Inversão dos ônus sucumbenciais e a sucumbência recursal
quinta-feira, 25 de julho de 2019
Atualizado às 07:36
Rogerio Mollica
Em artigo já publicado nesta coluna1, tive a oportunidade de defender que a Sucumbência Recursal só poderia se dar em caso de não conhecimento ou improvimento do Recurso. Em caso de provimento integral do recurso, somente se operaria a inversão dos ônus sucumbenciais, sem a majoração dos honorários.
Recentemente o Superior Tribunal de Justiça lançou a edição nº 129 do Jurisprudência em Teses tendo reafirmado:
"A majoração da verba honorária sucumbencial recursal, prevista no art. 85, § 11, do CPC/2015, pressupõe a existência cumulativa dos seguintes requisitos: a) decisão recorrida publicada a partir de 18.03.2016, data de entrada em vigor do novo Código de Processo Civil; b) recurso não conhecido integralmente ou não provido, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente; e c) condenação em honorários advocatícios desde a origem no feito em que interposto o recurso.2"
A consolidação do entendimento do Superior Tribunal de Justiça prevê, de forma acertada, que só teremos sucumbência recursal no caso do recurso não ser conhecido ou improvido. Portanto, no caso de provimento do recurso, teríamos somente a inversão dos honorários, sem a majoração recursal3.
Tal entendimento é contrário ao Enunciado nº 243 do Fórum Permanente de Processualistas Civis que prevê: "No caso de provimento do recurso de apelação, o tribunal redistribuirá os honorários fixados em primeiro grau e arbitrará os honorários de sucumbência recursal".
A Doutrina ainda diverge sobre o assunto, conforme se extraí do entendimento de Luiz Henrique Volpe Camargo:
"Já no caso de provimento total do recurso, o tribunal deverá inverter a condenação inicial e fixar os honorários recursais, em razão do tratamento isonômico exigido pelo art. 5º, caput, da Constituição Federal, afinal, não existe sentido admitir a fixação de honorários no caso de improvimento do recurso, mas não no caso de seu provimento". (Os honorários advocatícios pela sucumbência recursal no CPC/2015, in Honorários Advocatícios, coord. Marcus Vinícius Furtado Coêlho e Luiz Henrique Volpe Camargo, Salvador, JusPodivm, 2015, p. 727).
No Tribunal de Justiça de São Paulo também temos diversos recentes julgados em que não só se invertem os ônus sucumbenciais, como também fixam honorários recursais:
"Ação de cumprimento de sentença emitida na ação civil pública na qual a Telefônica foi condenada a pagar as participações acionárias dos contratos de expansão firmados no período de 25/08/1996 a 30/06/1997. Improcedência. Recurso da ré objetivando a inversão do ônus da sucumbência - Possibilidade - Caso em que o contrato não se insere nos limites definidos na ação coletiva, não tendo a parte o direito postulado - Inteligência do art. 85, caput, do CPC - Arbitramento de honorários recursais em R$ 150,00 - Provimento". (g.n.)
(TJSP; Apelação Cível 1014815-34.2016.8.26.0451; Relator (a): Enio Zuliani; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro de Piracicaba - 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/06/2019; Data de Registro: 29/06/2019)
"REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÕES. SERVIDORES ESTADUAIS APOSENTADOS. RECÁLCULO DOS ADICIONAIS POR TEMPO DE SERVIÇO TENDO POR BASE DE CÁLCULO OS VENCIMENTOS INTEGRAIS, OU SEJA, A SOMA DO SALÁRIO BASE COM TODAS AS VERBAS NÃO EVENTUAIS. ACOLHIMENTO INTEGRAL DO PEDIDO, EMBORA A SENTENÇA SEJA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. EQUÍVOCO NA CONDENAÇÃO DOS AUTORES AOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA, INCLUSIVE POR SEREM BENEFICIÁRIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. REEXAME NECESSÁRIO OCORRE POR SE TRATAR DE SENTENÇA ILÍQUIDA. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 11.960/2009 NO TOCANTE À ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO QUANTUM DEBEATUR, POIS A TR FOI DECLARADA INCONSTITUCIONAL, DEVENDO SER ADOTADO O IPCA-E. REFORMA PARCIAL DO JULGAMENTO. Os adicionais por tempo de serviço (ATS) devem ter por base de cálculo os "vencimentos integrais", conceito representado pela soma do salário padrão com as demais verbas remuneratórias não eventuais, transitórias ou precárias, cômputo este que inclui as gratificações e os adicionais pagos em caráter geral, denotando escopo de reajuste salarial, sendo vedada, apenas, a incidência recíproca entre as verbas de mesma natureza. Uniformização de Jurisprudência. Inteligência do artigo 129 da Constituição Estadual e do artigo 37, inciso XIV, da Constituição Federal. É devido o pagamento das diferenças pretéritas, sob a ressalva da prescrição quinquenal. Ação julgada improcedente em 1º grau. Sentença reformada. Necessária observância do decidido nos autos da Assunção de Competência nº 0087273-47.2005.8.26.0000, julgada pela C. Turma Especial de Direito Público desta E. Corte, conforme preconiza o artigo 927, inciso V, do CPC e Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 193.485-1/6. Os consectários legais incidentes sobre as diferenças pretéritas devem estar em sintonia com o entendimento consolidado pelo E. STF por ocasião do julgamento do Tema nº 810, com repercussão geral reconhecida, sendo inaplicável o índice de correção monetária previsto na Lei nº 11.960/2009, já que a Taxa Referencial (TR) não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, devendo ser adotado o IPCA-E. Inversão da sucumbência, com arbitramento dos honorários advocatícios recursais. APELAÇÃO DOS AUTORES PROVIDA, REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO DA FAZENDA ESTADUAL NÃO PROVIDOS." (g.n.)
(TJSP; Apelação Cível 0045659-53.2012.8.26.0053; Relator (a): Souza Nery; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 10ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 24/06/2019; Data de Registro: 24/06/2019)
Desse modo, faz-se necessário que o Superior Tribunal de Justiça julgue tal tese, sob o rito dos processos repetitivos, a fim de verdadeiramente uniformizar o entendimento quanto a impossibilidade de majoração dos honorários advocatícios em caso de provimento do recurso, com inversão dos ônus sucumbenciais.
__________
1 Publicação em 23/11/2017.
2 Tal entendimento é baseado nos seguintes julgados: AgInt nos EDcl no REsp 1746254/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 11/06/2019, DJe 21/06/2019; AgInt no REsp 1757742/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 23/04/2019, DJe 23/05/2019 AgInt no AREsp 1424719/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/05/2019, DJe 21/05/2019; AgInt no REsp 1797038/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/05/2019, DJe 21/05/2019; AgInt no REsp 1771319/RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/04/2019, DJe 09/04/2019; AgInt no AREsp 1297942/MS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/03/2019, DJe 20/03/2019.
3 Esse também é o entendimento de Luiz Dellore (Teoria Geral do Processo: Comentários ao CPC de 2015, São Paulo: Forense, 2015, p. 299) e Ronaldo Cramer (Comentários ao Código de Processo Civil, Coordenador Cássio Scarpinella Bueno, vol, 1, São Paulo: Saraiva, 2017, p. 448). Bruno Vasconcelos Carrilho Lopes defende que no provimento do recurso há uma nova fixação de honorários e que deve levar em conta todo o trabalho realizado (Comentários ao Código de Processo Civil, v. II, São Paulo, Saraiva, 2017, p. 171).