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Que país (do futebol) é este?

quarta-feira, 22 de maio de 2024

Atualizado às 07:32

Semana passada foi, na falta de outro termo mais apropriado, animada para quem acompanha o desenvolvimento da SAF, subtipo societário criado pela Lei 14.193, de 6 de agosto de 2021, de autoria do Presidente do Congresso Nacional e do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD/MG).

No mesmo dia que, em Brasília, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal aprovou o Projeto de Lei 2.978, de 2023 ("PL 2.978"), de autoria do próprio Presidente Rodrigo Pacheco, uma liminar foi concedida, no Rio de Janeiro, para afastar, como se verá adiante, o acionista controlador de uma SAF.

O PL 2.987 tramitava em caráter terminativo e, com a sua aprovação, seguirá para Câmara dos Deputados. Seu propósito é inequívoco: aparar algumas arestas que naturalmente surgem em processos legislativos, evidenciadas, no caso, em disputas ocorridas nos quase três anos de vigência da lei, e, assim, oferecer ao país um ambiente ainda mais seguro para o desenvolvimento da atividade futebolística.

Tal é, aliás, o sentido do parágrafo conclusivo da justificação apresentada pelo Presidente Rodrigo Pacheco: "Demos passos importantes para o crescimento do esporte, e o aprendizado é permanente. Estou seguro de que as alterações propostas irão fortalecer ainda mais a competitividade do setor futebolístico nacional em relação a outros mercados, trazendo mais investimentos, gerando mais empregos e renda, equilibrando os interesses dos envolvidos e, por fim, contribuindo para ampliar a qualidade do espetáculo aos torcedores".

A pertinência e a precisão do PL 2.978, relatado pelo Senador da República Marcos Rogério (PL/RO), são reforçadas pela ínfima quantidade de propostas de emendas, ao contrário do que se costuma verificar em projetos de quase qualquer natureza.

A única que foi corretamente incorporada ao texto, apresentada pelo Senador da República Carlos Portinho (PL/RJ) - que já havia relatado, no âmbito do Senado Federal, o projeto de lei que resultou, em 2021, na Lei da SAF -, autoriza a adoção do tipo organizativo de SAF também por liga de futebol, constituída ou organizada por entidades de prática desportiva.

A elogiável inciativa reforça a perspectiva que a todos parece inexorável, consistente na unificação de pretensões, para formação de uma liga (unificada), composta por todos os times de séries A e B, semelhantemente às que dominam o ambiente global, como a inglesa.

Enfim, naquele dia que deveria ser marcado (e comemorado) pelo novo passo que se dava no caminho para formação do mercado brasileiro, uma decisão liminar tomou o ainda incipiente mercado - e, seguramente, todas as pessoas que acompanham a Lei da SAF - de surpresa, transformando tal dia, como todos os seguintes, em puro suspense (outra vez, na falta de expressão mais apropriada). 

Não se adentrará, aqui, em temas puramente jurídicos, visto que a própria decisão optou por abandonar esta premissa, que deveria informar o ato de julgar. Pinçam-se, dela, apenas alguns trechos reveladores (mantendo-se, neste texto, o emprego de termos imprecisos, pela falta de outros mais adequados).  

Neste sentido, a matéria submetida à apreciação judicial esbordaria o direito puro, atingindo paixões e sentimentos que não poderiam ser desconsiderados. De modo que o alcance social da medida pretendida pelo clube seria mais amplo que o interesse contratual privado.

Ela (a decisão) vai além, ao consignar que não apenas a gestão econômico-financeira importa no caso, sendo crucial o estabelecimento de um mutualismo benéfico, com entrega dos resultados esperados, tanto pelo clube que conferiu seu destino à SAF, como aos inúmeros torcedores, merecedores de respeito, carinho e amor pela instituição objeto de suas paixões.

De modo que a SAF não se revelaria uma companhia (ou sociedade anônima) com objeto social limitado aos valores econômicos, mas incorporadora da necessidade de afeição entre os personagens que dela participam.

Curioso que tais argumentos não serviram - e não servem - para promoção de intervenções salvadoras em clubes que, na mesma linha, não seriam meras associações civis com objeto limitado de organizar o futebol, e que, historicamente, foram geridos por políticos clubísticos que se apropriaram de instituições supostamente pertencentes aos torcedores (uma mentira secular, pois juridicamente, clubes pertencem aos associados, apenas, e não à coletividade da torcida), e as levaram, em conjunto com seus times, como no caso do próprio Vasco, à profunda decadência (e, também no caso, a 4 rebaixamentos num período de menos de 15 anos).

Pois, no caso da recém-constituída SAF Vasco da Gama, encontrou-se fundamento para: suspensão dos efeitos do contrato e do acordo de acionistas celebrados entre clube e investidor; suspensão dos direitos societários (políticos e patrimoniais) do investidor; e afastamento dos conselheiros indicados pelo investidor.

Espera-se, por fim (e apenas), que instâncias revisoras, assim como o sistema judicial, em qualquer localidade do país, julguem os temas que envolvam SAF em favor da parte que ostentar o bom direito, de acordo com a lei (e a constituição, para preservação do futuro da Nação), e não em conformidade com preferências ou, se a moda se inverter, com rancores clubísticos.