Rompimento de barragem em Brumadinho: como a Constituição Federal tutela o meio ambiente?
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019
Atualizado em 31 de janeiro de 2019 15:35
Felipe Costa Rodrigues Neves e Maria Paes Barreto de Araujo
Em novembro de 2015 o Brasil vivenciou o rompimento de uma barragem próxima à cidade de Mariana/MG. Na última semana, novamente o país tomou conhecimento de outro acontecimento nesse sentido: o rompimento de uma barragem em Brumadinho/MG. Ambos os eventos geraram vítimas e sérias consequências ambientais.
Segundo matéria publicada pelo jornal O Globo referente aos impactos ambientais causados pelo rompimento da barragem do Fundão, próxima a Mariana, em 2015, tal obra "abrigava cerca de 56,6 milhões de m³de lama de rejeito. Desse total, 43,7 milhões de m³ vazaram. Os rejeitos atingiram os afluentes e o próprio Rio Doce, destruíram distritos e deixaram milhares de moradores da região sem água e sem trabalho. Esse foi o maior desastre ambiental do Brasil. Apenas um mês depois, foram retiradas 11 toneladas de peixes mortos, oito em Minas e três no Espírito Santo. Três anos depois, estes estados ainda sentem os impactos ambientais".
Diante disso, percebe-se que questões ambientais são importantes e podem causar desdobramentos seríssimos. Assim, a pergunta que fica é: será que o meio ambiente é protegido pela Constituição Federal - lei maior do nosso ordenamento jurídico? Se sim, de que maneira?
A resposta para tal indagação é afirmativa. A Constituição Federal em seu "Título VIII" trata da chamada "Ordem Social" destinada a temas relacionados ao bom convívio e desenvolvimento social do cidadão prevendo, ao mesmo tempo, deveres do Estado como: (i) seguridade social (saúde, previdência social e assistência social); (ii) educação, cultura e desporto; (iii) ciência, tecnologia e inovação; (iv) comunicação social; (v) meio ambiente; (vi) família, criança, adolescente, jovem e idoso; e (vii) populações indígenas. E, cada um desses assuntos, por sua vez, é abordado em capítulo próprio dentro desse "Título VIII", estando o meio ambiente previsto no "Capítulo V".
Frise-se que a Constituição Federal de 1988 foi a primeira Constituição brasileira a trazer um capítulo específico sobre o meio ambiente. Isso se deu por conta de uma tendência mundial vista à época referente a uma maior preocupação e atenção à preservação e impactos ambientais. Percebe-se, portanto, que a constitucionalização da proteção ambiental no Brasil é recente, tendo em vista os mais de 500 (quinhentos) anos de história da nossa nação.
Inicialmente, então, o artigo 225, do capítulo V, da Carta Magna, assegura que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações".
Analisando de maneira mais detalhada os dizeres acima, temos que a expressão "todos" significa quaisquer brasileiros ou estrangeiros residentes no Brasil, conforme o artigo 5º, da Constituição Federal. Além disso, a extensão de meio ambiente encontra-se definida na legislação infraconstitucional como sendo "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas".
Na sequência, ainda, a Constituição Federal destaca uma série de incumbências do Poder Público no intuito de assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente previsto no artigo 225. Dentre eles, podemos citar: (i) preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; (ii) preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; (iii) exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental; (iv) controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; (v) promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; (vi) proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade; e (vii) definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos.
Além de tais incumbências do Poder Público, a Constituição Federal também se preocupa com a punição e com a reparação de eventuais danos ambientais causados. Nessa linha, expressamente determina que qualquer um - seja pessoa física ou jurídica - que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado por conta de suas atividades.
Ademais, prevê que as pessoas físicas ou jurídicas que praticarem condutas e/ou atividades consideradas lesivas ao meio ambiente serão penalizadas tanto no âmbito criminal quanto administrativo, bem como serão obrigadas a reparar os danos causados.
A preocupação constitucional com o meio ambiente - introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Constituição de 1988 - foi extremamente importante para conscientizar os diversos segmentos do Poder Público, tanto é que, dez anos após a promulgação da Carta Magna, o Poder Legislativo acabou editando uma lei regulamentando especificamente "as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente" (lei 9.605/98). Desse modo, diversas atividades agressivas ao meio ambiente que antes ficavam impunes, passaram a caracterizar ilícitos administrativos ou crimes.
Isso posto, percebe-se que o meio ambiente é protegido pela nossa Constituição Federal, a qual dedica um capítulo inteiro ao tema. Nesse mesmo sentido, a legislação infraconstitucional também aborda a questão prevendo, inclusive, crimes específicos para aqueles que praticarem condutas ou atividades lesivas ao meio ambiente. Logo, a tutela constitucional e legal já existe, devendo tais regras serem seguidas e aplicadas na prática.