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A relação jurídica de consumo - O conceito de serviço - Parte I

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Atualizado em 4 de setembro de 2024 13:13

Continuo examinando a relação jurídica de consumo estabelecida no Código de Defesa do Consumidor (CDC), agora no exame do conceito de serviço.

O CDC definiu serviço no § 2º do art. 3º1 e buscou apresentá-lo de forma a mais completa possível. Porém, na mesma linha de princípios por nós já apresentada, é importante lembrar que a enumeração é exemplificativa, realçada pelo uso do pronome "qualquer". Dessa maneira, como bem a lei o diz, serviço é qualquer atividade fornecida ou, melhor dizendo, prestada no mercado de consumo.2

A norma faz uma enumeração específica, que tem razão de ser. Coloca expressamente os serviços de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, antecedidos do advérbio "inclusive".

Tal designação não significa que existia alguma dúvida a respeito da natureza dos serviços desse tipo. Antes demonstra que o legislador foi precavido, em especial, no caso, preocupado com que os bancos, financeiras e empresas de seguro conseguissem, de alguma forma, escapar do âmbito de aplicação do CDC. Ninguém duvida que esse setor da economia presta serviços ao consumidor e que a natureza dessa prestação se estabelece tipicamente numa relação de consumo.

Foi um reforço acautelatório do legislador, que, aliás, demonstrou-se depois, era mesmo necessário. Apesar da clareza do texto legal, que coloca, com todas as letras, que os bancos prestam serviços aos consumidores, houve tentativa judicial de se obter declaração em sentido oposto. Chegou-se, então, ao inusitado: O Poder Judiciário teve de declarar exatamente aquilo que a lei já dizia, isto é, que os bancos prestam serviços.

Já em 1995 o STJ reconhecia a incidência do CDC e, depois de muita disputa, editou em 2004 a Súmula 297 com o seguinte teor: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

É importante aproveitar o episódio para lembrar que os países cujo capitalismo é dito como dos mais avançados têm leis de proteção ao consumidor. A propósito, lembre-se que o CDC brasileiro é fundamental para o desenvolvimento do próprio regime capitalista estabelecido expressamente no art. 1º da Constituição da República.

Na verdade, ficou a convicção de que os agentes financeiros deveriam, ao invés de lamentar, comemorar o resultado da demanda. É que, em primeiro lugar - repita-se -, a lei 8.078/90 não é contra nenhum empresário. Ao contrário, ela está a favor exatamente daqueles que respeitam seus clientes. Em segundo lugar, ela é uma lei que cria a possibilidade de competição, pois a livre concorrência estabelecida no sistema constitucional brasileiro - garantia constitucional dos princípios gerais da atividade econômica: Art. 170, IV - gera a alternativa de, respeitando os direitos dos consumidores, obter novos clientes.

Lembre-se também que o CDC está em pleno vigor há muitos anos com eficácia e muita eficiência, tendo influenciado diretamente a modernização das relações jurídicas estabelecidas no polo de consumo. E mais: É uma lei brasileira respeitada no exterior, tendo servido de inspiração para a criação e modificação de outras leis similares em alguns países. É, efetivamente, um produto nacional que enche de orgulho os brasileiros.

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Continua na próxima semana.

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1 "Art. 3º (...) § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista."

2 Os chamados serviços essenciais têm, também, regulação complementar no art. 22 do CDC.