Conversa Constitucional nº 26
segunda-feira, 3 de abril de 2017
Atualizado às 07:52
Opinião: Não somos os párias do mundo
Amamos o futebol. Amamos de verdade. Para se ter uma ideia, um dos leading cases pendentes na Suprema Corte definirá quem ganhou o campeonato brasileiro de 1987, se o Flamengo ou o Sport Club do Recife. É uma paixão nacional. Por isso, foi duro suportar, em nossa casa, aquele 7 x 1 da seleção alemã na última Copa do Mundo. Dias depois, o porta-voz de Israel debochava de nós usando o episódio. Fazia, ali, tudo, menos diplomacia. Nós, altivos, seguimos com o comando constitucional de resolução pacífica das controvérsias internacionais. Somos da paz, não da guerra, nem mesmo as verbais. Isso não é covardia, é virtude. Recentemente, soubemos que o churrasco que orgulhosamente comemos era feito de papelão. Foi o que, de forma inconsequente, foi dito a nós e a todo o mundo. Parece que querem nos fazer acreditar que somos párias, que tudo nosso é inferior, errado e vergonhoso. É como se estivéssemos condenados. Mas não estamos. Semana passada, falando para investidores internacionais em Joanesburgo, África do Sul, no "Brazil - South Africa Trade & Investments: Legal Aspects", ouvi o jornalista Keith Campbell comentar sobre as favelas do Rio: "Não são um exemplo de estética. Mesmo assim, nós as invejamos. São casas cobertas por telhas, sustentadas por tijolos, com sanitários internos, luz elétrica e meios para se aquecer no frio, ou se refrescar no calor. Ficam na cidade, não em áreas remotas. Não são indignas. É um bairro mais pobre do que outros, nada mais". É a perspectiva de um sul-africano, alguém de um país que luta pela concretização de direitos sociais, notadamente o direito à moradia. No evento, Andréa Menezes, chefe do escritório de representação do Standard Bank no Brasil, esclarecia que o nosso país não tem o nível de corrupção que há em outros lugares. Você não é extorquido ou ameaçado ao adquirir um telefone, comprar um tapete numa loja ou reparar uma torneira em sua casa. Em muitos países, a tortura por dinheiro começa no aeroporto, pelas autoridades de imigração. No Brasil, a autoridade que reconheceu meu passaporte foi uma máquina, na qual um laser leu o código de barra do passaporte fazendo uma portinhola se abrir para mim. Nada mais. No evento, da plateia, um senhorzinho gringo, com seus óculos de armação redonda, usando uma gravata borboleta, dizia ao embaixador Nedilson Jorge que, na noite anterior, havia comprado um peito de frango. A carne tinha sido exportada pelo Brasil. "Estava delicioso. Não parecia papelão". Enquanto a Polícia Federal, em sua desarranjada forma de se comunicar, deu a entender que 206 milhões de pessoas comem carniça exportada aos quatro cantos do planeta, inúmeros países alimentam o seu povo, em parte, com as nossas exportações. Fazem orgulhosamente, não envergonhados. Na mesma semana, quando Neymar Júnior celebrou a vitória sobre o Uruguai garantindo a participação na Copa do Mundo da Rússia, a multidão, das arquibancadas, exigia Tite, o treinador, para presidente da República. Somos assim. Misturamos política e futebol. Cerveja e cachaça. Arroz e feijão. Desse hábito de misturar as coisas, nasceu um dos países mais culturalmente diverso da Terra. Misturamos tudo, até a nossa gente. Mas precisamos ter humildade para reconhecer os nossos vícios. Parte de tudo de negativo que temos suportado é fruto do "jeitinho", essa ideia de que é possível prosperar sem esforço e com falta de ética. É o anjo mal da nossa natureza coletiva. Em seu lugar, devemos colocar a "ginga", a mistura mágica que herdamos dos nossos ancestrais africanos. Pelé, em 1958, foi forçado a jogar imitando os europeus. Recusou. Nos campos, apresentou um futebol que não era força, mas beleza; não era competição, mas arte; não era técnica, mas paixão; não era somente disciplina, mas uma combinação entre ritmo e alegria. Ganhamos. O momento brasileiro requer "ginga". Criatividade, inventividade, beleza, paixão, orgulho de quem somos. É o desejo de inovação que a própria Constituição reafirma no artigo 218. Não somos párias. Não estamos condenados. Essa foi a mensagem deixada no "Brazil - South Africa Trade & Investiments: Legals Aspects", ocorrido em Joanesburgo, semana passada. É uma esperança que vale cultivar. O tempo estava escuro, é verdade. Mas o sol já começa a sair.
Liberado relatório da majoração da alíquota do IPI para o açúcar
O min. Marco Aurélio, relator do RE 592.145, além de ter liberado o caso para inclusão em pauta, divulgou o relatório confeccionado encaminhando cópias aos demais ministros e ao procurador-Geral da República. Trata-se do Tema 80 da repercussão geral, quanto à majoração da alíquota do IPI para o açúcar.
