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O futebol e a superficial proposta de Lula/Haddad

quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Atualizado às 08:37

Lula poderia ter transformado o Brasil. Ele, como nenhum outro brasileiro, nem mesmo Getúlio Vargas, reunia carisma, astúcia, apoio, inteligência e poder para realizar um projeto realmente transformacional. Preferiu o continuísmo.

Em relação ao futebol, as mudanças que se cogitaram não questionavam ou enfrentavam a estrutura secular de controle da propriedade da empresa futebolística, responsável pelo aniquilamento de uma potencialidade inerente ou inata. Lula e, aliás, a quase totalidade dos políticos brasileiros ainda não reconhecem, de verdade, o futebol como elemento de inserção, desenvolvimento social e econômico: portanto, um poderoso instrumento de transformação.

Ao contrário, fez-se uma grande aposta nos eventos e espetáculos midiáticos e planetários, que serviram, afinal, para satisfazer os interesses de uma pequena elite política ou econômica, que se beneficiou à conta da população e do Estado.

Não se construíram, enfim, políticas públicas; criaram-se, sobretudo, fatos políticos, para suportar um discurso eufemista.

O Plano de Governo de Lula, que se tornou o de Haddad, reconhece, implícita ou explicitamente, aquelas afirmações, mas apresenta soluções equivocadas, contraditórias ou irrealizáveis para enfrentar os erros do passado.

Veja-se o que ele diz:

"Os governos do PT investiram muito no esporte. Destacam-se (...) a construção e requalificação de milhares de quadras esportivas e praças de esportes, e a organização dos grandes eventos esportivos. A Copa do Mundo (2014) e as Olimpíadas (2016), para citar apenas dois exemplos, induziram investimentos urbanos, modernizaram nossa infraestrutura esportiva, geraram investimentos em aeroportos e na economia do turismo. Mostramos ao planeta que, fora de campo, somos capazes de receber povos do mundo todo.

(...)

É preciso reconhecer que faltou o debate do legado, da utilização desses fatores para dar um salto organizativo de potencialização do esporte nacional, sobretudo o futebol.

(...)

Mais do que isso: parte das estruturas criadas está sendo sucateada pela crise fiscal dos Estados e Municípios, agravada pelo governo golpista. O presidente Lula entende que o desenvolvimento do esporte deve ser tratado como política de Estado.

(...)

Por fatores históricos e culturais, o futebol expressa a própria identidade nacional. Além de produto de lazer, é fator de desenvolvimento econômico regional e nacional. Por essa razão, o futebol é importante demais para continuar à mercê de interesses meramente privados, muitas vezes obscuros. No governo Lula, ele será priorizado e moralizado, e ganhará mecanismos efetivos de controle público e participação social na sua gestão.

Por meio do BNDES, o governo implementará o Programa de Modernização da Gestão do Futebol, além de buscar a construção de um calendário anual e unificado para o futebol. Ademais, será promovida a viabilização das Arenas das Copas nos estados".

Diante dessas proposições, mais valem perguntas do que comentários ou conclusões:

1. Quais foram os investimentos e os resultados?

2. Onde estão os investimentos urbanos úteis para a população?

3. Existe realmente um setor do turismo do futebol? Pessoas viajam, em número considerável, para o ou pelo Brasil a fim de assistir futebol?

4. Os equipamentos estão sendo sucateados ou, na verdade, já nasceram podres, porque superfaturados, mal construídos e absolutamente inviáveis operacional e economicamente?

5. Se o esporte faz parte dos grandes temas, quais são as propostas efetivas para sua implementação e seu desenvolvimento?

6. De quais interesses privados o futebol está à mercê?

7. Cabe ao Estado manejá-lo (o futebol) ou simplesmente estabelecer o marco regulatório para preservá-lo como patrimônio cultural, de um lado, e incentivar o investimento, de outro?

8. O Estado já não é o principal financiador, por meio de renúncias, perdões, parcelamentos e patrocínios de empresas públicas aos clubes?

9. Se o Estado subsidia o futebol há mais de século, o seu fracasso organizacional não está ligado às próprias intervenção e participação estatais no esporte?

10. Políticos e cartolas, no limite, não se confundem?

11. Como se irá moralizar o futebol? Quais as iniciativas pretendidas para tanto? Quais serão os agentes que substituirão os imorais? Quem são os imorais?

12. O Estado vai interferir na gestão dos clubes? Será esse o seu papel?

13. É papel do BNDES criar um programa de modernização da gestão de clubes? Como se colocará em prática, mediante a contrapartida em recursos públicos? Deve o contribuinte financiar clubes de futebol? E como isso se fará nas associações - entidades sem fins lucrativos, politizadas e compostas de conselhos e diretorias formados por dezenas ou centenas de membros, despreparados para os cargos que ocupam?

14. O Governo irá impor um calendário à CBF? E se ela não aceitar, o que fará? Intervenção? Criação de uma agência reguladora?

15. Qual é a fórmula milagrosa que tornará arenas como as de Brasília ou Manaus rentáveis?

Os eleitores que pararam para ler o programa de governo oficial merecem respostas, antes da eleição, tendo em vista que esse discurso não é suficiente ao atingimento dos objetivos a que se propõe: recuperar (ou desenvolver) o futebol brasileiro.