Pontuação
quarta-feira, 25 de junho de 2008
Atualizado em 20 de setembro de 2022 12:24
O migalheiro Adauto Suannes envia-nos a seguinte mensagem:
"Meus caros. Há o caso célebre que ilustra a importância da pontuação das frases: 'Jesus está aí não ressuscitou' pode significar tanto uma coisa como outra:
a) Jesus está aí? Não. Ressuscitou.
b) Jesus está aí! Não ressuscitou.
Enviam-me uma dessas frases aparentemente sem sentido. Faltam nela, para que tenha sentido, um ponto, uma exclamação e duas vírgulas. Submeto-a aos migalheiros: Maria toma banho porque sua mãe disse ela pegue a toalha."
1) Indaga-se qual a pontuação a ser feita no seguinte texto: "Maria toma banho porque sua mãe disse ela pegue a toalha". E se esclarece que faltam nela, para que tenha sentido, um ponto, uma exclamação e duas vírgulas.
2) De evidente utilidade, a pontuação é conhecida há séculos e já presenciou aparição e o desaparecimento de muitos sinais.
3) A partir da década de cinqüenta do século XX, tomou significativo impulso e passou a orientar-se - além das razões sintáticas tradicionais e dos impulsos subjetivos - pelas recomendações e exigências mais apuradas da redação técnica.
4) De um modo geral, é empregada para representar, na escrita, a dinâmica da fala, marcando a entonação, as pausas respiratórias e enfáticas.
5) Oportuno é anotar que os chamados clássicos de nossa literatura nem sempre lhe atribuíram posição de relevo, motivo pelo qual não é incomum encontrar, mesmo em abalizados escritores, erros de pontuação, tais como os cometidos por qualquer usuário da escrita.
6) As gramáticas, por seu lado, pouco trazem a seu respeito, sobretudo no que concerne ao uso da vírgula.
7) Deve-se conferir, todavia, adequado valor à pontuação, até porque, em certos casos, errar ou acertar é questão de vida ou morte.
8) Para ilustrar a necessidade de observância dos princípios de pontuação, lembre-se que a lenda conta que Alexandre Magno, não querendo prosseguir em suas conquistas, antes de voltar à Babilônia, mandou, como era de praxe à época, fosse consultada uma pitonisa acerca do futuro. A resposta veio em cinco palavras soltas, sem qualquer sinal de separação; e sua leitura foi feita por Alexandre e seus generais do modo como mais lhes convinha: "Vais. Voltas. Não morrerás lá." Em campanha, porém, febre aguda acometeu o grande conquistador, que acabou morrendo aos trinta e três anos, em 323 a. C. Seus generais, lembrando-se da pitonisa, mandaram buscá-la, para que fosse punida pela errônea previsão. Qual não foi o espanto deles, contudo, quando ouviram dela a adequada leitura do vaticínio: "Vais. Voltas? Não! Morrerás lá."
9) Da lenda, de igual modo, vem a história de que, na antiga Rússia, em apelo extremo, um czar rejeitara as alegações de um condenado, encimando o recurso com o lacônico veredicto: "Manter condenação. Impossível absolver." Tendo profundo e pessoal interesse no caso, mas sem querer ostensivamente desafiar o czar, a czarina, durante a madrugada, teria revertido a situação, valendo-se de pequenas alterações: "Manter condenação impossível: absolver."1
10) De mesma natureza é a história que tem circulado pelos computadores de todo país. Conta ela que um homem rico estava muito mal. Pediu papel e pena e assim escreveu: "Deixo meus bens à minha irmã não a meu sobrinho jamais será paga a conta do alfaiate nada aos pobres". Morreu antes de fazer a pontuação. Sendo quatro os concorrentes, o sobrinho fez a seguinte pontuação: "Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho. Jamais será paga a conta do alfaiate. Nada aos pobres." A irmã chegou em seguida e assim pontuou o escrito: "Deixo meus bens à minha irmã. Não ao meu sobrinho. Jamais será paga a conta do alfaiate. Nada aos pobres". O alfaiate pediu cópia do original. Não teve dúvidas em assim pontuar: "Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do alfaiate. Nada aos pobres". Então chegaram os descamisados da cidade. Um deles, sabido, fez esta leitura: "Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do alfaiate? Nada! Aos pobres!"
11) Quanto ao período da indagação (não sei se há outros sentidos), pode ele ser pontuado ao menos dos seguintes modos, todos corretos:
I) Maria toma banho porque sua. Mãe! disse ela, pegue a toalha!
II) Maria toma banho, porque sua. Mãe! disse ela, pegue a toalha!
III) Maria toma banho porque sua. Mãe! - disse ela - pegue a toalha!
IV) Maria toma banho, porque sua. Mãe! - disse ela - pegue a toalha!
V) Maria toma banho porque sua. Mãe! (disse ela) pegue a toalha!
VI) Maria toma banho, porque sua. Mãe! (disse ela) pegue a toalha!
VII) Maria toma banho porque sua. "Mãe!" disse ela. "Pegue a toalha!"
VIII) Maria toma banho, porque sua. "Mãe!" disse ela. "Pegue a toalha!"
IX) Maria toma banho porque sua. "Mãe!" - disse ela - "Pegue a toalha!"
X) Maria toma banho, porque sua. "Mãe!" - disse ela - "Pegue a toalha!"
XI) Maria toma banho porque sua. "Mãe!" (disse ela) "Pegue a toalha!"
XII) Maria toma banho, porque sua. "Mãe!" (disse ela) "Pegue a toalha!"
XIII) Maria toma banho porque sua. - Mãe! disse ela, pegue a toalha!
XIV) Maria toma banho, porque sua. - Mãe! disse ela, pegue a toalha!
XV) Maria toma banho porque sua. - Mãe! - disse ela - pegue a toalha!
XVI) Maria toma banho, porque sua. - Mãe! - disse ela - pegue a toalha!
XVII) Maria toma banho porque sua. - Mãe! (disse ela) pegue a toalha!
XVIII) Maria toma banho, porque sua. - Mãe! (disse ela) pegue a toalha!
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1Cf. COSTA, José Maria da. Revisão de Português. 2. Ed. Campinas: Millennium Editora Ltda., 2005. p. 348.