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Os limites da resilição unilateral do contrato e o art. 473 do CC

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Atualizado em 14 de fevereiro de 2012 13:03

A resilição é uma das formas de extinção do contrato. A resolução é outra forma de desfazimento contratual. Enquanto a resolução pressupõe causa externa, como perecimento do objeto ou atitude culposa, a resilição opera-se por simples manifestação de vontade de uma das partes, que não tem mais interesse em dar continuidade ao vínculo contratual. A resilição não tem causa externa.

 

Um dos princípios do direito contratual é o da obrigatoriedade. Uma vez celebrado, o contrato deve ser cumprido. Não fosse assim, não haveria segurança jurídica, econômica e social. Esse princípio, no entanto, não é absoluto. Algumas situações permitem a quebra da intangibilidade dos contratos, como a onerosidade excessiva.

 

Em face do princípio da obrigatoriedade, a regra determina que contratos não podem ser resilidos unilateralmente.

 

Entretanto, algumas espécies de contratos, em determinadas situações, admitem a resilição unilateral, principalmente os de execução estendida no tempo (Art. 473, caput, do CC: "A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte").

 

A locação de imóvel urbano, por exemplo, se vige por prazo indeterminado, pode ser denunciada a qualquer tempo, pelo locador ou pelo locatário, com prazo de 30 dias. Exceto em algumas situações de locação residencial ou de temporada, conforme já examinado na Civilizalhas 1 (clique aqui). O mandato, pelo fato de a confiança ser elemento de elevada importância para a sua constituição, também admite, em regra, a resilição unilateral do mandatário (revogação) ou do mandante (renúncia).

 

A prestação de serviço, em contrato de execução continuada, da mesma forma, admite a resilição unilateral se vige por prazo indeterminado. Assim deve ser porque ninguém deve mesmo ficar eterna e compulsoriamente vinculado a outro contratante. E os contratos dessa natureza normalmente contem cláusula permitindo expressamente a resilição unilateral, desde que a comunicação seja feita com trinta dias de antecedência.

 

A esse respeito, o Código Civil vigente trouxe grande inovação, que parece, após dez anos de vigência, não ter sido digerida adequadamente pelos operadores do direito. O art. 473, parágrafo único, assim dispõe: "Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos".

 

A regra é cogente, ou seja, não pode ser afastada pela vontade das partes. Portanto, a liberdade de contratar é ligeiramente cerceada quanto a esse aspecto. Tal comando assenta-se na função social do contrato e na boa-fé (arts. 421 e 422 do CC).

 

O contrato não é mais da conta apenas das partes que o celebram. Pelo fato de terem inegável importância social e econômica, o Estado intervém para evitar que a liberdade plena retire do contrato a sua principal função, a social.

 

Assim, seria recomendável que os contratantes, em situações como essa, dispusessem de prazos escalonados para a resilição, conforme as circunstâncias e o montante investido por uma das partes. Isso não impediria discussões judiciais, mas poderia minimizá-las.

 

Referido artigo não economiza nos conceitos indeterminados de propósito, seguindo o rumo do Código Civil de 2002, que aumentou substancialmente o poder dos juízes. O parágrafo único contém, nesse sentido, as seguintes expressões: "natureza do contrato", "investimentos consideráveis", "prazo compatível" e "vulto dos investimentos".

 

A vagueza do texto tem o objetivo de deixar nas mãos dos juízes a ingrata tarefa de investigar o caso concreto, por meio de complexas e duvidosas perícias, e fazer justiça. Porém, a sua aplicação prática faz surgir muitas dúvidas e questionamentos, a começar pela tentativa de suprimir o risco inerente a todo tipo de negócio. Além disso, outras indagações, para reflexão, podem ser feitas: Se o investimento "vultoso" de uma das partes foi feito para atender também outros clientes, aplica-se tal norma? E se o investimento "vultoso" foi feito contrariando determinação expressa do próprio contrato? E se a parte que pretende a resilição é forçada a fazê-lo para cortar despesas, em face do cenário externo e de seu ramo de atividade? O período razoável, ou compatível com o vulto dos investimentos, precisa levar em consideração também o lucro esperado, ou apenas os investimentos feitos para ao menos "zerar" a operação?

 

Essas são apenas algumas de inúmeras perguntas que o texto implicitamente suscita.

 

Por isso, todo o cuidado é pouco em contratos que possam gerar essa espécie de discussão.