O pai pródigo
domingo, 11 de agosto de 2024
Atualizado em 9 de agosto de 2024 14:53
O Papa Francisco, sendo entrevistado por uma jornalista italiana, foi indagado a respeito de uma pesquisa em que um professor de ensino religioso narrou a parábola do filho pródigo e depois pediu aos alunos que fizessem uma interpretação a respeito do texto. O resultado foi totalmente desfavorável ao filho que, segundo eles, deveria ser punido severamente, desalojado da casa familiar e ser colocado em companhia dos servos.
O Papa, em resposta, entendeu a reação dos jovens que fizeram sua leitura com base nos critérios impostos pela justiça dos homens e, principalmente, por entenderem que o irmão mais velho, que permaneceu trabalhando na casa do pai, sentiu-se desprestigiado em razão do tratamento dispensado ao irmão que havia regressado, após gastar toda a fortuna recebida e viver perambulando pelas ruas. E, acima de tudo, com festa. Mas o pontífice fez ver que a satisfação do pai era tamanha que não mediu esforços para bem receber o filho, cercando-o de abraços afetuosos. Nada no mundo teria mais valor para ele do que o reencontro com aquele que estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado.
Se, de um lado, figura o filho pródigo, o esbanjador que dissipou seus bens, de outro, surge o pai pródigo, aquele que é generoso e magnânimo em seu sentimento.
Esta passagem bíblica ilustra e enriquece a dimensão do amor de um pai, que tomou uma decisão que, aparentemente, contraria as regras de conduta, pois está beneficiando aquele que abandonou a família, perdeu suas posses, viveu dissolutamente. Mas o regozijo do pai foi tamanho que traduziu, por si só, o perdão para todos os erros que o filho tivesse cometido.
Na realidade, é difícil dimensionar o potencial afetivo de um pai, que carrega no peito o espírito amadurecido pelo exercício da própria vida. Falar para o pai, no dia dele e a respeito dele, é sempre uma tarefa difícil, quer esteja presente ou não.
O pai, geralmente é circunspecto, parece pensar com os olhos, avalia ponderadamente as situações. Deixa o pensamento fermentando em silêncio, lança seu olhar meio esgazeado e fica analisando os paradoxos do mundo, sem muito entender às vezes, mas com maturidade suficiente para ensinar que a vida não é um local onde os sonhos são distribuídos gratuitamente e sim o palco para comemorar as grandes realizações.
É o momento de abrir as comportas da infância, dissipar as cortinas de fumaça e encontrar seu herói, seu paladino, com poderes quase que divino, a protegê-lo nesta aventura maravilhosa chamada vida, espaço propício para dimensionar o amor humano.
Vai se lembrar da voz mansa ou altiva, dos gestos nem sempre bem distribuídos, dos passos quase sempre apressados, do silêncio que substituía as respostas, dos sábios ensinamentos que você não ligava muito e hoje você sabe que para subir a montanha a estrada é uma só e o atalho, que tanto você insistia, pode levar ao abismo.
Vai se lembrar de muitos conselhos, repetitivos até, que você sempre rotulava de desnecessários, mas que, com o passar do tempo, começou a elegê-los como prioritários. Você vai pegar carona na maneira simples e prazerosa como ele encarava a vida, as gargalhadas sem fim, suas histórias e piadas envelhecidas, seu jeito franco e despojado de narrar seu assunto predileto, sua invejável calma, sem traumas.
E você vai concordar com o pai do relato bíblico, que soube onde fincar as estacas de sua alegria ao aninhar o perdão como seu novo aliado. Passou ao largo do erro do filho, deu as costas para a tristeza e abriu seu coração com incontida esperança.