Os pequenos clubes de futebol e a pequena empresa futebolística
quarta-feira, 4 de outubro de 2017
Atualizado às 08:13
Rodrigo R. Monteiro de Castro e José Francisco C. Manssur
Em 2006 foi promulgada a LC 123/2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Seu propósito era - e é - oferecer aos empreendedores de menor porte uma via de acesso à formalidade jurídica. Daí a instituição de um regime tributário especial: o Simples Nacional.
São elegíveis ao Simples Nacional as sociedades empresárias, as sociedades simples, as empresas individuais de responsabilidade limitada e os empresários individuais que apurem receita bruta por ano-calendário, (i) no caso da microempresa, igual ou inferior a R$ 360.000,00, e (ii) no caso da empresa de pequeno porte, superior a R$ 360.000,00 e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00.
Recentemente, a Câmara dos Deputados instalou uma Comissão Especial para revisar a LC 123/2006, e foi designado, como relator, o deputado Otávio Leite (PSDB/RJ).
O deputado Otávio Leite destaca-se no cenário legislativo nacional pela sua atuação - e luta - em prol da melhoria do ambiente jurídico do futebol: são exemplos dessa atuação a relatoria do Profut e a autoria do projeto de lei da Sociedade Anônima do Futebol - SAF (PL 5.082/16).
Surge, assim, a oportunidade de plantar na LC 123/2006 um estímulo à pequena empresa futebolística, atribuindo-lhe tratamento tributário compatível com aquele oferecido às demais empresas econômicas.
Antes, porém, deve-se estimular, ou melhor, condicionar esse tratamento a uma revisão dos modelos de propriedade e de governança das entidades que se dedicam ao futebol. E isso se justifica pelo anacronismo da forma organizacional preponderante e pela sua inadequação com um sistema tributário voltado ao incentivo do empreendedorismo.
Aliás, o futebol é, sim, uma atividade econômica, que se desenvolve em distintos planos, do micro ao macro, passando, portanto, pelos pequenos clubes regionais às grandes empresas futebolísticas que, paradoxalmente, continuam a operar sob a forma de associações civis sem fins econômicos.
Revela-se, pois, um descompasso entre a nova realidade do esporte, que demanda a aproximação da empresa futebolística do mercado financeiro e de capitais, e a forma secular pela qual ainda se organiza.
A reforma da LC 123/2006 pode, assim, contribuir para a mudança organizacional a partir da base piramidal, portanto, a partir dos pequenos clubes.
A proposta é a seguinte: acrescentar um parágrafo ao art. 18 da LC 123/2006, para incluir o futebol como atividade elegível ao Simples Nacional, que seria tributada nos termos do Anexo I do Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte: isto é, conforme a sistemática de alíquotas progressivas, as quais aumentam de acordo com a evolução da receita bruta da empresa, observados, porém, tetos, para cada faixa fixada na Lei. Para tanto, a associação civil sem fins lucrativos deverá, antes, (i) transformar-se em sociedade empresária ou (ii) constituir, com ativos do futebol, uma sociedade empresária.
Dessa forma, as sociedades empresárias constituídas pela transformação ou com bens ou ativos relacionados ao futebol poderiam optar pelo Simples Nacional.
Trata-se de uma proposta em harmonia com o PL 5.082/16, de autoria do próprio Deputado Otavio Leite, que propõe a criação da SAF, no qual está previsto um regime tributário especial transitório para os clubes de futebol que optarem pela adoção do modelo da SAF ("Re-Fut"). Isso porque o Re-Fut, que dirige suas preocupações aos tributos federais, i) estaria disponível a todas as entidades futebolísticas que adotassem o modelo da SAF, independentemente do volume de receitas geradas (ou seja, não tem aplicação limitada aos micro e pequenos empresários futebolísticos), e ii) tanto o Re-Fut, quanto o Simples Nacional, são eletivos, logo, poder-se-ia abandonar um para optar pelo outro, se se mostrasse mais vantajoso do ponto de vista econômico.
O Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte tem um objetivo muito claro: desenvolver e fortalecer a economia brasileira, a partir de sua base. Partindo da premissa de que o futebol é uma atividade econômica e que há vários pequenos clubes que poderiam optar pelo regime do Simples Nacional, a inclusão do futebol nesse sistema resgata uma oportunidade perdida e pode, ainda, estimular a economia futebolística.
Essa é, para concluir, uma medida benéfica a todos: (i) à Administração Pública, pois facilita os processos fiscalizatórios e arrecadatórios e tem o poder de aumentar o volume de tributos recolhidos aos cofres do Estado, ao incentivar a transformação organizacional dos clubes; e (ii) aos próprios clubes, diante dos incentivos de cunho fiscal promovidos pelo regime de tributação mais favorecido.