A leitora Raquel Otranto envia à coluna Gramatigalhas a seguinte mensagem:
"Está muito na moda o uso do neologismo empoderamento (e do verbo correspondente empoderar), como tradução do inglês "empowerment". Justifica-se esse uso, ou seria melhor continuar a usar o termo em inglês entre aspas?"
1) Uma leitora parte do princípio de que está muito em moda, em nosso idioma, o uso do neologismo empoderamento (e do verbo correspondente empoderar), como tradução do inglês "empowerment". E indaga se esse uso se justifica, ou se seria melhor continuar o emprego do termo em inglês entre aspas.
2) Inicia-se esta resposta com a observação de que, entre nós, a Academia Brasileira de Letras é o órgão incumbido, por delegação legal, desde a lei 726/1900, de definir a existência, a grafia oficial, o gênero e as peculiaridades dos vocábulos de nosso idioma. E ela, para atender a essa autorização legal, o faz oficialmente pela edição, de tempos em tempos, do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP). Mais modernamente, ela também tem disponibilizado em seu site, pela internet, o rol dessas palavras e expressões.
3) Com essa anotação como premissa, segue-se dizendo que uma consulta à referida obra mostra que nela se registra o verbo empoderar, mas não o substantivo empoderamento.1 E isso significa, em última instância, que o referido verbo existe oficialmente em nosso idioma e pode ser normalmente empregado, mas não o substantivo mencionado.
4) Seguindo um pouco mais no raciocínio, ante esse quadro, pode-se completar dizendo que, na linguagem culta, está autorizado o emprego do referido verbo, mas não o do citado substantivo.
5) Acrescente-se, num primeiro aspecto, que, com o caráter dinâmico da fala, bem possivelmente em algum tempo o último dos vocábulos referidos também há de ser registrado no rol das palavras existentes em nosso idioma pela Academia Brasileira de Letras, com o que seu emprego deverá, então, estar autorizado na linguagem culta.
6) Num segundo aspecto, complemente-se com a circunstância de que o Dicionário Houaiss não registra nenhum de tais vocábulos, enquanto o Dicionário Aurélio registra ambos como existentes no idioma.
7) Com esse relato de fato, esclarece-se que ambos os dicionaristas estão equivocados, o primeiro por excluir um vocábulo registrado pelo VOLP, e o último por encartar um outro que o VOLP não registra.
8) Em realidade, ante a autoridade da ABL e do VOLP para fixar oficialmente o rol das palavras existentes em nosso idioma, são tecnicamente inaceitáveis as posições de ambos os dicionaristas. E, a esta altura, é preciso dizer que os estudiosos da língua e os dicionaristas, sem sombra de dúvida, prestam relevantes serviços ao vernáculo com seus estudos e pesquisas. Não são eles, porém, as autoridades para definir, com valor oficial, a existência ou não de algum vocábulo em nosso idioma, nem sua grafia ou suas peculiaridades. Essa atribuição cabe, de modo exclusivo, por delegação legal, à Academia Brasileira de Letras, de modo que, na divergência entre os gramáticos, filólogos e dicionaristas de um lado, e o VOLP de outro, há de prevalecer, nesse campo, o que registra este último.
9) Com essas premissas, de modo direto para a indagação da leitora, extraem-se, em síntese, as seguintes conclusões: (i) o verbo empoderar já se acha incluído no rol dos vocábulos pertencentes ao idioma, de modo que pode ser empregado normalmente, na atualidade, como integrante de nosso léxico; (ii) já empoderamento, entretanto, por falta de registro no VOLP, não deve ser usado, devendo-se preferir o emprego do substantivo inglês entre aspas, a saber, "empowerment".
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1 Academia Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Imprinta, 2004, p. 309.