Quem serve para coisa ou só para pessoa?
quarta-feira, 14 de dezembro de 2016
Atualizado em 3 de janeiro de 2023 10:23
O leitor Cesar Cruz envia a seguinte dúvida ao Gramatigalhas:
"Usar o 'quem' numa situação em que o sujeito não é humano não configura uma inadequação? Veja: 'Foram os cartões corporativos quem fizeram mais sucesso no carnaval'. Não seria mais adequado 'que fizeram'?"
1) Um leitor pergunta se configura inadequação usar quem numa situação em que o termo referido não é pessoa, e sim coisa. E traz um exemplo colhido na mídia, para demonstrar sua estranheza: "Foram os cartões corporativos quem fizeram mais sucesso no carnaval".
2) Ora, no português moderno, em estruturas como a trazida pelo leitor, o que serve para coisas e pessoas, mas quem serve apenas para pessoas, e não para coisas. Exs.: a) "Foi o reitor que o ajudou naquela dificuldade" (correto); b) "Foi o reitor quem o ajudou naquela dificuldade" (correto); c) "Foi o dicionário que o ajudou naquela dificuldade" (correto); d) "Foi o dicionário quem o ajudou naquela dificuldade" (errado).
3) Vejam-se, porém, dois exemplos de autores clássicos em que não se obedeceu a essa regra: a) "A ciência do direito romano foi quem, para desconto, trouxe o absolutismo às nações" (Alexandre Herculano); b) "... Toledo, cidade nobre e antiga, a quem cercando o Tejo em torno vai, suave e ledo" (Luís de Camões).
4) Quanto a esses dois exemplos de séculos atrás, Cândido Jucá Filho, mesmo assim, traz justificativa mais do que apropriada: "em ambos os casos há certa personificação do ser a que se alude" (1963, p. 525).
5) Para o português atual, todavia, em termos de norma culta, deve-se observar os princípios inicialmente postos, de modo que se deve assim corrigir o exemplo trazido pelo leitor: "Foram os cartões corporativos que fizeram mais sucesso no carnaval".