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Ele se foi. A sua alma ficou. Ele é imortal

terça-feira, 12 de setembro de 2023

Atualizado às 08:39

Todos nós, em algum momento da vida, ou em vários, ou durante ela toda, tivemos algum amigo que nos auxiliava e amparava, em situações específicas ou permanecia atento e alerta para intervir quando necessário fosse. Laços de amizade formavam um elo entre essas pessoas a nós de forma absolutamente desinteressada. Essa afeição nem sempre correspondida a um estreito relacionamento no nosso cotidiano. E, nem era preciso, pois bastava haver uma necessidade para que o protetor dissesse presente.  

Durante a minha já longa existência - quero que ela mais se alongue - eu encontrei um expressivo número de amigos prontos a dar estímulo e colaboração à uma empreitada ou para estender-me a mão em alguma situação de dificuldade.  

Um desses amigos foi-se recentemente. Seu nome, Antônio Ivo Aidar. A característica mais marcante do nosso relacionamento foi o seu desprendimento. De mim nada quis, mas muito me deu.  

Era notável o seu entusiasmo pela Ordem dos Advogados e por sua política. Logo nos primórdios de sua carreira profissional talvez antes até de formar-se, empenhou-se na instalação da subseção da OAB na sua amada cidade natal, Olímpia. Os colegas de lá devem ser gratos à sua insistência e pertinácia, responsáveis pela subseção local. Não pararam aí  as postulações de Ivo em prol de sua cidade. Anos depois, foi inaugurada a Casa do Advogado, que leva o nome de Henri Couri Aidar, saudoso advogado, homem público e dirigente esportivo de escol,  também de Olímpia. Creio também que se não fosse a sua   obstinação os advogados locais não teriam a sua Casa.

Quanto a mim, creio dever a Ivo boa e significativa parcela da minha trajetória junto à OAB. A subseção de Olímpia foi instalada quando a Ordem de São Paulo era presidida por Mário Sérgio Duarte Garcia. A pedido de Ivo fui designado para fazer o discurso na solenidade de inauguração. A partir desse evento, creio eu em 1980, trilhamos juntos uma longa e exitosa trajetória na política de classe.

Quando em 1986, fui candidato à presidência da entidade lá estava ele me apoiando, estimulando e trabalhando intensamente em toda a sua região. Foi grande a sua indignação e inconformismo em relação à votação de Olímpia: dois advogados não votaram em nossa chapa. Ivo passou vários anos para descobrir quem foram os insubordinados, que não obedeceram à sua voz de comando.

Nos anos seguintes, seguramente durante trinta e poucos anos ele participou intensamente das campanhas de Ordem, apoiando os candidatos lançados por nosso grupo que originariamente denominava-se Tempos Novos. Nos anos em que o grupo não apresentou candidato o seu inconformismo era grande. Ligava-me constantemente para reclamar, pois entendia que eu era o "chefe", o responsável único pelas decisões do grupo. Essa sua impressão a meu respeito  muito me lisonjeava.

É preciso acentuar que Ivo não era apenas um entusiasta da política,  exercida por ele com grande maestria. Tinha muita percepção não só dos fatos da política como decifrava os homens que dela participavam. Irônico e sagaz não perdoava aqueles pouco dotados de inteligência, e com finura de espírito produzia tiradas  hilariantes a respeito de suas vítimas.  

Ivo possuía características peculiares que lhe emprestavam um natural charme expresso por suas  pitorescas observações e condutas, sempre marcadas pelo seu agudo senso de humanismo, solidariedade e bondade.  

Não posso deixar de invocar o testemunho daqueles que acompanharam a sua carreira como advogado e o assistiram nas audiências. O grande advogado de família era  respeitado e  temido pelos adversários,  por alguns  juízes, pois não perdoava os desvios éticos dos colegas e os abusos dos magistrados. Reagia com enérgicas e sarcásticas intervenções. A defesa intransigente de seus clientes assegurava a esses uma assistência eficiente e corajosa numa área delicada e sensível da profissão.   

Ivo atuou em vários setores e departamentos da Ordem, tendo se destacado na presidência da Comissão do Advogado Deficiente. Nessa oportunidade, demonstrou toda a sua sensibilidade humana e o seu poder de cativar as pessoas. Ivo foi amado por quem o conheceu.

Meu amigo de sempre e sempre amigo, da minha parte  ficam a minha gratidão, a minha saudade e a minha permanente lembrança dos momentos  de vida compartilhados com ele. Como disse o poeta Fernando Pessoa,  a morte é como a curva do rio, apenas não se é mais visto.

Você viverá, Antônio Ivo Aidar, na memória de todos nós, por isso você se tornou imortal.