A obrigação alimentar tem o objetivo de atender as necessidades vitais de quem não tem recursos suficientes para se manter por conta própria. O fundamento jurídico que determina o pagamento de alimentos a determinadas pessoas, próximas do necessitado, é a solidariedade humana.
O artigo 1696 do Código Civil estabelece que o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, devendo recair a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. E o artigo seguinte (1697) determina que, na falta dos ascendentes, a obrigação é dos descendentes, observada a ordem de sucessão e, faltando estes, dos irmãos, tanto os germanos quanto os unilaterais. Portanto, não se pode pedir alimentos a tios, sobrinhos, primos, genros, enteados e demais colaterais ou afins.
Uma das características atribuídas à obrigação alimentar é a sua divisibilidade, conforme teor do art. 1698: "Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide".
Referido texto legal tem gerado controvérsia sobre a natureza jurídica da intervenção de terceiro alvitrada. Porém, a regra é clara: não há solidariedade entre os devedores de alimentos.
Por um lado, é interessante que o autor da ação de alimentos insira no polo passivo maior número de devedores, pois com isso impede prolongamentos processuais inadequados em virtude da possível intervenção de terceiro, aumenta a chance de receber recursos e, principalmente, amplia um dos requisitos do dever alimentar: a possibilidade de pagar alimentos. Se para estabelecer o quantum devido é necessária a análise do binômio necessidade/possibilidade, quanto maior o número de obrigados, maior também será a possibilidade alimentar.
Por outro lado, quanto maior o número de requeridos na ação de alimentos, em princípio, menos célere será o processo. Não só pela dificuldade de citação, mas também pelo possível prazo processual dobrado caso as partes tenham advogados diferentes e, acima de tudo, pela disputa interna entre os codevedores, que tentarão se afastar do encargo imputando uns aos outros melhores condições econômicas.
Qualquer estratégia adotada tem vantagens e desvantagens. E todas essas observações são válidas para qualquer ação de alimentos, independentemente da idade do pretendente.
Porém, com relação ao idoso, a regra é diversa. Aquele que, com idade igual ou superior a 60 anos, pleiteia alimentos, tem em seu benefício a solidariedade dos devedores, conforme se extrai do art. 12 do Estatuto do Idoso (lei 10.741, de 1º de outubro de 2003):"A obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores". Não há, portanto, divisibilidade.
Sobre o tema, é recomendável a leitura do texto publicado, em julho de 2011, por Alberto Gosson Jorge Junior (Obrigação alimentar), na Revista do Advogado 112, da Associação dos Advogados de São Paulo. Referido civilista admite, com sólidos fundamentos, a possibilidade de o credor, idoso, poder acionar qualquer pessoa listada nos artigos 1696 e 1697, não precisando observar a ordem ascendente/descendente/colateral.
Carlos Roberto Gonçalves posiciona-se de forma diversa. Para ele, a solidariedade apenas existiria entre os devedores de uma mesma classe, devendo o Estatuto do Idoso ser interpretado observando-se as regras contidas no Código Civil a respeito da ordem de devedores (ISBN 978-85-02-14840-6).
O tema é extraordinariamente complicado.
Apesar de o idoso ser merecedor de proteção, a regra da solidariedade é nociva.
A fixação dos alimentos, todos sabem, depende do cuidadoso exame, com proporcionalidade, da necessidade daquele que os pleiteia e da possibilidade da(s) pessoa(s) obrigada(s). Se há mais pessoas obrigadas, maior a chance de o idoso ter direito a mais. A fixação do valor devido não parte da necessidade para depois analisar a possibilidade. A verificação é implexa e enredada. Por isso, a necessidade do alimentando também pode variar em função da possibilidade do(s) alimentante(s).
Por tudo isso, há flagrante incompatibilidade entre o dever de pagar alimentos e a solidariedade. Um codevedor, sozinho, somente consegue pagar o montante arbitrado pelo juiz, que levou em consideração a sua situação econômica. Se esse mesmo codevedor tiver que pagar na integralidade todo o crédito alimentar, poderá padecer do mesmo mal e se tornar também um necessitado.
É importante lembrar que a dívida de caráter alimentar tem consequências drásticas se inadimplida. Pode gerar, por exemplo, a prisão civil do devedor. Além disso, pode fazer com que o devedor perca o seu imóvel residencial porque essa é uma das exceções da impenhorabilidade do bem de família, prevista no art. 3º. da lei 8.009/90. Pouco lhe serviria eventual direito de regresso em face dos demais coobrigados depois de experimentados tamanhos dissabores.
Por todas essas razões, parece que estamos diante de mais uma situação em que o nobre objetivo do legislador inspirou texto de lei inovador, porém, sem a devida reflexão a respeito de sua operabilidade, conveniência e Justiça.