Confederação pleiteia amicus curiae para discutir royalties do petróleo
A Confederação Nacional dos Municípios pediu ingresso como amicus curiae na ADI 5621 (min. Cármen Lúcia), na qual o Partido da República ataca normas referentes aos royalties do petróleo devidos aos municípios que suportam as atividades de embarque e desembarque de petróleo ou são afetados por essa prática. Segundo o partido, a Constituição Federal prevê compensação àqueles que sofrem com os efeitos da exploração do petróleo, independentemente de suas instalações estarem ou não diretamente ligadas a um campo produtor ou de terem mais pertinência à extração do que à distribuição do petróleo.
Associação não consegue análise conjunta de recurso com ADI atacando o FUNRURAL
A Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo) não teve analisado requerimento para que a ADI 4395 (min. Gilmar Mendes), que ataca o art. 1º da lei 8.540/92, dando nova redação aos arts 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da lei 8.212/91, com redação atualizada até a lei 11.718/08, fosse apreciada conjuntamente ao RE 718.874 (min. Edson Fachin), que, semana passada, firmou a seguinte tese quanto ao tema 669 da repercussão geral: "É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção". A petição foi apresentada antes do julgamento do RE, mesmo assim, não foi apreciada.
CONFAZ defende autorizador do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal
O CONFAZ juntou manifestação à ADI 5635 (min. Roberto Barroso), ajuizada pela CNI, questionando lei 7.428/2016, do Estado do RJ, que condiciona o aproveitamento de incentivos fiscais relativos ao ICMS a depósitos em favor do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal (FEEF). O órgão defende a constitucionalidade do Convênio Confaz 42/2016, que autoriza estados e DF a criarem condições para o estabelecimento de incentivos e benefícios fiscais referentes ao imposto.
Fazenda muda e pede antecipadamente modulação sobre contribuições
A Fazenda Nacional mudou de postura após a lição que teve da presidente da Suprema Corte, min. Cármen Lúcia, que, ao definir o tema 69 da repercussão geral (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS), afastou o pedido de modulação ao argumento de que não teria havido manifestação prévia. No RE 603.624 (min. Rosa Weber), a Fazenda apresentou petição requerendo a modulação em caso de eventual decisão desfavorável. Trata-se do Tema 325: "Indicação de bases econômicas para delimitação da competência relativa à instituição de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, após o advento da EC 33/2001". Nesse caso, a APEX-BRASIL pediu modulação de efeitos para 12 meses após o trânsito em julgado, caso se declare a inconstitucionalidade da CIDE. O mesmo foi feito pela Fazenda no RE 630.898 (min. Dias Toffoli), cujo tema 495 é o seguinte: "Referibilidade e natureza jurídica da contribuição para o INCRA, em face da EC 33/2001".
Publicado acórdão relativo à ICMS-ST
Foi publicado o acórdão do RE 593.849 (min. Edson Fachin), que, após julgamento do Tema 201, afirmou o direito da parte recorrente em lançar em sua escrita fiscal os créditos de ICMS pagos a maior, nos termos da legislação tributária do Estado de MG e respeitado o lapso prescricional de 5 anos previsto na LC 118/05; na qualidade de prejudicial, declarou a inconstitucionalidade dos artigos 22, § 10, da lei 6.763/1975, e 21 do decreto 43.080/2002, ambos do Estado de MG; fixou interpretação conforme à Constituição nas expressões "não se efetive o fato gerador presumido" no § 11 do art. 22 da lei estadual e "fato gerador presumido que não se realizou" no art. 22 do Regulamento do ICMS, para que essas sejam entendidas em consonância à tese objetiva deste tema de repercussão geral. A tese fixada foi a seguinte: "É devida a restituição da diferença do ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida".
AGU opina pela improcedência de ação que questiona ICMS sobre software
A Advocacia-Geral da União juntou manifestação pela improcedência da ADI 5659 (min. Dias Toffoli), da Confederação Nacional de Serviços - CNS, visando excluir a incidência do ICMS sobre as operações com programas de computador. Pede a derrubada do decreto 46.877/2015, do Estado de MG, bem como a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 5º da lei 6.763/1975 e do art. 1º (incisos I e II) do decreto 43.080/2002, de MG, bem como do art. 2º da LC 87/1996. De acordo com a CNS, as operações com software jamais poderiam ser tributadas pelo ICMS, sobretudo em razão de já estarem arroladas no âmbito de incidência do ISS, conforme definido pela LC 116/2003.
