Conversa Constitucional nº 16
segunda-feira, 28 de novembro de 2016
Atualizado às 09:11
Fidel e a dialética constitucional da liberdade e igualdade
Fidel Castro, o comandante, morreu. Sua biografia expôs a dialética que domina a geopolítica desde que eu nasci. No Brasil, é a contraposição entre os artigos 5º e o 6º da Constituição Federal. O primeiro, voltado às individualidades, traz direitos de liberdade. O outro, firma compromissos sociais que se exige do Estado quanto à coletividade, tais como saúde, educação, moradia e alimentação, concretizando a igualdade. O constitucionalismo tem mostrado que o ideal é tentar equilibrar liberdade e igualdade, mas Fidel e o seu socialismo não conseguiram enxergar isso. Quando, em seus discursos, dizia que em Cuba nenhuma criança dormia na rua - uma conquista coletiva - não tinha condições de falar sobre liberdade de expressão, uma necessidade individual. Seu narcisismo e megalomania - características comuns a rebeldes corajosos - impôs a sua gente sacrifícios não em nome da pátria, mas dele, Fidel. O mero capricho de fazer cidadãos ouvi-lo falar por mais de sete horas já mostra vaidade e egoísmo sem limites. Recentemente, médicos cubanos vieram ao Brasil salvar vidas e amenizar o sofrimento de irmãs e irmãos em vilarejos abandonados pelos nossos líderes. Seus salários eram vertidos ao Projeto Castrista. Eles não eram vistos por sua pátria como indivíduos, mas como propriedade estatal. Isso é cruel, porque é anti-humano. Apaixonados insensíveis, mergulhados em seu romantismo sádico, enaltecem Cuba como o último bastião de um socialismo que "quase" deu certo. Falam que a razão do fracasso é o embargo econômico, dando razão a Sartre quando dizia que "o inferno são os outros". Fidel, mesmo sendo um ditador, não se iguala a um Kadafi em crueldade, nem a um Saddam em tirania. Também não fez com os cubanos o que os antepassados soviéticos fizeram com sua gente. É de igual modo tolo comparar uma Cuba historicamente repleta de turistas com uma Coréia do Norte isolada. Fidel foi um homem de coragem que fez um contraponto histórico aos Estados Unidos. Graças ao seu tirocínio, jovens barbudos e garotas rebeldes mostraram ao Império que era melhor deixar aquela pequena ilha em paz. Arriscou sua vida nisso. Seu legado é o de ter enfrentado oponentes poderosos, soberbos e oportunistas. Ironicamente, morreu no ano em que os laços diplomáticos do seu país foram retomados com os Estados Unidos. Antes, em sua psicose conspiratória, havia elegido como espiã do Império uma mulher franzina, cubana, que passa o dia diante de um laptop atualizando um blog. Deixou como herdeiros ideológicos jovens, numa maioria, sem sua coragem, convicção, estratégia e liderança. A farda deu lugar a camisas com a imagem do conterrâneo ilustre, Che. No lugar das armas eles têm iphones. Vivendo em conforto, muitos são meninos e meninas que, buscando uma alternativa à miséria de uma vida sem causas cochilam em barraquinhas nas universidades e exigem achocolatado e leite condensado em suas revoluções. A morte do comandante me fez recordar a famosa entrevista que ele concedeu a Erick Durschmied. "É uma revolução para que em Cuba não tenhamos, no futuro, outras revoluções. Queremos instituir um sistema constitucional de longa duração, com um governo dedicado como condição essencial para o progresso e a felicidade de nosso país", disse o jovem revolucionário, fardado, no topo da montanha em Sierra Maestra. Cumpriu quase tudo. Faltou, todavia, prosperidade e felicidade. Fidel foi grandioso ao evitar que um país como Cuba se tornasse mais um brinquedo dos Estados Unidos. Jogou tudo fora, contudo, ao transformar a ilha, e sua gente, em meros objetos de seus próprios caprichos.
