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Competição culinária em família

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Atualizado em 15 de julho de 2011 13:14

Em minha família a mesa sempre ocupou um lugar de destaque na pauta dos interesses de todos. Minha avó paterna era uma exímia doceira. Doces basicamente de ovos, creme, maisena, muito açúcar, acompanhados, obviamente pelo colesterol, mas claro que pelo bom colesterol. A mesa em sua casa permanecia posta até a noite. Apenas mudavam as iguarias, adaptadas aos períodos do dia.

Dentre todos nós destacava-se o meu irmão José Eduardo, um excepcional comilão, que levou essa marca até os cinquenta e quatro anos, idade em que nos deixou. Ele foi um grande colecionador de façanhas culinárias : comia de quatro a seis bifes a milaneza; tijolos ou latas inteiras de sorvete; coca-cola sem limites; pastéis, empadas e coxinhas em abundância. Certa ocasião comeu, juntamente com um amigo, também do ramo, noventa e poucas esfihas. Quando falava do espantoso número, ele fazia a ressalva de que comera apenas a metade daquela quantidade, mais de quarenta e cinco, e que as esfihas eram pequenas...

José Eduardo, embora tivesse a sua vida caracterizada por outros interesses, objetivos e afetos, teve na comida uma razão de viver. Aliás, minha mãe dizia que as pessoas comiam para viver, mas que ele vivia para comer. As pessoas o identificavam por esse aspecto, e esse aspecto constituiu um elo afetivo real entre ele e os seus inúmeros amigos, além de sua irresistível simpatia, de uma graça natural e de um charme encantador.

Eu imaginava que meu irmão fosse o grande glutão, o emérito gourmet, o festejado comilão. Cumpre salientar que ele tanto tinha um paladar apurado, como, em razão de seu apetite descomunal, apreciava guloseimas de duvidosa qualidade, com a mesma voracidade, entusiasmo e falta de moderação.

Sempre considerei José Eduardo imbatível dentro da família. Mas, não. Embora não tenha sido destronado, parece que irá partilhar o "podium" com um primo, ou melhor com o neto de um querido amigo e primo, Eduardo Viegas Mariz de Oliveira. Trata-se de um jovem de dezesseis anos. Magro, espadaúdo, educado reservado aparentemente e enganosamente comedido.

Pois bem, esse jovem, como tantos outros, é adepto da comida japonesa. Certo dia, foi com amigos a um restaurante onde os pratos típicos são servidos na forma de rodízio. Assim, durante horas, foram servidos temaki, somaki, tempura, guioza, e outros. À medida que se satisfaziam, os comensais iam agradecendo e cruzando os talheres. Para espanto dos garçons, apenas o meu primo neto não se saciava. E, mais vinha, mais ele comia e mais ele pedia. Até que, estupefato, mas acima de tudo preocupado com o seu estoque de peixes e demais alimentos que compõe a cozinha nipônica, o gerente, após um cálculo mental de seus prejuízos, verificou que seria menos gravoso às finanças da casa não cobrar o valor fixo do rodízio do que deixar que a voracidade do jovem lhe absorvesse o ganho.

Meu irmão, de onde estiver, estará passando os seus bons fluidos gastronômicos, para que o seu sucessor honre a sua memória e dê continuidade às tradições familiares de bem e muito comer.