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Os princípios do CDC e os direitos básicos do consumidor: A inversão do ônus da prova - 15ª Parte - Parte 2

quinta-feira, 27 de março de 2025

Atualizado às 07:39

Volto a examinar os direitos básicos do consumidor previstos no art.6º do CDC, agora com a segunda parte da análise da inversão do ônus da prova.

Vimos que dispõe o inciso VIII do citado art. 6º o seguinte:

"Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

      (...)

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;"

E terminei o artigo anterior afirmando que na hipótese do art. 6º, VIII, do CDC, cabe ao juiz decidir pela inversão do ônus da prova se for verossímil a alegação ou hipossuficiente o consumidor.

Vale dizer, deverá o magistrado determinar a inversão. E esta se dará pela decisão entre duas alternativas: verossimilhança das alegações ou hipossuficiência. Presente uma das duas, está o magistrado obrigado a inverter o ônus da prova.

É fato que o vocábulo "verossímil" é indeterminado, mas isso não impede que da análise do caso concreto não se possa aferir verossimilhança.

Para sua avaliação não é suficiente, é verdade, a boa redação da petição inicial. Não se trata apenas do bom uso da técnica de argumentação que muitos profissionais têm. Isto é, não basta relatar fatos e conectá-los logicamente ao direito, de modo a produzir uma boa peça exordial.

É necessário que da narrativa decorra verossimilhança tal que naquele momento da leitura se possa aferir, desde logo, forte conteúdo persuasivo. E, já que se trata de medida extrema, deve o juiz aguardar a peça de defesa para verificar o grau de verossimilhança na relação com os elementos trazidos pela contestação. E é essa a teleologia da norma, uma vez que o final da proposição a reforça, ao estabelecer que a base são "as regras ordinárias de experiência". Ou, em outros termos, terá o magistrado de se servir dos elementos apresentados na composição do que usualmente é aceito como verossímil.

É fato, também, que a narrativa interpretativa que se faz da norma é um tanto abstrata, mas não há alternativa, porquanto o legislador se utilizou de termos vagos e imprecisos ("regras ordinárias de experiência"). Cai-se, então, de volta ao aspecto da razoabilidade e, evidentemente, do bom senso que deve ter todo juiz 1.

O significado de hipossuficiência do texto do preceito normativo do CDC não é econômico, é técnico.

A vulnerabilidade é o conceito que afirma a fragilidade econômica do consumidor e também técnica. Mas hipossuficiência, para fins da possibilidade de inversão do ônus da prova, tem sentido de desconhecimento técnico e informativo do produto e do serviço, de suas propriedades, de seu funcionamento vital e/ou intrínseco, de sua distribuição, dos modos especiais de controle, dos aspectos que podem ter gerado o acidente de consumo e o dano, das características do vício etc.

Há alguma polêmica em torno do momento processual no qual o magistrado deverá decidir a respeito da inversão do ônus da prova, mas, em nossa opinião, como se verá, esta é fruto de falta de rigorismo lógico e teleológico do sistema processual instaurado pela lei n. 8.078 e ainda resquícios da memória privatista do regime do processo civil tradicional.

É o que examinarei no próximo artigo.

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1 São também termos vagos dos quais não se escapa ("razoável" e "bom senso"), mas que o caso concreto ajuda a decidir.