Entidade de auditores fiscais pleiteia amicus curie para debater bônus por produtividade
A FENAT - Federação Nacional dos Auditores Fiscais das Administrações Tributárias, Federal, Estaduais e Distrital, pediu ingresso como amicus curiae no RE 835.291 (min. Ricardo Lewandowski), tendo como recorrente o Ministério Público de Rondônia e, como amici curiae, o SINDAFISCO - Sindicato dos Auditores Fiscais de Tributos Estaduais de Rondônia e o Sindicato dos Técnicos Tributários de Rondônia, cujo Tema 934 é: "Constitucionalidade da vinculação de receita arrecadada com multas tributárias para o pagamento de adicional de produtividade fiscal".
Admitido amicus no caso sobre PIS/COFINS sobre a receita advinda da locação de bens móveis
O min. Marco Aurélio deferiu ingresso como amicus curiae à ALEC - Associação Brasileira das Empresas Locadoras de Bens Móveis em Geral, para participar da formação do RE 659.412, cujo Tema 684 é o seguinte: "PIS/COFINS sobre a receita advinda da locação de bens móveis".
Governadores pedem suspensão de casos sobre Guerra Fiscal liberados para pauta
Um grupo de Governadores esteve com a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, apresentando uma petição conjunta requerendo o sobrestamento de 42 ações tratando sobre "Guerra Fiscal", todas elas já liberadas para inclusão em pauta, pelo menos até que o Congresso Nacional delibere a respeito do projeto de lei complementar que lá tramita tratando do CONFAZ. Segundo a min. Cármen Lúcia, "há uma preocupação, inclusive no espaço político, que é o espaço próprio para decisão e delimitação das políticas públicas econômicas, financeiras e tributárias". Tudo leva a crer que os Governadores ganharão, do STF, um pouco de fôlego para tentarem resolver suas diferenças no Congresso Nacional.
Destaque da semana: 30/03
O STF concluiu, num placar de 6 x 5, o julgamento do RE 718.874 (min. Alexandre de Moraes), concluindo o Tema 669 com a seguinte tese: "É constitucional formal e materialmente a contribuição social do empregador rural pessoa física, instituída pela lei 10.256/2001, incidente sobre a receita bruta obtida com a comercialização de sua produção".
Tá na pauta: 6/4
Quinta-feira, dia 6/4, estão pautados os seguintes temas tributários: (i) RE 594.015 (min. Marco Aurélio), tema 385: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista ocupante de bem público". São amici curiae: ANTF - Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários, ABRASF - Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileiras. Com um placar de 1 x 1, o caso volta com o voto-vista do min. Roberto Barroso; (ii) RE 601.720 (min. Edson Fachin), tema 437: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a empresa privada ocupante de bem público". São amici curiae: ANTF - Associação Nacional dos Transportes Ferroviários, Município de São Paulo, Distrito Federal e Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileira. Após o Relator ter negado provimento ao recurso, o caso volta com o voto-vista do min. Marco Aurélio; (iii) RE 434.251 (min. Edson Fachin), tema 437: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a empresa privada ocupante de bem público". Após o placar de 1 x 1, o caso volta com o voto-vista da min. Cármen Lúcia; (iv) RE 643.247 (min. Marco Aurélio), tema 16: "Cobrança de taxa pela utilização potencial do serviço de extinção de incêndio". Após o placar de 4 x 1 contra a tese sustentada pelos contribuintes, o caso volta com o voto-vista do ministro Dias Toffoli.
Global Constitutionalism
A Corte Constitucional da África do Sul deliberou quanto ao pedido formulado pela Black Sash Trust (Black Sash), organização sem fins lucrativos dedicada às pessoas que recebem benefícios sociais no país. Em 2012, a Agência de Segurança Social da África do Sul (SASSA) contratou a Cash Paymaster Services (Pty) Limited (CPS), pessoa jurídica de direito privado, para administrar o pagamento de benefícios sociais. Este contrato foi declarado inconstitucional, com um prazo de 12 meses para que a SASSA assumisse o pagamento. Mais de 17 milhões de pessoas dependem desses benefícios. Prevendo que a SASSA não cumpriria seu dever antes de o prazo fixado pela corte expirar, a Black Sash apresentou à Corte um pedido de intervenção na matéria. Tanto a Corruption Watch como a South African Post Office Soc Ltd (SAPO) foram admitidas como amici curiae. Semana passada, a Corte Constitucional declarou que a SASSA e a CPS estão sob a obrigação constitucional de assegurar o pagamento de subsídios sociais aos beneficiários a partir de 1 de abril de 2017, data na qual o prazo anteriormente fixado expiraria, até que uma entidade que não seja a CPS possa fazê-lo. A Corte deu mais 12 meses para isso. Ela também determinou medidas que assegurem a prestação de contas, a transparência e a proteção das informações pessoais dos beneficiários.
Obiter Dictum
No julgamento que definiu, com repercussão geral, a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, o ministro Gilmar Mendes, criticando a tese defendida pelos contribuintes, disse: "Nós inventamos um modelo em que se pode aprender inglês dormindo, enriquecer sem trabalhar e emagrecer comendo". Estudantes presentes ao julgamento não se seguraram e quebraram o clima tenso com uma sonora gargalhada.