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Tribunal Constitucional alemão confirma fechamento de restaurantes durante a segunda onda de Covid-19

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Atualizado às 09:44

Com a decretação de novo lockdown na Alemanha, pipocaram em todo o país ações judiciais questionando a constitucionalidade das medidas, movidas por restaurantes, hotéis, cinemas, academias de ginástica e outros estabelecimentos que foram obrigados a fechar as portas. E algumas delas já começam a chegar em Karlsruhe, cidade sede dos tribunais superiores.

Na semana passada, a Corte Constitucional - Bundesverfassungsgericht (BVerfG) - se viu envolvida com processo movido pela administradora de cinema na Bavária, que possui um complexo com sete salas, em uma das quais funciona um restaurante.

Ela questionava a constitucionalidade de diversos dispositivos do (oitavo) decreto de combate ao coronavírus do Estado da Bavária (bayerische Infektionsschutzmaßnahmenverordnung), de 30.10.2020, os quais, em suma, proíbem o funcionamento de estabelecimentos e atividades culturais no período de 2 a 30 de novembro desse fatídico ano.

A autora da queixa constitucional alugava as salas do complexo do cinema, durante a pandemia, para grupos fechados. Ela alega que o decreto restringe desarrazoadamente o exercício de sua atividade comercial ao proibir a realização de atividades e o funcionamento de estabelecimentos recreativos, gastronômicos, cinemas e outras atividades culturais.

Em razão disso, estaria sem condições de arcar com os custos de manutenção do complexo, pois não está mais recebendo os valores dos alugueis das salas e o serviço de entrega de comida é insuficiente para cobrir aqueles custos.

Em decisão na semana passada, o 1º. Senado do BVerfG negou o pedido liminar formulado pela autora. Trata-se do processo BVerfG 1 BvR 2530/20, julgado dia 11/11/20.

De acordo com o § 32, inc. 1 do Regulamento Interno da Corte, um pedido liminar só pode ser deferido quando a medida for necessária, no caso concreto, para evitar grave dano ou por razões de relevante interesse público, o que não restou caracterizado no caso em análise.

De início, o Tribunal salientou que o fechamento do cinema e das atividades de entretenimento não fora pré-questionado nas instâncias inferiores, de modo que a autora não teria esgotado todo os meios legais. No ponto relacionado ao fechamento do estabelecimento gastronômico, a Corte entendeu que a reclamação constitucional não era claramente improcedente.

O Tribunal reconheceu que, de fato, o fechamento do restaurante representa grave intervenção no direito fundamental ao exercício profissional autora, tutelado no art. 12, inc. 1 da Grundgesetz (GG), a Lei Fundamental alemã, ainda quando o § 13, inc. 2 do Decreto estadual permita a entrega ou retirada de comida no restaurante.

Com o indeferimento da tutela requerida, ponderou o BVerfG, a autora não poderá colocar o restaurante em funcionamento até o final de novembro desse ano, data prevista para a suspensão do lockdown parcial decretado pelo Poder Público. E a oferta de entrega ou retirada de bebida e comida não irá minimizar o prejuízo econômico por ela amargado.

Mas, por outro lado, argumentou a Corte, há de se considerar o fato de que se trata de restrição temporária ao direito fundamental e que a autora não demonstrou que a medida ameaça concretamente sua existência, sendo, portanto, insustentável.

Não basta a referência geral e genérica ao risco de sobrevivência dos estabelecimentos gastronômicos e de seus fornecedores, sendo necessária a apresentação de números concretos, diz a decisão. Ademais, o setor gastronômico deve receber auxilio estatal em torno de 75% do faturamento do ano anterior para ajudar na crise financeira e a autora não demonstrou que, apesar da ajuda, ainda corre risco de sobrevivência financeira.

Além disso, os riscos da pandemia de Covid-19 precisam ser levados a sério, pois o número de novos casos de infecção estão crescendo vertiginosamente, de modo que o sistema de saúde poderá ser seriamente comprometido. E não se consegue descobrir com segurança as fontes de contágio, o que significa que não se pode afirmar com segurança que os estabelecimentos gastronômicos não contribuem para o contágio.

Por fim, ponderou a Corte, é preciso ter em conta que a decisão de paralisar alguns setores e outros não, como escolas, creches e grande número de empresas e estabelecimentos comerciais, faz parte de um conceito geral formulado pelo Poder Público para combate à pandemia.

Dessa forma, o atendimento do pleito da autora poderia comprometer o êxito e a eficácia do conceito como um todo, dificultando ou impedindo o controle da pandemia. E o Poder Público é, em princípio, até obrigado a adotar medidas de proteção da vida e da saúde por força dos direitos fundamentais à vida e à integridade física e corporal, nos termos do art. 2, inc. 2 da GG, como já reconheceu o Tribunal em outros julgados1.

Assim, embora reconhecendo a gravidade da restrição ao direito fundamental da autora, nesse momento, em caso de dúvida, sublinhou o BVerfG, deve prevalecer a proteção da vida e da saúde da população, bem como a capacidade do sistema de saúde.

Essa foi a primeira manifestação da Corte Constitucional acerca do lockdown parcial decretado por conta da segunda onda de Covid-19, que castiga o continente europeu. A situação é grave e muitos países têm imposto o isolamento social e a paralisação de algumas atividades econômicas, apesar do intenso protesto por parte de grupos sociais e setores da economia já penalizados com a crise econômica provocada pelo vírus. Na imprensa, porém, a decisão foi entendida como claro sinal de apoio às medidas governamentais2. 

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1 Confira-se os julgados: BVerfGE 77, 170; 85, 191 e 115, 25.

2 Bundesverfassungsgericht - Gastronomin scheitert mit Eilantrag. Tagesschau, 12/11/20.