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A conceituação popular da prisão em flagrante

domingo, 26 de maio de 2024

Atualizado em 24 de maio de 2024 14:24

A prisão em flagrante delito, apesar de sua pertinência jurídica se encontrar disciplinada pelo art. 302 de Código de Processo Penal, apresenta-se como um tema que frequenta as conversas populares, principalmente quando ocorre um crime de repulsa comunitária com a imediata detenção do seu autor. O crivo popular fica vigilante e muitas vezes encontra decepção, quer seja porque o autor não pode ser preso coercitivamente, oportunidade em que o flagrante será relaxado, ou, por outras razões, receberá a concessão do benefício da liberdade provisória, ou até mesmo sairá livre com o pagamento de fiança.

É interessante observar que a população brasileira, em sua grande maioria, após tomar conhecimento da prática de alguns crimes que tenham alardeamento público com divulgação pelas mídias, indaga com muito interesse a respeito da prisão antecipada e a pena a ser aplicada, em caso de condenação, como provável herança das o rdenações do reino de Portugal, em que o autor que lesava sobremaneira a comunidade devia ser levado à prisão, sem chances de liberdade ou de substituir o gravame por outra medida eficaz. 

Os princípios filosóficos que nortearam as declarações universais dos direitos dos homens e que se alojaram em nossa Constituição como o reconhecimento do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, fazem ver que a liberdade é conteúdo programático indissociável dos direitos fundamentais do homem e se insere de forma absoluta entre os postulados do Estado de Direito. Com fundamento nesse sistema de controle, a liberdade do cidadão poderá sim ser cerceada pelo Estado, desde que sejam cumpridas as regras estabelecidas constitucionalmente. 

Quando se trata de prisão flagrancial, exige a concorrência de pelo menos uma das modalidades previstas no art. 302 do CPP. Assim só poderá ser preso, resumidamente:

  1. Quem está cometendo ou acaba de cometer a infração penal;
  2. For perseguido, logo após o crime;
  3. For encontrado, logo depois. Percebe-se, propositadamente, que a premissa do legislador vem elencada em escala valorativa decrescente de credibilidade: aponta os casos de verdadeiros flagrantes nas duas primeiras situações, quer dizer não há nenhuma dúvida com relação à certeza visual do cometimento do crime; já nas duas outras elege o quase-flagrante ou flagrante presumido para dar validade ao ato coercitivo. Sem tais requisitos não há que se falar em prisão em flagrante.

Das prisões provisórias, a realizada em flagrante delito é a que reúne os melhores requisitos de credibilidade e dão o suporte necessário para a realização do ato coercitivo. A etimologia latina flagrans dá a entender aquilo que está crepitando, pegando fogo e é visto com muita clareza. Flagrante, portanto, vem a ser a certeza visual da prática de um crime, não deixando pairar nenhuma dúvida a respeito da autoria. Tamanha é sua importância na legislação processual que a autoridade tem o dever de realizar a prisão e o particular, por sua vez, a faculdade, como longa manus do Estado, para poder praticar o ato detentivo, desde que sejam obedecidos os lapsos temporais anunciados acima. 

Isto quer dizer que a prisão em flagrante oferece, a um só tempo, a autoria e a materialidade do crime, circunstâncias que somente seriam perquiridas em inquérito policial instaurado pela autoridade competente. Ocorre, no entanto, que, apesar de ser a prisão em flagrante delito a mais recomendável - por oferecer de pronto a autoria e a materialidade necessárias para o início da persecução penal, fazendo prevalecer a certeza visual do cometimento do crime na prisão de constatação - a prisão preventiva, pela sua própria caracterização processual, que representa uma prévia análise laboratorial seguida de uma fundamentação convincente e obrigatória, surge como sendo a predileta na legislação brasileira. Tanto é que referida prisão vai exigir um debruçar engenhoso e cauteloso para fazer incidir os requisitos de necessidade e conveniência da decretação da segregação provisória. Daí que, em muitos casos, a pessoa flagrada cometendo um crime é colocada em liberdade e nem mesmo será decretada sua prisão preventiva, por ser desnecessária e inconveniente.