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A penhorabilidade do salário para o pagamento de despesas condominiais

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Atualizado às 09:15

Na Coluna de 16 de maio de 2019 foi trazido o entendimento sobre a Mitigação da Penhora de Salários pelo Superior Tribunal de Justiça, em que o STJ adota um entendimento ampliativo da previsão legal, para possibilitar a penhora de salários inferiores a 50 salários mínimos1.

Já em texto datado de 13 de agosto do corrente ano foi comentado o julgado proferido nos autos do RESP 1.815.055/SP, que causou perplexidade na comunidade jurídica com o entendimento, dessa vez restritivo da mesma previsão legal, no sentido de que não seria possível penhorar salário para pagamento de dívida decorrente de honorários advocatícios.2

Voltamos ao tema, pois recente acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que salário poderia ser penhorado para o pagamento de débitos condominiais, eis que tais débitos equivaleriam a verbas alimentares:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESPESAS CONDOMINIAIS. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. POSSIBILIDADE DE BLOQUEIO "ON LINE" DE CONTAS EM NOME DA DEVEDORA ANTES DA PENHORA DO IMÓVEL ATRELADO AO DÉBITO EXEQUENDO. INCIDÊNCIA DO ART. 835 DO CPC. NECESSIDADE DA MITIGAÇÃO DA IMPENHORABILIDADE ABSOLUTA DO SALÁRIO DA AGRAVANTE DIANTE DO DÉBITO CONDOMINIAL, EQUIVALENTE A CARÁTER ALIMENTAR. OBSERVAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE SOBRA SALARIAL. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. Agravo de instrumento improvido, nos termos do acórdão. 

(TJ/SP;  Agravo de Instrumento 2166485-58.2020.8.26.0000; Relator (a): Cristina Zucchi; Órgão Julgador: 34ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santa Bárbara d'Oeste - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/09/2020; Data de Registro: 12/09/2020)

Do referido julgado se extraí a conclusão de que "Embora o crédito condominial não possua caráter alimentar, a este equivale, pelo fato de que o condomínio depende unicamente da arrecadação das cotas-partes mensais no rateio, de maneira que o inadimplemento de um condômino onera indevidamente aos demais. Desse modo, o proprietário de imóvel sob regime de condomínio edilício deve honrar suas obrigações sob pena de inviabilizar o custeio essencial para a existência e manutenção do condomínio".

Veja-se onde o ativismo judicial nessa matéria pode nos levar, pois com o afastamento do texto expresso da lei, temos julgados entendendo que os honorários advocatícios não teriam natureza alimentar e, por outro lado, que despesas condominiais equivaleriam a verba alimentar.

É claro que todos que residem em condomínios sofrem com a inadimplência de outros condôminos, eis que o rateio das despesas acaba tendo de ser feito entre um número menor de unidades, sobrecarregando os adimplentes, principalmente nos edifícios com um menor número de unidades. Assim, no caso específico, o acórdão teria feito "justiça" ao tentar evitar a sobrecarga dos outros condôminos.

Entretanto, por mais que se possa concordar com a flexibilização da penhora de salários3, fato é que o legislador optou, no artigo 833 do CPC/15, por manter várias causas de impenhorabilidades. Os vencimentos no montante de até cinquenta salários mínimos mensais são tidos por impenhoráveis.  A exceção seria para o pagamento de prestações alimentícias. Logo, ao se decidir que a prestação condominial seria equivalente à verba alimentícia, o acórdão, na melhor das intenções de assegurar o recebimento pelo credor, parece se distanciar da expressa previsão legal. 

Desse modo, não se concordando com a previsão legal, deve-se buscar a alteração da lei pelo trâmite legislativo próprio. Simplesmente se afastar da expressa previsão legal pode até trazer o resultado esperado no caso concreto, mas acaba gerando grande insegurança e enfraquecendo o sistema jurídico como um todo.

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3 Segundo Daniel Amorim Assumpção Neves: "Sempre critiquei, de forma severa, a impenhorabilidade de salários consagrada no art. 649, IV, do CPC/1973, que contrariava a realidade da maioria dos países civilizados, que, além da necessária preocupação com a sobrevivência digna do devedor, não se esquecem que salários de alto valor podem ser parcialmente penhorados sem sacrifício de sua subsistência digna. A impenhorabilidade absoluta dos salários, portanto, diante de situações em que um percentual de constrição não afetará a sobrevivência digna do devedor, era medida de injustiça e deriva de interpretação equivocada do princípio do patrimônio mínimo." (Novo Código de Processo Civil Comentado, Salvador: JusPodivm, 2016, p. 1.320).