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Estabilidade provisória da gestante no contrato experiência

sexta-feira, 10 de março de 2023

Atualizado às 08:43

A conhecida estabilidade de emprego decorrente de gestação, destinada à proteção da maternidade pela empregada, pode ser questionada do ponto de vista dos contratos pactuados com termo final já previsto e previamente conhecido pelas partes de acordo com as decisões dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), fundamentado pelo Tema n.º 497 do Supremo Tribunal Federal (STF).

Importante frisar que o objeto de discussão da origem do referido Tema, pelo recurso extraordinário n.º 629.053/SP, foi o de pacificar a imprescindibilidade da confirmação do estado de gravidez pela empregada no momento da dispensa sem justa causa pelo empregador. Logo, em momento nenhum os ministros do STF entraram no mérito acerca do direito à estabilidade da empregada gestante nos contratos a prazo determinado, tal qual o de experiência (art. 443 da CLT).

O referido Recurso Extraordinário possui ideia original totalmente afastada do debate em torno da possibilidade de não se aplicar a estabilidade aos contratos a prazo determinado. Com o voto do relator, o ex-ministro Marcos Aurélio, a fundamentação foi no sentido de que a parte interessada não pode interpretar o dispositivo constitucional (art. 10, inciso II, alínea 'b', dos Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT), na medida em que se beneficia dela em detrimento do objetivo da qual a norma se destina. Além disso, firmou-se o elastecimento do termo "confirmação" para "concepção da gravidez", bastando o crivo biológico da gestação para que nasça o direito a estabilidade.

Contudo, contrariando o entendimento do Tribunal de origem, inovou-se para aplicar a responsabilidade subjetiva ao empregador, ou seja, a empregada deveria comunicar estar gestante antes da dispensa imotivada, pois, se ela mesma, a maior interessada não sabia que se encontrava gestante, quanto menos ainda seu empregador. No entanto, o ministro Alexandre de Moraes contrariou o entendimento do relator, sendo acompanhado pelos demais ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Ricardo Lewandowski.

Dentre os fundamentos considerados, temos que a norma constitucional tem dupla função protetiva, tanto da mãe quanto do nascituro (arts. 6º e 227 da CF/88). Portanto, apesar de também entender que não confere ao empregador a responsabilidade objetiva, o texto constitucional não agrega outro requisito formal da empregada de confirmação prévia à dispensa, bastando que, mesmo após a rescisão imotivada, se ela provar o feito biológico, ambos (mãe e o bebê) devem ser beneficiados com a garantia provisória do emprego.

Desse debate, nasceu o teor do Tema nº 497 do STF, cuja tese é a seguinte: "A incidência da estabilidade prevista no art. 10, inc. II, do ADCT somente exige a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa". Assim, após essa breve exposição, é importante trazer ao centro como os TRTs e o TST estão interpretando e aplicando a tese nos contratos a prazo determinado, a saber:

RECURSO DE REVISTA (...) 1. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. GRAVIDEZ NO CURSO DO CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. SÚMULA Nº 244 III, DO TST. TEMA 497 DA REPERCUSSÃO GERAL DO STF EFEITO VINCULANTE E EFICÁCIA ERGA OMNES APLICAÇÃO OBRIGATÓRIA DA TESE ATÉ A ESTABILIZAÇÃO DA COISA JULGADA (TEMA 360 DA REPERCUSSÃO GERAL). I. Segundo o entendimento consagrado no item III da Súmula nº 244 do TST, "a empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10 inciso II, alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado" Sobre o tema, a jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a circunstância de ter sido a empregada admitida mediante contrato por prazo determinado não constitui impedimento para que se reconheça a estabilidade provisória de que trata o art. 10 II, b, do ADCT. II. A discussão quanto ao direito à estabilidade provisória à gestante contratada por prazo determinado encontra-se superada em virtude da tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 629 053 / em 10 10 2018 com a seguinte redação: "A incidência da estabilidade prevista no art. 10 inc. II, do ADCT, somente exige a anterioridade da gravidez à dispensa sem justa causa". III. A decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 497 é de clareza ofuscante quanto elege como pressupostos da estabilidade da gestante. (1) a anterioridade do fator biológico da gravidez à terminação do contrato e (2) dispensa sem justa causa, ou seja, afastando a estabilidade das outras formas de terminação do contrato de trabalho (...). Resta evidente que o STF optou por proteger a empregada grávida contra a dispensa sem justa causa como ato de vontade do empregador de rescindir o contrato sem imputação de justa causa à empregada, excluindo outras formas de terminação do contrato, como pedido de demissão, a dispensa por justa causa, a terminação do contrato por prazo determinado, entre outras. IV. O conceito de estabilidade, tão festejado nos fundamentos do julgamento do Tema 497 da repercussão geral, diz respeito à impossibilidade de terminação do contrato de trabalho por ato imotivado do empregador, não afastando que o contrato termine por outras causas, nas quais há manifestação de vontade do empregado, como no caso do pedido de demissão (a manifestação de vontade se dá no fim do contrato) ou nos contratos por prazo determinado e no contrato de trabalho temporário (a manifestação de vontade do empregado já ocorreu no início do contrato). (...). Assim, na hipótese de admissão mediante contrato por prazo determinado, não há direito à garantia provisória de emprego prevista no art.10, inciso II, alínea b, do ADCT. Superação do item III da Súmula 244 do TST pelo advento da tese do Tema 497 da repercussão geral do Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado no RE 629.053, na Sessão Plenária de 10/10/2018. (...) VI. Recurso de revista de que não se conhece. (TST-RR: 10003339620195020321, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 07/10/2020, 4ª Turma, Data de Publicação: 09/10/2020).