Liberado para pauta voto-vista sobre imunidade de IPTU sobre bens da União utilizados pela Petrobras
Foi liberado para pauta, após pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso, o RE 594.015/SP, da Petrobras contra o município de Santos, tendo, como amicus curiae, a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários - ANTF, tratando do tema 385 da repercussão geral: "Reconhecimento de imunidade tributária recíproca a sociedade de economia mista ocupante de bem público". O relator, ministro Marco Aurélio, lembrou do seu posicionamento no julgamento do RE 580.264, ocasião em que salientou que tanto a sociedade de economia mista quanto as empresas públicas submetem-se ao disposto no artigo 173, parágrafo 2º da Constituição Federal, segundo o qual "as empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado". O ministro Edson Fachin votou para reformar a decisão do TJ/SP, seguindo precedentes do Supremo no sentido de não ser cabível a cobrança do imposto. O ministro sugeriu a seguinte tese: "a sociedade de economia mista arrendatária de bem público Federal não pode ser eleita, por força de lei municipal, para figurar como parte passiva de obrigação tributária referente ao IPTU". Com o retorno do caso à pauta, saberemos qual a posição do ministro Barroso na matéria.
IPI na base do PIS/COFINS das montadoras de veículos em ST e portaria 655/93 do MF no radar da Fazenda
Agendaram audiência, com o ministro Ricardo Lewandowski, os procuradores responsáveis pelo acompanhamento dos temas tributários no Supremo para tratar do RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), sobre o Tema 303 da repercussão geral: "IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária". Também trataram do RE 640.905/SP (min. Ricardo Lewandowski), sobre o Tema 573: "Ofensa aos princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça pela Portaria 655/93, do Ministério da Fazenda (LC 70/91. Parcelamento de Dívida. Depósitos Judiciais)". O caso da ministra Rosa Weber está pautado para dia 14/12 e o outro aguarda inclusão.
ETCO pede preferência em ADI contra decreto-lei de cancelamento do registro especial de fabricantes de cigarros
O Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial - ETCO, amicus curiae, requereu preferência de julgamento na sessão da Suprema Corte do dia 30/11 (quarta-feira), de modo que a ADI 3952 tenha seu julgamento complementado frente ao julgamento da ADI 4874, e das ADPFs 183 e 131, que ainda não tiveram início, mediante a inversão da pauta. A ADI 3952, que versa sobre a pretensa inconstitucionalidade do decreto-lei 1.593/77, em virtude de contemplar a possibilidade de cancelamento do registro especial de fabricantes de cigarros, em decorrência de descumprimento de obrigações fiscais, foi ajuizada em 2007. O julgamento foi iniciado em 2010, sob a relatoria do ministro Joaquim Barbosa. Agora, o processo retorna à pauta.
AGU defende legislação de SP sobre ICMS em software
A Advocacia-Geral da União encaminhou manifestação na ADI 5576 (min. Roberto Barroso) que ataca leis do Estado de São Paulo sobre ICMS em operações com programas de computador. Segundo a ação, ao exigir o ICMS sobre as operações com softwares as leis incorrem em bitributação, criando nova hipótese de incidência do imposto. A CNS, autora, explica que as operações com programas de computador jamais poderiam ser tributadas pelo ICMS, por já estarem arroladas no âmbito de incidência do ISS, conforme a LC 116/2003. Pede, liminarmente, a suspensão da eficácia do artigo 3º, inciso II, da lei 8.198/1992 e dos decretos 61.522/2015 e 61.791/2016, todos do Estado de São Paulo.
Liberado para pauta submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios
Foi liberado para inclusão em pauta de julgamento o RE 938.837/SP (min. Edson Fachin), cujo tema 877 da repercussão geral trata da submissão dos conselhos de fiscalização profissional à execução pelo regime de precatórios.
ADI questiona incidência da contribuição previdenciária sobre licença-maternidade
O procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou a ADI 5626 contra dispositivos da lei 8.212/1991 que fazem incidir a contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade. Segundo o procurador, os parágrafos 2º e 9º (alínea "a", parte final) do artigo 28 da lei são incompatíveis com as garantias constitucionais de proteção à maternidade e ao direito das mulheres de acesso ao mercado de trabalho. Argumenta-se que as normas imputam ao empregador parte do ônus do afastamento da gestante devido à maternidade e contribuem para o aumento do custo de sua mão de obra, em comparação à masculina. "Essa dupla contribuição pelo mesmo posto de trabalho encarece a mão de obra feminina e contraria a norma constitucional e a internacional", sustenta, referindo-se à Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho. O relator é o ministro Celso de Mello.
