Uso dos tempos verbais
quarta-feira, 9 de janeiro de 2013
Atualizado em 3 de outubro de 2022 14:29
A leitora Adriana Cristina Alonso envia a seguinte mensagem ao Gramatigalhas:
"Prezados, estou com duas dúvidas, que, por sinal, foram objeto de muita discussão entre colegas da área, tendo eu sido vencida quanto à correção da redação dos parágrafos abaixo transcritos, no que tange à concordância do verbo ter, ora em destaque nos dois casos. Peço, assim, a gentileza do auxílio, para eu poder aclarar a todos (e, mais que isso, a mim mesma) sobre a exata adequação da oração, já que me vejo até o momento não convencida pelos argumentos despendidos para a manutenção do texto. A propósito, no primeiro caso, a minha opinião foi que fosse colocada a forma verbal terá e, no segundo, a forma têm.
Dúvida 1: 'Os acionistas detentores de ações preferenciais decidem por apresentar aos demais acionistas a sugestão para que o valor recebido em decorrência do pagamento do ágio seja destinado à conta de reserva de capital da Companhia, reserva essa que terá/teria por finalidade o pagamento de dividendos a ações preferenciais, consoante dispõe o inciso V do artigo 200 da lei 6.404/76.'
Dúvida 2: 'Em consequência às deliberações acima, os acionistas renunciam expressamente ao exercício do direito de preferência que têm/teriam quanto à subscrição das novas ações, citadas nos itens anteriores, direito esse previsto no inciso IV do art. 109 e art. 171, ambos da lei 6.404/76'."
1) Uma leitora indaga qual a forma correta de uso dos verbos em dois exemplos, os quais, para o que aqui interessa, podem ser resumidos do seguinte modo: a) "O valor do pagamento do ágio será destinado à conta de reserva de capital da Companhia, reserva essa que terá/teria por finalidade o pagamento de dividendos a ações preferenciais, consoante dispõe o inciso V do art. 200 da lei 6.404/76"; b) "Os acionistas renunciam ao exercício do direito de preferência que têm/teriam quanto à subscrição das novas ações, direito esse previsto no inciso IV do art. 109 e art. 171, ambos da lei 6.404/76".
2) No plano gramatical, observa-se, no que tange ao primeiro exemplo, que se emprega o futuro do pretérito (teria) para denotar uma ação que ainda se vai realizar, mas que se põe na dependência de uma condição. Ex.: "A vida presente do homem seria inexplicável, se não cresse na vida futura".
3) Já o futuro do presente (terá) denota uma ação que também se vai realizar no futuro, mas que não se põe na dependência de condição alguma. Ex.: "A morte virá para todos".
4) No caso da consulta, a finalidade futura do provisionamento do valor ali mencionado é formar a reserva de capital para pagar dividendos e ações preferenciais, e não se põe isso na dependência de condição alguma. Muito ao contrário, a certeza da finalidade e do provisionamento é patente e até mesmo se confirma pela previsão expressa de disposição legal referida no próprio texto.
5) Em verdade, dizer teria - em vez de terá - , como é de fácil percepção, pode sugerir uma possibilidade de ter, não uma certeza de ter.
6) Veja-se, por conseguinte, o modo correto de dizer a primeira frase da consulta: "O valor do pagamento do ágio será destinado à conta de reserva de capital da Companhia, reserva essa que terá por finalidade o pagamento de dividendos a ações preferenciais, consoante dispõe o inciso V do art. 200 da lei 6.404/76".
7) Em seguida, formulado acima o segundo exemplo com o que interessa para o caso, observa-se que, em termos técnicos, sua diferença gramatical para o exemplo anterior é que têm é presente do indicativo, e não futuro do presente. Todavia, em concordância com o primeiro caso, o presente do indicativo tem a mesma característica do futuro do presente, já que denota algo que se realiza agora, sem se submeter à dependência de condição alguma (ao contrário de teriam).
8) Em outros dizeres, no caso, os acionistas estão renunciando, presentemente, ao incondicionado direito à subscrição das novas ações. Dizer teriam - em vez de têm - , como é de fácil percepção, pode sugerir, como no caso do item primeiro da consulta, apenas uma possibilidade de ter, não uma certeza de ter.
9) O modo correto de dizer a segunda frase, assim, é: "Os acionistas renunciam ao exercício do direito de preferência que têm quanto à subscrição das novas ações, direito esse previsto no inciso IV do art. 109 e art. 171, ambos da lei 6.404/76".