta executiva, tem controle sobre o próprio corpo e, portanto, controla o se e o quando do crime; (ii) quando o agente controla a vontade de terceiro (autoria mediata): situação em que o agente, ao realizar sua conduta, controla aquele que praticará a conduta executiva (executor), pois ele atuará sem conhecimento a respeito de alguma circunstância fática importante (em erro) ou atuará sob coação moral e, portanto, acaba controlando o se e o quando do crime, mesmo não tendo realizado a conduta executiva com o próprio corpo e (iii) quando o agente tem controle funcional do fato (coautoria): situação em que o agente tem um plano comum com os outros intervenientes e cada um deles, ao praticarem suas condutas individuais, acabam contribuindo na fase executiva do crime e, portanto, detém, todos, o controle sobre o se e o quando do crime.

Uma das principais contribuições de Roxin para o critério do domínio do fato foi desenvolver uma terceira forma de autoria mediata: o chamado domínio por aparatos organizados de poder. Conforme esclareceu na entrevista, Roxin se incomodava com a questão de que a teoria do domínio do fato, tal qual concebida até então, conduziria a afirmar que aqueles que ocupam uma posição hierarquicamente superior em uma organização apartada do Direito e prolatam uma ordem para um inferior hierárquico executar o crime seriam somente partícipes. Isso porque, dado que o inferior hierárquico praticou a conduta executiva sem estar em erro e sem estar coagido, ele era autor imediato e controlava sozinho o se e o quando do crime. Logo, o superior hierárquico seria somente partícipe por instigação. Portanto, concebeu a figura da autoria por aparatos organizados de poder, na qual, quando se está diante de uma organização com hierarquia rígida, que esteja apartada do Direito e que tenha em seus executores pessoas fungíveis, aquele que profere a ordem tem tamanha certeza de que ela será cumprida, que detém o domínio sobre o se e o quando do crime, sendo, portanto, autor. No entanto, diferente das outras figuras da autoria mediata, nas quais o executor não é autor porque está em erro ou sob coação, nesta figura sua fungibilidade e atuação em um aparato organizado de poder não lhe retiram a autoria, razão pela qual se diz que essa é a figura do "autor por trás do autor".

Foi a figura da autoria por aparatos organizados de poder que os Ministros do STF tentaram utilizar, mas a confusão era tamanha, principalmente com os dois passos anteriores, que sequer conseguiram chegar a uma verdadeira discussão jurídica e madura a respeito desta figura e sua aplicação no Brasil. Porém, como se pôde ver acima, ela não significa que quem ocupa uma posição de superior hierárquico é autor, mas sim ela diz que quem ocupa tal posição em um aparato organizado de poder, ao proferir uma ordem (conduta provada), será autor do crime tal qual o executor que recebeu essa ordem.

Com esses pontos, fica evidente que a entrevista concedida pelo homenageado de hoje foi muito mais profunda do que uma simples explicação dos critérios da teoria do domínio do fato. Foi uma verdadeira aula sobre como julgar um fato criminal que envolve diversos intervenientes.

Fizemos a lição de casa?

Em parte, os "alunos" dessa "aula" de Roxin fizeram a lição de casa. Todo esse debate sobre a teoria do domínio do fato no STF e depois a entrevista do professor alemão foram essenciais para que se sucedessem ótimos artigos, livros, dissertações e teses sobre a temática do concurso de agentes no Direito Penal brasileiro. A título de exemplo, é possível citar a obra "Autoria como domínio do fato", dos Professores Luís Greco, Alaor Leite, Adriano Teixeira e Augusto Assis, e a obra "A teoria do concurso de pessoas: uma investigação analítico-estrutural a partir da controvérsia sobre o conceito de instigação", da Professora Beatriz Corrêa Camargo.

No entanto, de outro lado, o Poder Judiciário continua insistindo nos equívocos cometidos pelos Ministros no julgamento da Ação Penal 470 do STF. Tem-se observado, ainda de forma reiterada, denúncias e condenações por crimes tributários, por exemplo, baseadas exclusivamente na posição hierárquica de sócio ou diretor da empresa, preterindo, assim, a necessária indicação de uma conduta praticada pelo agente e da prova dessa conduta. Observa-se, ainda, a incorreta afirmação de que o indivíduo, por ocupar essa posição de sócio ou diretor, detém o "domínio do fato", que nada mais é do que um uso coloquial e indevido da teoria.

Na contramão dessa insistência, podem ser ilustradas duas recentes decisões monocráticas proferidas pela Ministra Daniela Teixeira do Superior Tribunal de Justiça (HC 968.598 e AREsp 2.738.499), nas quais reconheceu não só que os acusados foram condenados com base somente na posição de sócios que ocupavam, mas também que os Tribunais utilizaram equivocadamente a teoria do domínio do fato com um uso coloquial do termo.

O Ministro Lewandowski, ao fazer um aparte durante o julgamento da ação penal 470, acabou apresentando a seguinte "profecia": "O que me preocupa, Senhor Presidente, eminente Decano, é exatamente a banalização dessa teoria. Como é que os quatorze mil juízes brasileiros vão aplicar essa teoria, se esta Suprema Corte não fixar parâmetros bem precisos?" (p. 5201-5202 do inteiro teor do acórdão).

Um agradecimento final

Essa é uma singela homenagem de um desses "alunos" da entrevista, que lá em 2012 se encantou com todo esse debate e acabou seguindo o caminho dos estudos e pesquisas em Direito Penal.

Muito obrigado, Professor Claus Roxin!

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1 Entrevista reproduzida em: "Teoria do domínio do fato é usada de forma errada".