Outubro Rosa e o direito à saúde previsto na Constituição Federal
sexta-feira, 30 de outubro de 2020
Atualizado às 09:00
Ano após ano o mês de outubro vem sendo cada vez mais dedicado a chamar nossa atenção para a prevenção e o diagnóstico precoce do câncer de mama. As propagandas se multiplicam; prédios, fachadas e monumentos espalhados pelas cidades passam a ser iluminados com a cor rosa; congressos, corridas, palestras e ações diversas são promovidos em outubro com o intuito de conscientizar, sobretudo as mulheres, sobre o câncer de mama e a importância do diagnóstico precoce.
Apesar da intensificação das ações de conscientização nos últimos anos, poucos sabem a origem do "Outubro Rosa", que se deu em 1986, nos Estados Unidos, por iniciativa da Susan G. Komen Breast Cancer Foundation, entidade dedicada à pesquisa e ao combate do câncer mamário. O laço rosa foi introduzido pela primeira vez durante a NYC Race for the Cure, em 1991 e, desde então, se tornou o símbolo da campanha mundial.
Mas por que é importante dedicar um mês específico para falarmos sobre o câncer de mama?
A resposta vem por meio de dados estatísticos, os quais mostram que, apesar das crescentes campanhas, os números de mulheres acometidas por esse tipo de câncer crescem a cada ano. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o câncer de mama ainda é o tipo mais frequente de câncer que atinge mulheres no mundo todo, impactando, em média, 2,1 milhão por ano. No cenário mundial, é o tipo de câncer em mulheres com maior número de mortes1.
No Brasil, de acordo com dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA), o câncer de mama é o segundo tipo de câncer mais incidente em mulheres, atrás apenas do câncer de pele não melanoma. Para o ano de 2020, foram estimados 66.280 casos novos, o que representa uma taxa de incidência de 43,74 casos a cada 100.000 mulheres2. Ao contrário do que muitos pensam, homens também podem ser diagnosticados com câncer de mama, ainda que seja um diagnóstico mais raro - 1% do total de casos da doença3.
O INCA é um instituto vinculado ao Ministério da Saúde e tem por objetivo desenvolver e coordenar ações integradas ligadas à assistência, ao ensino, à pesquisa e à elaboração de políticas públicas para fins de prevenir e controlar a propagação do câncer em território brasileiro. Suas unidades hospitalares integram o Sistema Único de Saúde (SUS), e oferecem tratamento integral às pessoas que são diagnosticadas com qualquer tipo de câncer e precisam ter acesso aos cuidados hospitalares adequados.
Além das unidades hospitalares específicas do INCA localizadas no Rio de Janeiro, o SUS abriga atualmente 317 unidades e centros de assistência habilitados no tratamento do câncer4, sendo que todos os Estados brasileiros possuem ao menos um hospital habilitado para tratamentos oncológicos.
Como o "Outubro Rosa", a prevenção e o combate ao câncer de mama relacionam-se com a Constituição Federal?
Isso se dá porque a criação do SUS foi prevista pela nossa Constituição Federal em seu artigo 198, §1º - artigo este posteriormente regulamentado pela lei Federal 8.080/1990. Referida lei menciona os princípios básicos do SUS, dentre os quais destacamos: a universalidade de acesso aos serviços da saúde; a integralidade de assistência à saúde; o direito à informação às pessoas assistidas sobre saúde e a participação da comunidade.
Há, portanto, por meio do SUS, a concretização do texto constitucional que determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, devendo a sua consecução ocorrer mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e acesso igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (art. 196, CF).
Ainda assim, mesmo com a possibilidade de acesso ao SUS, de acordo com um estudo publicado em junho deste ano pelo Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de Mama (GBECAM), pacientes que são atendidos pelas unidades integrantes do SUS tendem a ser diagnosticados em estágios mais avançados do câncer de mama e com subtipos mais agressivos, sendo que, nesses casos, tanto os riscos quanto os custos são maiores5.
Tendo em vista o tempo que as pessoas normalmente levam para procurar ajuda profissional e dado o quadro atual de pandemia, que acaba dificultando mais ainda essa busca, falar sobre o câncer se torna ainda mais relevante e necessário. O câncer é uma doença silenciosa e não escolhe gênero, cor, idade ou classe social: pode acontecer com qualquer um e a qualquer momento. Tabus e preconceitos por falta de informação de qualidade e acesso a um atendimento adequado contribuem para agravar o número de casos. Muitas mulheres (e homens também) ainda têm medo de investigar problemas de saúde que possam vir a ser um diagnóstico de câncer, pois, até bem pouco tempo atrás, a simples palavra "câncer" significava uma sentença de morte.
Nesse contexto, a importância do "Outubro Rosa" fica ainda mais evidente. A promulgação da lei 13.733, a qual dispõe sobre atividades que devem ser desenvolvidas pelos gestores públicos anualmente a fim de promover a conscientização do câncer de mama, é mais um dos bons exemplos da relevância dessa iniciativa.
Por esses e tantos outros motivos é tão importante fazermos cada vez mais campanhas para disseminar informações de qualidade e conscientizar as pessoas sobre a importância da prevenção e de um diagnóstico precoce. Atitudes como manter uma alimentação saudável, praticar exercícios físicos regularmente, evitar o consumo de bebidas alcoólicas e do cigarro já são meios de diminuir os riscos de desenvolver um câncer. A prevenção não é uma garantia de que um câncer não se desenvolverá (ou qualquer outra doença grave), porém, quanto mais saudáveis formos no nosso dia a dia, menores serão os riscos e maiores as chances de tratamentos eficazes.
O diagnóstico precoce salva vidas, portanto, não deixem de se cuidar!
*Fernanda Savino é formada em Letras pela USP e em Direito pelo Mackenzie. É pós-graduada em Direito Internacional pela PUC/SP. É advogada e atua na área de mercado financeiro e de capitais do Citi. Voluntária do projeto Constituição na Escola, diagnosticada com câncer de mama aos 32 anos, estando em remissão há 5 anos.
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1 World Health Organization. Acesso em 25/10/2020.
2 Instituto Nacional de Câncer. Acesso em 25/10/2020.
3 Instituto Nacional de Câncer. Acesso em 25/10/2020.
4 Instituto Nacional de Câncer. Acesso em 25/10/2020.
5 Instituto Oncoguia. Acesso em 25/10/2020.