Uma esperança para o Brasil
segunda-feira, 20 de junho de 2011
Atualizado em 17 de junho de 2011 14:56
Papai ao vê-lo dizia: "Gil, Gil, Gil esperança do Brasil". Disse isso durante bem, bem, uns quarenta anos. É verdade que não se viam constantemente. Ao contrário. Eram espaçados os seus encontros. Moravam em cidades diversas. Papai em São Paulo, tio Gil em Santos. A frase era dita apenas pela rima e nada mais. Meu tio ao ouvi-la abria um sorriso e pronto. O sorriso, embora repetido por todos aqueles anos, não era forçado, era espontâneo, sincero. Claro que não recebia a frase como verdadeira em seu conteúdo. Apenas agradava-lhe ouvi-la do cunhado, pois lhe soava como um dito carinhoso. Estranharia se um dia ouvisse um formal "Como vai Gil?". E, o sorriso que brotava de seu rosto de queixo grande e espessos bigodes negros, era recebido por meu pai como uma carinhosa retribuição.
Hoje, sei que o cumprimento de meu pai a tio Gil tinha um significado e passava uma mensagem, com certeza não elaborada por ele de forma consciente, mas que brotava de sua percepção a respeito do caráter das pessoas. Papai considerava que se todos os homens possuíssem uma característica marcante da personalidade de meu tio, que era a sua proverbial bondade, o Brasil seria melhor, ou mesmo a humanidade seria menos imperfeita do que é. A ganância, a insensibilidade, o egoísmo, o desprezo pelo próximo por representarem a antítese da bondade seriam, pelo menos em parte, substituídas por ela. A esperança para o Brasil estava, pois, na bondade de Gil Ribeiro de Mendonça.
Um outro fato, esse tendo como protagonista a minha mãe, trazia contida a imensa bondade que habitava aquele ser especial. Agora, trata-se da bondade refletida em algumas de suas manifestações exteriores: a gentileza, a delicadeza, a educação. Minha mãe não tomava café. Nunca tomou. O fato era familiarmente notório, pois não havia parente próximo ou distante que o ignorasse. No entanto, não houve ocasião no curso de quase quarenta anos de relacionamento no qual estando mamãe hospedada em casa de sua irmã, minha tia Bina, casada com Ttio Gil, em que na hora sagrada do café noturno ele não indagasse "Carmen Lucia quer um cafezinho?". Diante da reiterada e desnecessária pergunta, minha tia fazia uma também reiterada advertência "Gil, Carmen Lúcia não toma café Gil", dando uma entonação de enfado e de irritação. Mas, pouco adiantava, pois no dia seguinte se repetia o gentil oferecimento. Minha mãe limitava-se a sorrir e com paciência explicava ao cunhado muito querido: "Não Gil obrigada, eu não tomo café". Coisas de pessoas bondosas, ligadas pelos laços da amizade, do afeto e da compreensão.