Aconteceu
Teve início no STF a discussão sobre a compensação dos Estados pela desoneração das exportações do ICMS. O tema é tratado na ADO 25 e na ACO 1044, ajuizadas respectivamente pelos Estados do Pará e Mato Grosso, colocando em questão a metodologia aplicada pela "Lei Kandir" (LC 87/1996) e legislação subsequente. Na ADO, há outros 15 Estados admitidos como amicus curiae, ao lado do Estado do Pará, que ajuizou a ação questionando a demora do Congresso Nacional em regulamentar o tema, e pedindo a aprovação de nova norma em até 120 dias. A desoneração foi constitucionalizada pela Emenda Constitucional 42/2003, que acrescentou ao ADCT o artigo 91, no qual se prevê edição de nova lei complementar definindo os termos das compensações feitas aos estados. Na ACO 1044, o Estado de Mato Grosso alega ser prejudicado por perdas de arrecadação devido ao coeficiente utilizado pela União para os repasses às unidades da federação.
Tá na pauta
O STF liberou todos os temas tributários pautados para dezembro, até o dia 20/12, data do recesso. Dia 14/12 (quarta-feira) estão na pauta: (i) ADI 4281/SP (min. Rosa Weber), da ABRACEEL tendo como amicus curiae a Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica - APINE: ICMS. Energia Elétrica. Substituição Tributária. Ambiente de Contratação Livre. Decreto 54.177-SP. Saber se os dispositivos ofendem os princípios do equilíbrio federativo, da legalidade, da capacidade contributiva, da legalidade tributária e da livre concorrência. No caso, após a ministra Ellen Gracie julgar procedente a ação, pediu vista a ministra Cármen Lúcia, que trará o seu voto-vista. Não votam a ministra Rosa Weber e os ministros Luiz Fux e Dias Toffoli; (ii) RE 605.506/RS (min. Rosa Weber), sobre o tema 303 da repercussão geral: Cobrança de IPI na base de cálculo do PIS e da COFINS exigida e recolhida pelas montadoras de veículos em regime de substituição tributária. Dia 15/1 (quinta-feira), o RE 640.905/SP (min. Luiz Fux) que visa saber se a portaria 655/93 do Ministério da Fazenda, que proibiu o parcelamento de débitos relativos à Cofins que tenham sido objeto de depósito judicial, ofende os princípios da isonomia e do livre acesso à Justiça.
Global Constitutionalism
Num julgamento divulgado pelo Chief Justice Mogoeng Mogoeng na última terça-feira, Jacobus Kruger foi reputado racista por usar a palavra "k" em agosto de 2007, que, na África do Sul, é terminantemente proibida. "Kaffir" era a forma como o regime do apartheid se referia à comunidade negra quando queria agredi-la. Com o fim do regime e o nascimento da nova democracia constitucional, falar a palavra se tornou um crime gravíssimo. Kruger' que era um fiscal de contrabando e descaminho no Aeroporto Internacional de Cape Town, chamou seu chefe, Abel Mboweni, de kaffir. Num processo administrativo que sofreu, ele se declarou culpado e foi suspenso de suas atividades sem remuneração, mas em outubro de 2007 sua punição foi revertida e ele foi exonerado. A partir daí deu-se uma longa disputa judicial que terminou na Corte Constitucional. O presidente da Corte, ao manter a demissão de Kruger, mas determinar o pagamento de seis meses de salário em razão de erros por parte da própria SARS (espécie de Receita Federal), enfatizou que o uso do termo kaffir está no coração do racismo sul-africano e é calculado para nulificar a dignidade dos negros. "É algo usado para deslegitimar, para desumanizar", anotou.
Obter dictum
Não raramente as sessões do pleno do STF recebem alunos de faculdades de Direito de todo o país. Eles costumam assistir aos debates, maravilhados. Um dia desses, lá estava mais uma caravana de estudantes no plenário da Suprema Corte, observando as discussões, quando o ministro Roberto Barroso, fechando o seu raciocínio, emendou: "last but not least". Uma garota, empolgada, cutucou a outra: "Uau! Parece o Suits, amiga". Referia-se à célebre série jurídica norte-americana.