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Quem cala consente?

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Atualizado às 08:07

Um dos elementos de existência do negócio jurídico é a vontade manifestada. Sem vontade exteriorizada, em princípio, não há negócio jurídico.

A vontade pode ser manifestada expressamente, como acontece num escrito público ou particular, quanto verbalmente ou mesmo por gestos. A validade da declaração de vontade não depende de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir (art. 107 do Código Civil).

Assim, um contrato de locação de imóvel, por exemplo, pode ser firmado verbalmente, embora não seja, por inúmeras razões, aconselhável. A afirmação é verdadeira porque a lei não condiciona a validade de tal espécie de contrato à manifestação escrita. Diferente é com o contrato de compra e venda de imóvel, de fiança, entre outros.

E o silêncio? Pode a ausência de manifestação de vontade gerar consequências importantes no mundo jurídico? Aquele que silencia está efetivamente anuindo, tal como prega o dito popular que intitula o presente texto?

A resposta a tais indagações não é simples. O silêncio pode sim acarretar efeitos jurídicos relevantes, mas nem sempre equivale à aceitação.

Na doação, o doador pode fixar prazo ao donatário, para que ele manifeste a aceitação ou recusa, interpretando-se o seu silêncio como concordância. Isso só acontece se não houver encargo previsto no negócio (art. 539 do CC). Ao contrário, se houver encargo, ainda que o benefício da doação compense sobejamente os ônus a ela atrelados, o silêncio representa recusa.

É comum algumas pessoas notificarem outras, concluindo a missiva com a assertiva de que o silêncio do notificado importa em renúncia a determinado direito. Exemplo: um herdeiro notifica outro para que diga se aceita ou não a herança, concede prazo e termina dizendo que o silêncio será interpretado como renúncia à herança. A vontade do cidadão, nesse caso, não se sobrepõe à lei. O art. 1807 do CC é manifesto ao proibir que o silêncio seja interpretado como renúncia da herança. Ao contrário, significa aceitação.

Da mesma forma, no direito das obrigações, se houver assunção de uma dívida por um terceiro, qualquer das partes (cedente e cessionário) pode conceder prazo para que o credor consinta ou não com tal negócio jurídico. Afinal, ele é o principal interessado.

Independentemente do teor da notificação, o silêncio do credor revela recusa (art. 299, parágrafo único, do CC), pois juridicamente pode ficar mais vulnerável com a assunção da dívida por terceiro. Pode a transferência da titularidade da dívida significar, para o credor, a diferença entre receber e não receber seu crédito.

Portanto, como princípio, ninguém pode ficar numa posição mais onerosa em virtude de um comportamento silencioso.

Em outras situações, o ordenamento jurídico admite maior valor ao silêncio. O art. 111 do CC prescreve que "o silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa". Por isso, o juiz deve estar bastante atento às peculiaridades do caso para valorar adequadamente o silêncio.

O silêncio pode acarretar até mesmo o desfazimento do negócio jurídico, além de responsabilidade civil. O art. 147 do CC, por exemplo, preceitua que "nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado".

Não se pode, pelas razões apresentadas, concluir que o silêncio indica necessariamente aceitação no plano jurídico.