RECURSO ORDINÁRIO. CONTRATO POR PRAZO DETERMINADO. ESTABILIDADE GESTANTE. TEMA 497 DA REPERCUSSÃO GERAL DO STF. (...) Portanto, segundo a Suprema Corte, a incidência da estabilidade provisória da gestante de pende da existência de dois requisitos cumulativos, quais sejam: a anterioridade da gravidez e dispensa sem justa causa. Nesse contexto, encontra-se superado o entendimento esposado no item III da Súmula n. 244 do TST, uma vez que o contrato a termo não preenche todos os requisitos estabelecidos pelo STF, notadamente o pressuposto da "dispensa sem justa causa", tendo em vista que o seu término ocorre no prazo já ajustado pelas partes. Destarte, cumpre reconhecer que, na hipótese de admissão mediante contrato por prazo determinado, que é a situação dos autos, não há direito à garantia provisória de emprego prevista no art.10, inciso II, alínea b, do ADCT. (TRT-1-RO: 01003318620215010038RJ, Relator: JORGE ORLANDO SERENO RAMOS, Data de Julgamento: 08/12/2021, Quinta Turma, Data de Publicação: 28/01/2022)

De acordo com o entendimento dos Tribunais Trabalhistas supra referidos, por ter a Suprema Corte prolatada decisão apenas sob a ótica do direito à estabilidade nas dispensas imotivadas, para as demais hipóteses de rescisão, quais sejam, os tipos de contrato a prazo determinado, a estabilidade deixa de ser conferida às empregadas cujo termo final do contrato já foi estabelecido no ato da contratação, superando-se, com isso, o item III da Súmula 244 do TST.

Sob outro aspecto, o cuidado deve recair nos casos de contrato a prazo determinado para fins de experiência, pois, a intenção de tal espécie contratual, conferida por até 90 dias, é no sentido de que se a empregada superar ou atingir as expectativas para aquele cargo ou função para o qual foi admitida pelo seu empregador, poderá ter o seu contrato convertido automaticamente a prazo indeterminado.

Neste sentido, é evidente que o objeto do Tema nº 497 do STF não se aproxima sob essa hipótese, mas é importante que ela seja trazida ao debate para que a real aplicação do contrato de experiência não seja subvertido quando se deparar com a notícia de uma gestação, afinal, se o empenho dessa empregada, agora gestante, estiver mais que superado nas expectativas pelo empregador, corolário lógico não faria sentido o término do contrato no termo final, pois além de poder configurar a discriminação dessa empregada, descaracterizaria o objetivo final do direito social constitucional de proteção a maternidade.

Por conseguinte, generalizar a tese do Tema n. 497 do STF para os contratos a prazo determinado, como vem sendo aplicado pelos Tribunais Trabalhistas, pode ensejar prejuízos à contratação de empregadas mulheres, tanto do ponto de vista da estabilidade, bem como da exigência que um filho traz na vida de uma mulher. Ainda que o Estado tente minimizar os impactos que esse fato traz a ela, é quase impossível retirar essa estigmatização que tal realidade acarreta na relação contratual entre empresa e empregada.

De outro modo, não podemos afastar a hipótese de a empregada não atingir as expectativas ou não se adaptar à função para a qual foi contratada, situação na qual o empregador poderá considerar o término no dia final previsto em contrato de trabalho, ainda que ciente ou não da gravidez na comunicação de extinção da experiência.

Visto que o propósito do contrato de experiência atingiu sua finalidade, de tal maneira que o direito social não alcança mãe e o nascituro, deve a empregada demonstrar objetivamente que cumpriu com os requisitos do período de experiência e, a partir daí, requerer a conversão do pacto experimental para contrato a prazo indeterminado. Neste caso, passa o empregador a ter o ônus de comprovar - por métricas expressas em cláusula avençada no contrato de trabalho ou em regimento interno da empresa - a objetividade de sua decisão de forma isenta, de sorte que a mera possibilidade de uma eventual gravidez não deve interferir na decisão de romper no termo final do acordo.

Em suma, apesar de o E. STF ter entrado no mérito apenas quanto à estabilidade na situação em que ocorrer dispensa sem justa causa, não podem as decisões judiciais serem isentas do aspecto mencionado. Se é verdade que as relações contratuais se mostram complexas e inseridas em contextos específicos, a bilateralidade que deve ser sopesada considerando a empregada a parte mais frágil dessa relação. No mais, devemos lembrar que a finalidade da continuidade dos contratos vai além de gerar estabilidade provisória, por força da segurança jurídica, saúde financeira da empresa e dos critérios objetivos constitucionais para que os atores sociais tomem para si a responsabilidade de seu papel em contribuir para uma sociedade mais justa e responsável, de modo que as oportunidades da manutenção do vínculo de emprego tragam para ambas as partes o que corresponde a cada um.